Com lockdown, média de isolamento em Fortaleza vai de 50% para 54%

Dados de geolocalização mostram que as taxas de pessoas que ficam em casa na pandemia oscilam, ao longo dos dias, mas não atingem o recomendado pela OMS, que é 70% . Novo decreto de isolamento vigora até 31 de maio

Já noticiamos que Felipe perdeu a mãe saudável; Meg viu o pai morrer da noite para o dia no quarto dela; Francisco deu adeus à "filha do coração", de 32 anos; e Márcio Araújo, o atleta olímpico, foi parar na UTI aos 46 anos pela Covid-19. Histórias reais que parecem não ser suficientes para ampliar os índices de isolamento no Ceará, nem mesmo após a adoção de medidas mais rígidas em Fortaleza.

O lockdown passou a valer na Capital no dia 8 de maio. Na semana anterior à adoção da medida - de 1º a 7 de maio -, a média do índice de pessoas que permaneceram em casa, o chamado índice de isolamento na Capital, conforme informações da empresa de inteligência de dados Inloco, foi de 50,93%. Já na semana seguinte - 8 a 14 de maio -, a média foi para 54,37%. Do dia 15 até o dia 19 de maio, a taxa média foi 54,20%. Apesar do aumento de permanência nas residências, a taxa média ainda está distante do ideal de 70% orientado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Fortaleza, conforme a última atualização- às 17h38 de ontem- da plataforma IntegraSUS, da Secretaria Estadual da Saúde (Sesa), tem, até o momento, 18.010 casos confirmados de Covid-19 e 1.333 pessoas mortas pela infecção. No Estado, são 30.560 confirmações e 1.900 óbitos.

 

Dinâmica

Embora os efeitos do isolamento não sejam sentidos de forma imediata, os dados sobre os registros de casos de Covid-19 nas últimas semanas evidenciam qual a dinâmica do contágio. Entre os dias 24 e 30 de abril, o número de casos novos foi 3.061. Na semana seguinte, - de 1º a 7 de maio - anterior ao lockdown, foram 2.381 novas ocorrências. Na primeira semana de vigor das regras mais rígidas - 8 a 14 de maio -, foram 1.255 novas confirmações.

Nesse mesmo período, no Ceará como um todo, onde um decreto do Governo do Estado endureceu medidas de combate ao coronavírus, a média dos índices de isolamento na semana de 24 e 30 de abril foi de 47,4%. Essa taxa se manteve antes do lockdown, entre os dias 1º e 7 de maio. Já na semana que teve medidas mais rígidas de isolamento, o índice médio de permanência dos cearenses em casa passou para 50,7% no Estado.

Ontem, em um anúncio conjunto, o Governo do Estado e a Prefeitura de Fortaleza confirmaram a prorrogação do decreto de isolamento social no Ceará até 31 de maio. As medidas mais rígidas seguem em vigor na Capital até a mesma data. Conforme o governador, Camilo Santana, as normas dos decretos passam a valer hoje (21). Nas cidades mais afetadas pelo coronavírus, o Governo também recomenda a adoção de ações mais rígidas dos prefeitos para diminuir a velocidade de contaminação.

"Melhoramos, mas ainda sem chegar ao nível que precisávamos, próximo de 70%. Ainda assim conseguimos reduzir a velocidade de transmissão do vírus, e em paralelo houve um incremento no sistema público de saúde. Não podemos achar normal que 60 a 80 cearenses morram por dia de uma doença infecto contagiosa", disse o prefeito Roberto Claudio durante o anúncio da prorrogação do lockdown.

Conforme dados do IntegraSUS, depois de Fortaleza, Caucaia (com 1.047 confirmações), Sobral (838), Maracanaú (695) e Itapipoca (530) são as cidades que registram mais casos no Estado, até o momento.

Isolamento

A professora do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará (UFC),Danyelle Gonçalves, tem, junto a outros pesquisadores do Laboratório de Estudos em Política, Educação e Cidade (LEPEC), da UFC e do Laboratório de Direitos Humanos, Cidadania e Ética (LabVida) da Universidade Estadual do Ceará, investigado a dinâmica da vida social em meio à pandemia do coronavírus nas comunidades de Fortaleza, e avalia que os motivos para o não cumprimento massivo do isolamento são diversos e de "ordem econômica, mas principalmente de ordem cultural e política".

Econômica, explica ela, pois, efetivamente há uma parte da população que não pode ficar em casa: "que continua trabalhando nesse período, tanto em atividades essenciais como pessoas informais ou com pequenos comércios, e acabaram não cumprindo esse isolamento". A pesquisadora também destaca que há situações de desigualdade e pobreza, que "forçam que as pessoas continuem fazendo alguma coisa pra conseguir dinheiro. Tem muitos trabalhadores domésticos, que trabalham em clínicas, hospitais, condomínios, motoristas de ônibus, pessoas que trabalham na rua", afirma.

Danyelle também enfatiza que, para os próximos períodos, é preciso expor de forma clara para a população a necessidade de um isolamento social mais rígido. "Não é agradável pra ninguém ser forçado a ficar em casa, mas a única evidência científica de barrar o contágio é o isolamento. Mas é preciso também informar pra população todo esse passo a passo", destaca a professora.

Tráfego

Em relação ao tráfego de veículos em Fortaleza, segundo dados da Autarquia Municipal de Trânsito e Cidadania (AMC), o Índice de Volume Veicular "teve uma melhora após o isolamento rígido". Conforme a pasta, os dados coletados por meio dos equipamentos de fiscalização eletrônica indicam que na semana antes da adoção de medidas mais rigorosas, 35% dos veículos estavam deixando de circular nas vias da Capital. Atualmente, esse índice chega a 50% dos veículos nos dias úteis. A AMC estima que esse é o maior percentual de redução dentre capitais brasileiras.

Os agentes de trânsito, diz a AMC, têm reforçado o trabalho de controle de circulação e abordagens preventivas. Uma evidência disso, segundo o órgão, é que do dia 8 ao dia 18 de maio, 8.268 veículos foram abordados nos comandos operacionais. As operações são realizadas em toda a cidade nos quatro turnos, informa a AMC, mas as operações priorizam bairros das regionais I e V que ainda apresentam elevados índices de desrespeito ao isolamento social.

Conforme a professora da UFC, Danyelle Gonçalves, um dos problemas relatados pela população na pesquisa sobre a dinâmica da vida social na pandemia é a fiscalização. "Numa cidade que tem muitos comércios e 121 bairros, a capacidade de fiscalização é limitada".

Em nota, a Agência de Fiscalização de Fortaleza (Agefis) informou que em 12 dias de isolamento social rígido - 8 a 19 de maio - realizou 507 ações de prevenção e monitoramento. As fiscalizações incluem encerramentos de festas, apreensão de paredão de som, abordagens a estabelecimentos abertos irregularmente, vistoria de obras e orientações em praças, orla, Centro e outros espaços públicos. Nas feiras irregulares, foram realizadas 35 operações para dispersar aglomerações, como feiras, diz a Agefis. A Guarda Municipal de Fortaleza e a Polícia Militar dão apoio à ação.