Cidade mais atingida pela Covid-19 no Ceará, Fortaleza percebe redução de demandas de saúde relacionadas à doença desde o início de junho. Nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) da Capital, por exemplo, as internações de pacientes sintomáticos caíram 78% e, os óbitos pela enfermidade, 96%, quando comparados aos meses de maio e agosto. Os dados são da plataforma IntegraSUS, da Secretaria Estadual da Saúde (Sesa), e foram analisados pelo Núcleo de Dados do Sistema Verdes Mares.
Entre os dias 1º e 16 de maio, mês em que a cidade teve o pico de casos e óbitos, foram 1.817 internações contabilizadas. No mesmo período de agosto, foram 383 acolhimentos nas unidades. Os óbitos variaram de 194 para apenas sete em igual intervalo, depois de sucessivos decréscimos ao longo de junho e julho, mesmo com a reabertura de setores da economia autorizada pelo Governo do Estado.
Os dados se referem a 11 das 12 UPAs instaladas na Capital. A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) informou que entrará em contato com a gestão da UPA do Bom Jardim, única unidade sem os registros disponíveis na plataforma, para questionar a ausência das informações sobre a doença.
No entanto, salienta que os atendimentos à Covid-19 seguem normalmente no local.
Conforme o balanço do IntegraSUS, as médias de atendimento e mortes também apresentaram redução. Em todo o mês de maio, as UPAs de Fortaleza tinham, diariamente, cerca de 170 pacientes internados e 15 óbitos. Até o momento, em agosto, a média é de 24 pacientes internados e menos de um óbito por dia.
Para Luciano Pamplona, epidemiologista e professor do Departamento de Saúde Comunitária da Universidade Federal do Ceará (UFC), a queda pode estar relacionada a dois cenários sobre a estabilização da doença. "Quando falamos de redução de internação, pode mostrar menor transmissão. Fortaleza mostra isso de forma mais evidente. Agora, sobre número de óbitos, é preciso dizer que esses casos podem ser de pessoas que adoeceram há mais de 10 dias. A redução pode significar que estamos conseguindo controlar a doença", avalia o especialista.
Distanciamento
No entanto, o professor ressalta ser impossível desconsiderar "que as pessoas continuam morrendo", por isso é preciso manter o isolamento social - medida cada vez mais difícil, já que aglomerações em praias e festas privadas têm sido recorrentes nas últimas semanas. "Devemos entender os marcos de avanço no controle da pandemia, mas sem deixar seguir as medidas sanitárias. Estamos retornando com a cadeia produtiva, então é preciso manter os cuidados para que se consiga voltar todo mundo", diz Pamplona.
Quem não poderá aproveitar as mínimas atividades cotidianas será João Batista da Silva, de 68 anos, um dos 762 pacientes com Covid-19 a falecer em UPAs no Ceará até o último domingo (16). A filha, Charlene Izaquiel, lembra que ele - diabético e hipertenso - teimava em não usar máscara na calçada de casa, no bairro Presidente Kennedy. No dia 27 de abril, já com dificuldades de respiração, João foi entubado na UPA do Cristo Redentor.
"Se eu morrer, cuide de tudo", foi uma das últimas mensagens que o pai enviou. Seis dias e dez paradas cardíacas depois, o idoso morreu. "A saudade é tão grande que só sabe quem passa. Nossa vida mudou muito de um dia para o outro. Todos os dias eu choro. Minha mãe está morando comigo porque a gente não consegue voltar à casa onde eles viviam", conta a supervisora de atendimento.
Dos óbitos em UPAs no Ceará, 551 ocorreram em Fortaleza - 72% do total. A SMS afirma que os seis equipamentos municipais funcionam 24 horas e são indicadas para atendimento de urgência e emergência, adulto ou pediátrico. "Todas as unidades estiveram e permanecem abertas para receber pacientes com síndrome gripal, com oferta de testes de swab para pacientes sintomáticos. Os casos mais graves, de pacientes que necessitam de internação, são encaminhados para um leito da rede hospitalar", explica.
Retomada
A redução de atendimentos relacionados à Covid-19 se repete nas demais UPAs do Ceará. Das 36 unidades ativas no Estado, 28 reportam informações ao IntegraSUS. Na análise geral, foram 75% menos internações - de 2.778 entre 1º e 16 de maio a 708 do mesmo período de agosto - e 93% menos óbitos - 252 contra 17, na mesma série temporal.
De acordo com Emília Castro, coordenadora de Regulação, Controle, Avaliação e Auditoria da Sesa, a queda é "substancial". Contudo, ela alerta que a situação não indica o fim da pandemia ou que seja garantia do bloqueio de novos picos no Estado.
"UPA sempre foi aberta para toda e qualquer pessoa com comorbidade. É um ponto de atenção complementar entre a atenção primária e a hospitalar. Então, ela nunca vai deixar de ter muito movimento para quem precisa. Em relação à Covid, essa procura caiu, mas isso não quer dizer que estejam esvaziadas; estão realizando outros tipos de atendimento", observa a coordenadora.
Emília destaca que, "aos poucos", a procura pelos serviços de urgência e emergência tem se normalizado. "As pessoas ainda têm temor em procurar locais onde houve atendimento em massa de pacientes com Covid. Principalmente entre quem não teve quadro clínico", aponta.
Além da ocupação dos leitos, segundo Castro, outro importante indicador monitorado por autoridades de saúde é o uso de pontos de oxigênio, que indicam maior gravidade dos casos - e estes também estão em queda, garante.