Há três situações ocorrendo ao mesmo tempo. Primeiro, o Ceará vive um aumento no número de novos casos da Covid-19, após meses de queda nos registros. Segundo, festas de Natal e Réveillon se aproximam e podem gerar aglomerações em eventos de alta disseminação do vírus. Terceiro, o Governo do Estado prospecta alguma vacina para o início de 2021, embora ainda não haja nada definido.
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Nesse quebra-cabeça de peças difíceis de encaixar, cabe à gestão definir planos de ação para impedir o retorno dos hospitais lotados, em abril e maio, quando dezenas de cearenses morriam todos os dias. A secretária-executiva de Vigilância e Regulação da Secretaria Estadual da Saúde (Sesa), Magda Almeida, lembra que a segurança sanitária não deve ser preterida em nome de algumas horas de diversão.
Muitas pessoas criticaram as novas regras sobre as restrições em festas de fim de ano, mas por que elas foram necessárias?
Existe todo um contexto sociocultural. Talvez, se não houvesse as festas de fim de ano, a gente não precisasse tomar essas medidas. Somos um Estado com grande potencial turístico e não houve fechamento de barreiras, então há circulação de pessoas e do vírus. Essas medidas tentam frear a velocidade dos casos para que não seja rápido como foi em maio, e para que não tenhamos uma ocupação explosiva dos leitos.
De que forma o Governo espera que o novo decreto ajude a não avançar para uma fase mais restritiva?
A fase mais restritiva tem o principal objetivo de reduzir a mortalidade, num cenário em que não tem leitos suficientes. A gente não quer que chegue nessa fase. No momento, está havendo um aumento preocupante, mas em velocidade reduzida. Conseguimos ajustar a disponibilidade da infraestrutura hospitalar com essa demanda. Nas festas, você tem mais contato desprotegido, sem máscara, e circula com pessoas que não são da sua convivência habitual, então tem um risco maior.
As regiões de Fortaleza e de Jaguaribe estão com ocupação alta. Se houver necessidade, quantos leitos podem ser reabilitados para atender à Covid-19?
A gente sente essa pressão assistencial. Há dois meses, acompanhamos nos hospitais privados e agora está passando aos hospitais públicos. À medida que vão aumentando os casos, a gente vai reajustando os leitos. Ainda temos leitos de UTI em todas as regiões, em vários municípios, e que podem ser reativados para Covid. Isso vai depender muito do fluxo da doença.
Há uma movimentação semelhante à primeira onda: cresce na Europa, depois na Capital. O que falta para se caracterizar a segunda?
Existe um comportamento sazonal de várias outras doenças, mas com a Covid vai ser a primeira vez que a gente entra em contato. Existe uma parcela significativa da população cearense que ainda está suscetível. Os inquéritos sorológicos que a gente fez mostram em torno de 20% dela com anticorpos, mas não sabemos quanto tempo eles duram. É muito difícil fazer essa análise no presente. Se vai ser segunda onda, provavelmente só vamos saber mais tarde.
Além do aumento de casos, ainda temos a preocupação com a reinfecção...
Hoje em dia está muito mais sólida a possibilidade de reinfecção ou reincidência. Precisamos contatar esses pacientes para ter o consentimento livre e esclarecido deles e estudar essas amostras. Uma equipe da vigilância vai até a casa deles fazer entrevistas. O próximo passo é enviar para um laboratório que faça o isolamento viral e confirmar se há reinfecção ou não. Os dois primeiros casos aqui do Ceará a gente enviou para análise, mas não foi possível verificar se era reinfecção ou não.
O estoque de testes do Ceará está seguro e dentro da validade?
Além do Ministério, também fazemos a compra de RT-PCR, e a Fiocruz fornece outros kits. Em relação ao equipamento e insumos para testes, a gente tem suficiente. Às vezes, o que ocorre são atrasos, testes que precisam rodar mais uma vez ou equipamentos que precisaram de ajuste.
Existe um monitoramento de casos por setores da economia, como indústria e construção civil?
A indústria é uma das atividades essenciais. Quando a gente fala em restringir as atividades, primeiro falamos nas não-essenciais para que a gente proteja o funcionamento das essenciais. Existe um grupo da saúde do trabalhador que acompanha esses setores, e realmente há alguns com baixa contaminação. O setor industrial foi um deles. As escolas, quando reabriram, tiveram casos isolados, mas não houve surtos. Quando a gente faz esse decreto de fim de ano, é querendo poupar esses setores para que continuem a funcionar.
Muitos municípios estão ansiosos sobre a vacinação. Como eles devem se preparar para ela?
Eles precisam fortalecer a atenção primária, que é onde vai haver a imunização. As equipes, as geladeiras e a rede de frios precisam estar bem estruturadas para que a logística, quando a vacina chegar, seja capaz de rapidamente alcançar a população-alvo. Uma coisa que vai ser muito importante de monitorar são as reações adversas à vacina. É importante treinar as equipes para, quando começarmos a vacinar, termos esse feedback de coleta em relação aos efeitos adversos. Provavelmente, alguns prefeitos vão renovar as equipes, e estamos esperando essa posse para que a gente não treine pessoas que não estarão aplicando a vacina.
E como está sendo a preparação do Estado?
Estamos reestruturando a câmara de frios de imunização. Precisamos aumentar a capacidade dela com reforma e aquisição de freezers. A logística vai seguir a da imunização normal, então estamos na verdade reforçando, vendo se a manutenção dos caminhões está ok. A preocupação realmente é a aplicação e armazenamento nos locais.
A Sesa pretende recomendar a prorrogação do estado de calamidade pública que vale até 31 de dezembro?
Enquanto não chegar a vacina, a gente vai estar muito suscetível a tomar alguma decisão considerando a eliminação do vírus ou a redução dele. Estamos ainda em emergência de saúde pública de um vírus que a gente não conhece totalmente e que tem alto poder de contaminação. Precisamos continuar nesse estado para, depois de um tempo, avaliar melhor.