Miguel Nicolelis, médico e cientista brasileiro, dava uma palestra em Pequim quando, no dia 8 de novembro de 2019, precisou voltar às pressas ao Brasil. Dois meses depois, em janeiro deste ano, o professor viajou para os Estados Unidos, onde começou a acompanhar as primeiras notícias de um novo vírus encontrado em Wuhan, na China. Poucos dias depois, desembarcou em Munique, e viu através do monitor do aeroporto que o primeiro caso de Covid-19 havia sido confirmado na cidade alemã.
Na época ainda não era possível saber a dimensão que o vírus tomaria no mundo. Começando pela Ásia, Europa e Estados Unidos, a doença fez a primeira vítima brasileira no dia 12 de março. O cientista e o professor, no entanto, já sabia muito sobre a doença que afetaria o mundo.
Nascido em São Paulo, Miguel Ângelo Laporta Nicolelis,59, foi considerado um dos 20 maiores da neurociência no começo da década passada. Em 2014, o brasileiro liderou o desenvolvimento de exoesqueleto, que permitiu um jovem paraplégico chutar a bola na abertura da Copa do Mundo, no Brasil. Um "experimento histórico", disse. Seis anos depois, o rosto de Miguel Nicolelis seria um dos mais vistos em participações em programas de televisão para explicar sobre quarentena, higienização das mãos, uso de máscaras e, além disso, como o novo vírus encontrado na China poderia ser letal para a humanidade.
Guerra
Ainda no começo do ano, Nicolelis reativou seu canal no YouTube e passou a divulgar vídeos diários sobre o que estaria por vir. Foi convidado logo em seguida para liderar o Comitê Científico dos Governadores do Nordeste e aceitou o desafio. "O Brasil precisava se preparar", lembra.
"Nunca tive a sensação de estar numa guerra como nos últimos meses", conta. Para auxiliá-lo na tarefa de fornecer informações e aconselhar os nove governadores nordestinos, Nicolelis contou com o apoio de uma rede de pesquisadores e cientistas, muitos deles voluntários.
Patriota
"São os verdadeiros patriotas", assinala. O professor acha que nos últimos anos o patriotismo no Brasil esteve ligado à condutas questionáveis. Ele chama de "patriotada" e não de patriotismo o sentimento que captou, principalmente vindo de agentes políticos no poder. Os "patriotas verdadeiros" são, em sua visão, os cientistas, estatísticos, professores e professoras que, mesmo sem nenhum reconhecimento midiático, investiram tempo de pesquisa para aconselhar na condução da pandemia no Brasil.
O professor comemora que o Nordeste, de acordo com a Comissão Científica que lidera, é atualmente o 4º em número de mortes por 100 mil habitantes no País. "Os cientistas previam uma hecatombe na região", relembra. O trabalho dos cientistas, segundo o professor, foi crucial para manter a região abaixo da expectativa.
Ele se mantém otimista com a vacinação, e comemora o desenvolvimento do imunizante em tempo recorde no País. Para Nicoleis, é possível ter esperança de um 2021 melhor. "A pandemia expôs nossa fragilidade, e temos que repensar o modelo econômico moderno, podemos viver com muito menos, e de mandeira mais saudável", completa.