A Vara de Corregedoria de Presídios de Fortaleza, da Justiça Estadual, permitiu que uma mulher visite o companheiro, que está preso e com quem ela tem união estável, mesmo sem escritura pública que comprove a relação. O pedido foi feito pelo Núcleo de Assistência aos Presos Provisórios e Vítimas da Violência (NUAPP), da Defensoria Pública Geral do Ceará.
Entretanto, o benefício será utilizado pela mulher apenas quando os presídios cearenses voltarem a receber visitas sociais, suspensas desde o último início do último 'lockdown' no Ceará, em razão da pandemia de Covid-19, em 5 de março de 2021.
O juiz Fernando Antônio Pacheco Carvalho Filho considerou, na decisão proferida no último dia 27 de maio, que o preso tem direito à assistência da família, previsto na Constituição Federal, e direito de receber visita de cônjugue, companheira, parentes ou amigos, segundo a Lei de Execução Penal.
Izabel dos Santos, moradora de Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), e o companheiro (identidade preservada), que está detido na Unidade Prisional Professor José Sobreira de Amorim, em Itaitinga, também na RMF, têm uma filha de seis anos. O juiz determinou que a Secretaria da Administração Penitenciária do Ceará (SAP) aceite a Certidão de Nascimento da menina para viabilizar o cadastro de visitação da mulher e para permitir o acesso da mesma à unidade penitenciária.
Se a SAP continuar a obrigar a escritura pública que comprova união estável, a Pasta "estará criando limitação abstrata que extrapola e viola normas de hierarquia superior, sobremaneira a Constituição Federal, que garante o direito à assistência da família como forma de facilitar a reinserção social do segregado", diz a decisão. Caso a determinação não seja cumprida, o Estado irá pagar multa diária de R$ 1 mil para Izabel.
O defensor público Bheron Rocha, membro do NUAPP, que ingressou com o pedido na Justiça Estadual em 10 de fevereiro deste ano, afirma que "é abusiva a exigência de realização de contrato de união estável ou de realização de matrimônio, especialmente porque demanda procedimento em cartório, deslocamento em tempo de epidemia e custos financeiros. Nem a Constituição, nem a lei não impõe essa limitação ao direito de visita".
Izabel não vê o companheiro há 10 meses. Ela está desempregada e, desde o ano passado, depende do Auxílio Emergencial, do Governo Federal, para se sustentar. Gastar esse dinheiro com custos do cartório, para adquirir a escritura pública de união estável, estava fora de cogitação para ela.
Tô recebendo essa notícia muito feliz. Eu espero levar paz para ele (companheiro). Levar notícias boas, que a filha vai fazer o ABC, que a gente está bem. Assim que possível, levar nossa filha. E ajudar ele, nesse momento tão difícil, de estar com a liberdade privada.
Questionada sobre a decisão, a Secretaria da Administração Penitenciária informou, em nota, que "ainda não foi notificada da referida decisão judicial". "A SAP também comunica que as visitas sociais permanecem suspensas e que retornará quando a situação da pandemia reunir condições de segurança sanitária para os internos, servidores e familiares", completa a Pasta, sem precisar a data que as visitas serão restabelecidas.
Decisão cria precedente, diz defensor público
O defensor público Bheron Rocha afirma que a decisão judicial a favor de Izabel dos Santos e do companheiro cria um precedente para demais companheiras de detentos do sistema penitenciário cearense, que têm união estável, mas não têm escritura pública, para também alcançarem o direito de visita.
"Ela pode procurar a Defensoria Pública, através do Núcleo de Assistência aos Presos Provisórios, para exercer o direito dele de ser visitado e dela, de fazer a visita", garante o defensor público. Os contatos do NUAPP são (85) 3101.1263, 3101.1267, 98775-0480 e 98529-7412 (esse último WhatsApp).
A Vara de Corregedoria de Presídios de Fortaleza já havia permitido, em fevereiro deste ano, que a irmã de um detento da Casa de Privação Provisória de Liberdade Agente Elias Alves da Silva (CPPL IV), em Itaitinga, realizasse o cadastro de visitante junto à SAP para ver o irmão - que é solteiro e perdeu a mãe, que o visitava com frequência, em maio do ano passado. Bheron destaca que o direito de visita não é exclusivo a companheiras e mães.