Alzheimer amplia riscos de morte por Covid; no Ceará, médico aponta piora cognitiva de pacientes

Além do alerta quanto ao fator de risco, na pandemia, por motivos diversos, o quadro dos paciente com a doença neurodegenerativa pode se agravar

As doenças neurodegenerativas que causam demência acentuam os riscos de gravidade e morte por Covid, e nos casos de pacientes com Alzheimer, o perigo de óbito é 3 vezes maior. Caso tenha mais de 80 anos, esse risco é 6 vezes maior. Os achados constam em um estudo feito por pesquisadores brasileiros, com base em dados clínicos do Reino Unido. No Ceará, o neurologista do Hospital Geral de Fortaleza (HGF), Norberto Frota, aponta que na pandemia, além dos riscos evidenciados na pesquisa, tem sido percebida nos atendimentos a piora cognitiva de pacientes pós-infecção. 

O artigo foi produzido por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Instituto Butantan. Objetivo foi avaliar se pacientes com doenças como Alzheimer e Parkinson são mais infectados, e têm maior risco de desenvolver formas graves e morrer devido à Covid.

Além disso, saber se a idade avançada acentua esses perigos. O estudo foi publicado, em abril, na revista Alzheimer 's & Dementia: The Journal of the Alzheimer 's Association. 

Os pesquisadores investigaram o número de diagnósticos positivos, hospitalizações e mortes em um grupo de 12,8 mil pacientes acima de 65 anos testados para a Covid, ainda na primeira onda em 2020.

As informações usadas são do banco de dados “UK Biobank” do Reino Unido. Isto porque, segundo os pesquisadores brasileiros, os dados permitiam uma análise detalhada, pois registram as doenças preexistentes e indicam os pacientes testados, hospitalizados e os que morreram em decorrência da doença. 

As análises estatísticas da pesquisa apontam que todas as causas de demência e, especificamente, a doença de Alzheimer, foram fatores de risco para gravidade e morte de pacientes hospitalizados contaminados pelo coronavírus, independentemente da idade. Além disso, no caso de pessoas com Alzheimer, e mais de 80 anos, os riscos foram 6 vezes maiores, comparado a pacientes menos idosos. 

Agravamento do quadro dos pacientes

“Eles observaram na pesquisa que mesmo corrigindo para idade, para fatores como hipertensão ou fatores cardíacos, o fato de ter um quadro demencial ou ter doença de Alzheimer é um risco para ter Covid, para hospitalizar e também para morrer”, explica o médico neurologista do Hospital Geral de Fortaleza (HGF), Norberto Frota. 

O médico aponta que a pesquisa não chegou a mensurar por qual motivo isso ocorre, mas traz, além dos resultados, algumas hipóteses. No Ceará, acrescenta ele, nos atendimentos ambulatoriais, médicos têm observado também piora cognitiva nos pacientes com Alzheimer tanto pós-infecção, como no “pós-confinamento”. 

“No HGF, temos feito muitas consultas por telemedicina, e muitos pacientes, ao ligarmos, para fazer o contato do acompanhamento, têm falecido. Isso reforça que o achado dos colegas na pesquisa, é perceptível. Teve uma mortalidade maior desses pacientes nesse período”.
Norberto Frota
Neurologista do Hospital Geral de Fortaleza (HGF)

No ambulatório do HGF, segundo o neurologista, são atendidos em média, 25 a 30 pacientes todas as terça-feiras. Na pandemia, as consultas passaram a ser remotas em boa parte dos casos. A piora cognitiva, afirma ele, é, dentre outros efeitos, gera o aumento da dependência e agravamento do comprometimento da memória.

Necessidade de proteção

Uma das ações que faz com que essas evidências sejam recebidas com menos alerta, é a vacinação contra a Covid.  No Ceará, dados do Vacinômetro da Secretaria Estadual da Saúde indicam que, até o dia 25 de maio, 99,7% dos 1,19 milhão de idosos (pessoas com 60 anos ou mais, institucionalizados ou não) previsto na meta do Estado receberam a primeira dose da vacina. E 63,4% já tomaram as duas doses. 

“Com a vacinação que foi feita, a gente se sente um pouco mais seguro para voltar às terapias que foram paradas”, ressalta o neurologista.

A família da idosa Hilda Santos da Cunha, de 84 anos, moradora de Fortaleza é uma das que comemora a vacinação. Há 14 anos, Hilda foi diagnosticada com Alzheimer, conta a filha Ana Lúcia da Cunha Cavalcante, dona de casa.

Hilda, cujo grau da doença não é avançado, explica a filha,  já tomou em casa as duas doses da vacina. Em mais de um ano de pandemia, ela que se dedica aos cuidados da mãe, relata que o clima é de alerta diante do medo da contaminação, e também de cansaço, devido às privações provocadas pelo isolamento. 

“A gente sempre levava ela para sair, fazer atividade. Nas sextas-feiras, ela ia no forrozinho dos idosos. Era um encontro deles mesmo. A gente fazia reunião da família em casa para estimular ela a lembrar das pessoas. Mas faz mais de um ano que estamos isoladas”, destaca a filha e acrescenta que a esperança é que o cenário melhore, para que logo a convivência social possa ser retomada. “No Alzheimer, quanto mais isolar, menos conversar, menos interagir, mais debilitado fica”, reforça. 

No Brasil, as doenças neurológicas crônicas foram incluídas, esse mês, entre as comorbidades consideradas para no grupo prioritário da vacinação contra a Covid.

Entre as condições neurológicas crônicas estão: doenças cerebrovasculares, doenças que impactem a função respiratória, doenças hereditárias e degenerativas do sistema nervoso ou muscular, indivíduos com deficiência neurológica grave, paralisia cerebral e esclerose múltipla ou condições similares. 

Já doenças como a Esclerose Lateral Amiotrófica (AME) e a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), Parkinson e o Alzheimer, não foram listadas especificamente pelo Ministério da Saúde na revisão do plano.