Construída ao redor do primeiro porto que ligava Fortaleza ao mundo, o Poço da Draga celebra 115 anos de memória e resistência em 2021. Para comemorar este marco, a comunidade tem sua história contada pelo olhar dos próprios moradores, através de fotografias de álbuns de famílias, reunidos na exposição “Poço 115 - um álbum imaginário para a comunidade visível”, coprodução de Álvaro Graça Jr., documentarista e morador do Poço da Draga, e Felipe Camilo, artista e pesquisador.
A versão dos moradores sobre essa história ganha espaço no site do Dragão do Mar nesta segunda-feira (14), a partir das 15h. A mostra fotográfica será acompanhada de um vídeo, publicado no YouTube do Dragão, em que os autores compartilham suas vivências e memórias no Poço da Draga, além de exibir fotos e relatos de moradores da comunidade, coletados ao longo dos últimos quatro anos.
A exposição é um braço da tese acadêmica de Felipe Camilo, intitulada “Comunidade Visível: Narradores de Imagens e Memórias do Poço da Draga”, desenvolvida no Laboratório das Artes e das Juventudes (Lajus). A ideia é que o resultado da exposição se transforme em fotolivro até o fim deste ano.
“A pesquisa buscava mostrar como a partilha de acervos de fotografias por celulares ou de fotografias impressas contribuía para construir sentimentos de pertença e para conservar a memória de populações negras ou majoritariamente negras, descendentes de pescadores e portuários da cidade de Fortaleza contra um apagamento sistemático da memória dessas populações no Brasil”, esclarece Felipe Camilo.
Séries
A mostra é subdividida em quatro séries fotográficas: "Poço 115" (2020-2021), "Resenha do Brasileirinho" (2020-2021), "Poço Acquario" (2019) e "Sobrepontes" (2021). O trabalho, desenvolvido em conjunto com o acervo fotográfico dos moradores da comunidade, também conta com a colaboração das fotógrafas Ivoneide Gois e Dayane Araújo.
“Poço 115” é uma homenagem ao aniversário do Poço da Draga. Na série, a maior parte das imagens fazem parte dos álbuns fotográficos dos moradores da comunidade, retiradas dos álbuns das famílias que dividem as ruas e a vizinhança da praia. Devido à pandemia, que cruzou o percurso do projeto em 2020, os registros passaram a ser compartilhados por um aplicativo de mensagens.
Já “Resenha do Brasileirinho” é uma homenagem ao time de futebol amador da comunidade, o Brasileirinho. O nome da série foi escolhido em alusão a “uma prática lúdica de narrar como que foi o jogo e eles faziam muito isso com fotografias em mãos”, explica Camilo. As fotos fazem parte do acervo de memórias de ex-jogadores do time, como o pai de Álvaro Graças Jr.
O rosto dos moradores em fotos 3x4 também estão presentes na exposição, com a série “Poço Acquario”, que reúne autorretratos em um aquário com água do mar, em alusão à obra inacabada do aquário de Fortaleza, empreendimento iniciado na gestão do ex-governador Cid Gomes, ao lado do Poço da Draga.
A última série “Sobrepontes”, sobrepõe fotografias de autoria de Felipe Camilo e Álvaro Graça Jr. “Em cima das fotos há lembranças. A gente brinca um pouco com as instalações, um pouco com as fotos. Fizemos ensaios com a câmera de película, com cada um fazendo as fotos em cima das fotos do outro. Foi uma experiência massa e única”, conta Álvaro.
“A série 'Sobrepontes', onde a gente sobrepõe fotografias com pontos de vista de cada um, é também uma metáfora para a mistura dos nossos laços de pesquisa, de criação artística e de amizade”.
Laços com a comunidade
A história de Álvaro com o Poço da Draga começou há 105 anos, quando o bisavô dele se mudou para a comunidade. De lá para cá, seis gerações da família Graça compartilham memórias do local, seja nas histórias contadas de pai para filho, seja nas lembranças eternizadas nos álbuns de fotografias.
Durante sua existência enquanto morador do Poço da Draga, o documentarista fez amigos nessa caminhada. Unidos inicialmente pela pesquisa, Álvaro e Camilo hoje nutrem uma amizade, que aprofundou a relação do artista e pesquisador com a comunidade.
“Minha relação com o Álvaro começou por conta da pesquisa em si e minha relação com o Poço é uma relação de morador de Fortaleza, de pesquisador da memória da cidade e da negritude. Desde a minha infância, o Poço da Draga foi um lugar de passagem, e com amadurecimento da minha pesquisa, eu acabei estreitando laços com a única comunidade da nossa orla turística que ainda resiste ali com seus moradores característicos”, pontua Felipe Camilo.
A exposição vai além do aniversário do Poço da Draga. Ela busca evidenciar no imaginário do fortalezense a história do universo familiar compartilhado por inúmeras gerações de descendentes de pescadores portuários por meio do acervo fotográfico construído ao longo de 115 anos de testemunho da comunidade.
“Esse projeto não foi só pensado para o Poço da Draga no seu aniversário de 115 anos, mas também para os 116, 117, para os 150. A minha ideia como morador, desde o meu primeiro contato com o audiovisual, sempre foi de montar um acervo, criar um próprio museu contando a história do Poço da Draga através de vários trabalhos que foram feitos dentro da comunidade”, completa Álvaro Graça Júnior.
Serviço
Exposição “Poço 115 - um álbum imaginário para a comunidade visível”
Segunda (14), a partir das 15h, no site do Instituto Dragão do Mar. Gratuito.