'Quatro anos de tristeza', diz mãe de vítima da Chacina da Messejana

Onze pessoas foram mortas em quatro pontos próximos de Fortaleza na madrugada de 12 de novembro de 2015. Um total de 45 policiais militares chegou a ser denunciado pelos homicídios, mas apenas 31 vão a julgamento

Quatro anos já se passaram. Mas nem tudo passa. "É uma dor que não sara, que não passa, que não tem limites. Tem hora que eu tô dentro do ônibus e, de repente, as lágrimas escorrem. Por mais que a gente lute, a gente nunca mais tem tranquilidade, nunca mais tem paz".

A fala é de Edna Souza, mãe de Álef Sousa Cavalcante, morto aos 17 anos, no início da madrugada de 12 de novembro de 2015. A mulher que extrai a força para viver da luta diária por Justiça virou porta-voz das Mães do Curió, movimento criado por mães e outros entes queridos das 11 vítimas da Chacina da Messejana para fortalecer a sua voz.

"Mãe não pare filho para a Polícia matar. Principalmente quando não tem passagem pela Polícia. Quando a Polícia mata, é uma decepção muito grande. Cinco meses antes de se alistar no Exército, a Polícia matou meu filho. Eu tive um filho para cuidar de mim, para servir ao Exército, aí vem a Polícia e mata. Nós não podemos aceitar", contesta Edna.

A mãe enlutada conta que o fim de ano é ainda mais triste para ela. "Quando chega essa época, que fica perto de eu receber o 13º salário, é ainda mais triste. Meu filho sempre pedia um tênis e uma roupa de presente de Natal. E hoje, eu não posso mais dar a ele. Não existe mãe nenhuma que fique feliz depois da perda do seu filho. Principalmente quando é retirada pelo braço forte do Estado. São quatro anos de tristeza", conclui.

Acusados

Um total de 45 policiais militares foi identificado pelas investigações e acusado pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) pelos crimes ocorridos na Grande Messejana naquele dia, mas a Justiça Estadual não aceitou a denúncia contra um oficial. No último dia 30 de outubro, o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) julgou recursos à pronúncia e decidiu que apenas 31 investigados vão a júri popular pelos homicídios.

A decisão não entristeceu Edna: "A gente quer que pague quem realmente teve culpa. Se os outros foram absolvidos, eu acredito que eles não tenham a culpa que os 31 têm. O que eu quero é que pague quem tem culpa. Nós estamos lutando arduamente para os culpados serem condenados. Têm que ser preso, condenado e pagar pelos crimes. Acredito que isso logo aconteça".

O julgamento ainda não tem data marcada. Os réus, que respondem em liberdade, podem recorrer da última decisão a instâncias superiores ao TJCE - onde os três processos da Chacina se encontram. O procurador de Justiça José Maurício Carneiro, do MPCE, revelou à reportagem que não pretende ingressar com recurso contra as 13 impronúncias: "Entendemos que a impronúncia do juiz foi correta. Foi tudo de acordo com o que o Ministério Público propôs. Esperamos que os processos desçam para a primeira instância para serem julgados o mais rápido possível".

O advogado Walmir Medeiros, representante da defesa do policial militar Marcus Vinícius Sousa da Costa, alega que, durante o processo, "não se apontou a conduta de ninguém" e lembra que as vítimas foram executadas em pontos distintos da Grande Messejana, mas todos os policiais foram acusados pelas 11 mortes. "É impossível alguém estar em dois lugares no mesmo tempo", afirma. Porém, ele não pretende recorrer da última decisão do TJCE.

Já o advogado Paulo Pimentel, defensor do militar Marcílio Costa de Andrade, entrou com embargo no Tribunal de Justiça em que questiona a pronúncia do seu cliente e promete, se for o caso, ir a tribunais superiores. Ele alega negativa de autoria e também critica a ausência de individualização da participação dos PMs. "Nem o mínimo foi colocado, para patente prejuízo da ampla defesa", pontua. A defesa dos outros acusados não respondeu à reportagem ou não foi localizada.