'Como se comporta a mulher elegante?': conteúdos das redes geram debate sobre elitismo e preconceito

Assunto não é consenso entre consultoras de estilo; algumas defendem que estilo é uma forma de se comunicar, outras apontam que reforça estereótipos

Tendência no TikTok e no Instagram, as características de moda e comportamento de uma mulher elegante têm sido aposta de conteúdo por algumas consultoras de estilo e imagem. O que usar ou não, o que é elegante ou não, como se portar, entre outras regras, fazem parte do repertório de produções.  

Embora seja considerado um dos sete estilos universais, teoria criada pelas estadunidenses Alyce Parsons e Mimi Dorsey, a elegância na moda é questionada por alguns profissionais da moda por reforçar estereótipos, principalmente para as mulheres.  

Em um post no Instagram de janeiro deste ano, uma consultora de estilo, que não será identificada, escreveu que “a mulher elegante é educada, tem uma postura segura, se adapta a qualquer ambiente, sabe manter a calma mesmo diante de uma situação desafiadora, tem uma comunicação assertiva, não fala muito alta nem muito baixo, valoriza o próximo e sabe ser grata”.  

Na moda, esse estilo preza pelo uso de peças em alfaiataria, blazers, tecidos naturais como linho e algodão, cores neutras e poucas estampas. A ideia é ter uma presença marcante, mas não chamativa.  

Reforço de estereótipos  

A consultora de estilo Elaine Quinderé pondera que os discursos nas redes sociais estão saindo do campo da moda e atingindo questões comportamentais, reforçando padrões e valorizando uma estética branca, alta e magra. 

 “Quando a gente fala de roupa, existe uma mensagem, mas muitos conteúdos na internet estão falando sobre ética, valores, acaba sendo racista, preconceituoso, misógino. São peças que são mais conservadoras, mais atemporais e, historicamente, isso é nutrido por um comportamento que se beneficia dessas diferenças sociais”. 
Elaine Quinderé
consultora de estilo

Elaine destaca que esse estilo existe, mas que deve ser propagado como algo para todos. “A elegância pode ter mais de 50 anos, pode ser usada por uma pessoa gorda, com referências africanas, pessoa com deficiência, não é mais pra gente ligar conceitos a uma raça específica”.  

Comunicação e comportamento  

Consultora de estilo e imagem pessoal desde 2020, Caren Sales escolheu o estilo elegante para focar seu trabalho. Para ela, essa moda não está relacionada ao dinheiro, mas sobre saber escolher peças que fazem sentido para a pessoa.  

"Hoje, temos esses modelos pra todos os públicos, o negócio é aprender a escolher o tecido e a imagem que você quer transmitir. Existem, por exemplo, blazers de diferentes preços. Eu acredito que é conhecimento. Quando você entende o corte, o caimento, começa a entender o que faz sentido pra você”.  
Caren Sales
consultora de estilo

Além disso, Caren aponta que há uma “interpretação errada” sobre o estilo elegante. “As pessoas acham que qualquer coisa fora do estilo elegante é deselegante. Pode ser algo moderno, criativo, sensual, depende da comunicação que a pessoa quer passar com o vestir”. 

De acordo com a consultora, a pessoa tem, em média, até três estilos na vestimenta, dentre os sete (Natural Esportivo, Tradicional e Elegante, Romântico, Criativo, Sensual e Dramático Urbano). “Qualquer estilo pode trazer um visual elegante, mas, além da vestimenta, temos comportamento e outros âmbitos da elegância. Não adianta nada você se vestir com elegância, mas ser grossa, rude”.  

A visão é reforçada pelo professor de Design e Moda da Universidade de Fortaleza (Unifor), Ricardo Bessa. “Pra mim, elegância tem a ver com educação; em moda, é outra coisa. Essa questão de elegância é subjetiva. Pra mim, é estar bem consigo mesmo. Por que vou deixar de vestir algo que eu gosto só porque não é considerado elegante?”. 

‘Parecer’ rica 

Dessa forma, com uma leitura de algo mais harmônico e requintado, esse estilo pode comunicar riqueza. Esse "parecer" rica é até usado como estratégia para que mulheres, especialmente, consigam acessar certos espaços que são negados ou mesmo para conquistar autoridade e respeito no ambiente de trabalho, por exemplo.  

“O famoso 'me vestir pra ficar com cara de rica' deixa muito claro que existe uma cara de pobre. Só que olha o País que a gente vive: totalmente desigual, tem pessoas morrendo de fome. Quando eu digo pra você se vestir pra se sentir de alguma forma, isso é fantasia, não é vestir de si mesmo”, destaca Elaine.  

“Dentro desse estudo da imagem, a gente percebe que nada se sustenta por muito tempo se aquilo não for legítimo e, quando a gente entra na questão do comportamento, é um assunto que leva pro lado pejorativo coisas até que são culturais nossas”.  

Essa estética, inclusive, tem despontado como uma nova tendência que faz referências àquelas pessoas que já nasceram herdando grandes fortunas, conhecida como old money (em tradução livre, dinheiro velho). Uma coisa bem à la Blair Waldorf, de Gossip Girl.  

Estilo definido limita? 

Outra questão que envolve o assunto, já que se apregoa algumas regras, é que esse estilo acaba por limitar a criatividade no vestir. “Acaba-se criando estereótipos ou reprodução de certos padrões, deixando de ter personalidade própria”, defende Ricardo.  

Para Elaine, definir um estilo é negar a multiplicidade do ser humano. “Deixa de lado o fato de que a pessoa pode acordar totalmente diferente num dia. O estudo é válido, mas em nenhum momento considero isso um enquadramento fixo. Não acredito que existam peças que pode ou não usar”.  

Caren, por sua vez, não acredita que um estilo definido seja limitador. “Você precisa se conhecer. Quando você faz a consultoria, a gente senta, conversa, entende o contexto. O desejo de querer aderir ao estilo elegante tem a ver com a imagem que quer comunicar e com o que gosta de vestir”.