Alterações em uma proteína chamada P53 podem estar relacionadas ao surgimento de mais da metade dos casos de câncer do mundo. O estudo desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) aponta que a mudanças na proteína, que é uma das mais essenciais do organismo e considerada uma guardiã do genoma, pode ser responsável pela formação de tumores.
A principal função original da P53 é a de inibir a multiplicação de células doentes e, assim, suprimir o câncer. Geralmente, ela não existe em abundância no organismo, mas, ao ser alterada, perde essa funcionalidade e, então, há a formação de aglomerados cancerígenos.
Pela relevância na compreensão dos mecanismos do câncer, a pesquisa da UFRJ foi publicada na matéria de capa da revista científica britânica Chemical Science —referência na área de química aplicada à biologia e à medicina e publicada pela Royal Society of Chemistry, do Reino Unido.
O estudo foi iniciado em 2003 e financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Mudança de estado físico
Os cientistas realizaram a descoberta ao analisarem a estrutura da proteína em nível atômico. Os pesquisadores verificaram que os aglomerados cancerígenos surgem em função de um processo bioquímico chamado de mudança ou transição de fase, em que a proteína passa de um estado físico para outro. Ou seja, quando a P53 muda do estado líquido para uma espécie de gel e até mesmo para sólido é quando ela perde a função, permitindo a formação de tumores.
"A partir dessa mudança de fase errada, a P53 começa a alterar outras proteínas, gera uma bagunça nas células, e o desfecho trágico é o câncer" explica ao jornal O Globo o coordenador do estudo Jerson Lima Silva, professor titular do Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis e do Centro Nacional de Biologia Estrutural e Bioimagem da UFRJ.
Uma das funções da P53 é finalizar o ciclo de vida de uma célula, caso ela tenha algo de errado. Outra é reparar o DNA. No processo ela interage com centenas de outras proteínas. E, caso uma célula esteja defeituosa, a P53 deflagra um mecanismo chamado apoptose, que causa o suicídio da célula. Resumindo, a P53 normalmente ordena que as células doentes se matem, e com isso, mantém o corpo saudável.
Origem dos tumores
A P53 pode trocar o papel de guardiã do organismo por vilã por uma série de motivos. Mas o resultado quando essa alteração acontece é que, ao invés de interromper a vida de células cancerosas, ela passa a liberá-las.
A proteína é tão essencial e poderosa que o estudo estima que ela esteja por trás de mais da metade dos casos de câncer do mundo, como alguns tipos de tumores de ovário, mama, próstata, além de linfomas e leucemias.
As células cancerosas não cumprem suas funções, e passam a roubar nutrientes de outras células e produzem uma rede própria de vasos sanguíneos para se nutrir. Ela ainda se multiplicam descontroladamente — e formam aglomerados, ou seja, tumores.
Esse tipo de célula também consegue se esconder do sistema imunológico, que normalmente detecta e destrói células defeituosas. Além, de não morrerem quando deveriam. E, por causa disso, podem matar. As informações são do jornal O Globo.