Em meio as investigações de pirâmides financeiras no Brasil, o prejuízo chega a cifras bilionárias. Desde 2017, os golpistas envolvidos no esquema deixaram 2,7 milhões de pessoas em todo o País no prejuízo, e movimentaram aproximadamente R$ 100 bilhões.
O levantamento é exclusivo do Fantástico, da TV Globo, e traz o recorte das 20 empresas investigadas no Brasil. Os principais meios para atrair vítimas para o golpe das pirâmides financeiras foram as criptomoedas, moedas virtuais com valor apenas na internet.
Lucros acima da média foram uma das iscas e, nas redes sociais, diversos vídeos fisgavam as vítimas vislumbrando um enriquecimento em um curto espaço de tempo.
“Ei, pobre, sabe por que você não é rico? Porque não tem consciência de quem é. A minha mente é milionária, por isso que me tornei milionário. Olha no meu olho e vê se eu tenho dúvida do que eu tô construindo", mostrava outro vídeo.
Uma das empresas envolvidas na investigação da Polícia Federal (PF) era a Braiscompany. O dono, Antônio Neto, e a esposa, Fabrícia Campos, sumiram após as vítimas começarem a se multiplicar.
“A forma que o cara olhava, as lives que ele fazia todo dia, o poder de convencimento que esse cara tinha, que a coisa era real”, conta Acelino Popó, campeão mundial de boxe, uma das vítimas que aplicou R$ 1,2 milhão no esquema.
“Meu filho, eu entrei em depressão. Ajuntei com a minha família, pra botar tudo lá pra gente realizar o sonho”, diz Dona Maria, outra vítima, que investiu R$ 97 mil.
Vida de luxo
Renan Bastos, da FX Winning, que movimentou R$ 2 bilhões e vive nos Estados Unidos, foi localizado pela reportagem. Ele chegou a morar em um apartamento em Miami - em um anúncio na internet, o aluguel de apartamento no mesmo condomínio custa em torno de US$ 40 mil, R$ 200 mil na cotação atual.
O dono da empresa investigada tem dívidas com os credores que ultrapassam a casa dos R$ 100 milhões. Renan Bastos continua compartilhando nas redes sociais momentos do dia a dia que incluem gastos milionários.
No ranking criminoso, elaborado pela reportagem com informações oficiais, a empresa que deixou o maior rastro de vítimas foi a Trust Investing.
- 1,3 milhão de pessoas em 80 países, incluindo o Brasil;
- Prejuízo acumulado das vítimas apenas desta pirâmide passa dos R$ 4,1 bilhões.
Patrick Abrahão, preso em outubro de 2022, se apresentava como líder da empresa, mas diz não ser um dos donos: “Eles alegam que eu sou sócio da Trust. Todo mundo que me acompanha sabe que eu nunca fui sócio, eu sempre fui um investidor", declara. Ele foi solto no mês passado.
“A atuação do Patrick era direta. O Patrick recebia dinheiro em conta pessoal dele dos investidores. A Polícia Federal não tem outro entendimento que a que a participação total do Patrick até porque foi denunciado também existe outros elementos de prova como quebra de sigilo bancário e fiscal em cima dele”, diz Marcelo Mascarenhas, delegado da Polícia Federal.
Na lista das empresas consideradas pirâmides financeiras, a que movimentou mais dinheiro foi a GAS. Foram R$ 38 bilhões, volume grande o suficiente para transformar Glaidson dos Santos em "faraó dos bitcoins".
Ele está preso, além dos crimes financeiros, por ser acusado de matar o investidor em criptomeda e influenciar digital Wesley Pessano e ser o mandante da tentativa de assassinato de Patrick Abrahão.
Investigação
A Câmara dos Deputados abriu Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a atuação das pirâmides financeiras com criptomoedas no Brasil. O presidente da Comissão é o deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade).
“A gente teve a oportunidade de escutar seus representantes, trabalhadores dessas empresas e ter clareza do que elas ofereceram aos clientes, como se dava a operação e o que se tornou as pirâmides quando as pirâmides não conseguiram mais pagar e devolver aos seus clientes os lucros prometidos”, relata Aureo Ribeiro.
Patrick foi ouvido pela CPI, assim como Glaidson. A PF já confirmou que ele tem criptomoedas guardadas e que estão numa carteira digital apreendida há dois anos. São mais de 318 mil dashcores - outro tipo de criptomoeda - à época avaliadas em R$ 437 milhões.
A PF monitora as carteiras digitais dele, mas ainda não tem as senhas que permitiram movimentação. As vítimas ainda não conseguiram recuperar nada. Desde junho, o Brasil tem uma lei para o mercado de criptomoedas, que reconhece o que são ativos digitais e trata das responsabilidades dos intermediários e prestadores de serviço, mas ainda precisa ser regulamentada pelo Banco Central.
A lei criou também um novo tipo penal: o 171 A. É o mesmo crime de estelionato que já existia - mas com o agravante quando se tratar de criptomoedas. A CPI foi prorrogada até o fim de outubro, mas já definiu que a legislação recém-criada precisará ser atualizada.