"Nas Garras da Patrulha" conquista outra marca considerável na trajetória de quase 40 anos do programa. Surgido na rádio Verdes Mares, em 1987, o humorístico completa 20 anos de existência na TV Diário.
Cléber Fernandes e Ery Soares, comediantes e atores responsáveis pelas vozes e manter esse legado no ar, preferem chamar o trabalho de uma "família".
Eles estão certos. Ao longo das décadas, profissionais como Djacir Oliveira, Paulo Lélis, Tom Cavalcante, Marcos Belmino (o "Ponhonhô"), Will Ferrari, Wilson Aguiar, Glice Sales, Wellington Muniz (O Ceará), Paulo Oliveira, Luiz Carlos Sales, entre muitos outros, solidificaram uma atração reconhecida nacionalmente.
Pelas contas de Cléber e Ery são mais de 170 personagens. A lista é vasta. Danduska, Elenilson Júnior, Feitosa, Fresquin, Froxilda Fofolete, Seu Grossélio, Sinira Beiçuda, Tabosa, Tizil, Pablo Peter. Cada um deles reserva um lugar no coração dos telespectadores.
Se, em anos anteriores, a atração explorava a dramatização bem humorada de notícias policias (daí, o nome "Garras da Patrulha"), a atração atualizou a linha editorial para os novos públicos de hoje.
Das ondas AM, as "Garras" correu o País em antenas parabólicas e segue o curso das demandas online do presente. É podcast, redes sociais e vídeos no YouTube.
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Comemorar duas décadas nas telinhas brasileiras reafirma um caso de sucesso na comunicação cearense.
"É por conta da linguagem muito popular. E o que é legal, apesar de ser uma expressão bem cearense, o povo brasileiro também consome as 'Garras'. É a cara do cearense essa molecagem, entendeu? Digo mais, tem uma linguagem 'cearensês' e as pessoas de outros estados aprenderam a entender as coisas que falamos aqui. Antigamente éramos obrigados a consumir a linguagem sulista. Agora, não", descreve Cléber Fernandes.
Ery Soares defende que a longevidade do programa acompanha as mudanças dos tempos. "Hoje, as Garras tem um humor atual". Diferente de décadas passadas, os episódios recentes exploram a criação de histórias, situações e personagens", explica.
A dupla destaca a presença e força de uma estrela do rádio cearense, o único remanescente da primeira geração das Garras da Patrulha. Djacir Oliveira, no alto dos 81 anos, continua fazendo a alegria de inúmeros ouvintes. As "Garras" são o produto de suor e dedicação de diferentes gerações.
"Nós temos ele como uma referência", detalha Cléber. Por conta da pandemia, Djacir segue em casa, mas, segundo os amigos, recebeu a segunda dose da vacina contra a covid-19 e a torcida é que ele retorne quanto antes aos estúdios.
Surgimento
O projeto foi originalmente criado para o contexto da rádio AM Verdes Mares. Estreou em 1987, com o batismo de “Patrulha Policial”. O nome “Garras da Patrulha” veio posteriormente. O trabalho era organizado com radioatores que encenavam casos policiais do dia a dia.
Na monografia de conclusão do curso de comunicação social (jornalismo), “A Cultura regional e sua representação na produção de televisão da cidade de Fortaleza: Um estudo de caso do programa Nas Garras da Patrulha” (2014), o jornalista Antonio Rhodinelles analisa a força da atração em transmitir informação, entretenimento e contribuir para se para disseminar práticas e costumes do povo cearense. O estudo pode ser lido aqui.
"Seus personagens são dotados de uma identificação popular, por representarem imagens de personalidades do imaginário local, e sua linguagem se apresenta de forma a criar essa identificação com seu público, que possuem esse jeito cearense de falar, tão diferente, e motivo de orgulho de muitos cearenses que adotaram, gírias, expressões e palavras", observa o autor no texto.
Memória afetiva das Garras
"Quando eu era criança/adolescente, indo para o colégio, eu escutava as Garras", relembra Cléber. Interessava o trabalho, a graça que aquelas vozes propiciavam. À época, fã de desenhos animados, o hoje comediante profissional arriscava as primeiras imitações. "Um dia quero trabalhar nesse programa", falou para si.
"Entrar nas Garras não foi fácil. Todos que estiveram e continuam aqui foi por merecimento. Realizei esse sonho e a responsabilidade é grande. Crianças, adultos, todos gostam. A ficha só caiu com um ou dois meses, quando meus personagens caíram nas graças do povo. Já tinha experiência em rádios fora do Estado, de fazer vozes e personagens. Mas, sem dúvida nenhuma, fazer o trabalho na minha terra e dessa forma, foi uma consagração. A realização de um sonho", assume Cléber.
Ery Soares também declara ser fã desde muito novo. O que acompanhou o desejo de trabalhar na Verdes Mares. "Por conta do horário das aulas, eu gravava as 'Garras' numa fita K7. Quando era de noite eu ouvia. 'Esses caras são fuleiros demais', eu comentava. Por isso eu tinha a maior vontade de entrar aqui", descreve.
É a constatação de uma conquista sem igual, afirma. "É a cara do Ceará. Todo humorista quer estar aqui. Ouvia o Tom Cavalcante como um ídolo, depois o Wellignton Muniz...", situa o entrevistado.
Como surgem tantos personagens?
Para o roteirista, Cícero Paulo, "Nas Garras da Patrulha" consegue levar para a TV o cotidiano da população. A linguagem popular gera a identificação do público. Ele descreve um pouco da rotina produtiva do grupo. "Além das situações do dia a dia, nós temos os personagens fixos. Escolhemos um tema, uma situação e mandamos ver", confere.
.Cícero também elenca que o ambiente criativo da equipe é marcado pela liberdade. "O improviso dá o molho e está sempre presente", completa o integrante.
A inspiração está na observação da realidade, em gente de carne e osso que anda por aí. Cléber enumera alguns. "São pessoas que existem. O Cornélio... Seu Otacílio é meu pai. O Chico Pezão é Clodoaldo. Danduska é um amigo meu que corta cabelo e tem um salão de beleza no Montese...". Destes, algum é o mais querido para os atores?
"São como se fossem filhos. Não tem um específico", comenta o criador de Chico Pezão. Cléber divide que é comum determinado personagem encaixar bem em determinada mídia, em outras não. É o caso do "Raimundo Doido". "Já tentamos colocar ele na TV e já vimos que ele não encaixou. Mas, na rádio, ele é o bambambã. No entanto, todos carregam as Garras com o mesmo peso".
Segundo Ery, o Tiziu fez sucesso, é carismático e muito popular. Fora ele, a cria das Garras que é bastante lembrada é o Chico Pezão. "Por falar do futebol, ele caiu no gosto popular. Sempre tem que ter uma história nova. Não existe essa ideia de 'vamos criar um personagem pra estourar'. Criamos e, do nada, ele vira popular. Como o Raimundo Doido", estipula Ery.
Cléber reafirma a união do grupo. "Nas Garras é uma família. Tem os manipuladores, Bibiu, Charlote e Chapinha, bem como o produtor Fábio Nobre (no caso da TV Diário). Na rádio tem o Cícero Paulo", detalha.
Alegria num momento difícil
Ery Soares situa a grave situação do Brasil com a pandemia. Diante de um quadro marcado pelo luto de inúmeras famílias, o humorista completa explicando que o programa trouxe alento em dias tão pesados. "Nas 'Garras' viraram uma companhia do povo, de levar alegria para quem está em casa. Serviu pra levar o riso para muitas pessoas, finaliza.