Homem é solto depois de nove meses que a Justiça Estadual decretou sua liberdade no Ceará

A direção do presídio alegava que havia uma pendência em outro processo criminal, o que não foi confirmado pela Justiça

A espera de um homem para deixar um presídio da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) chegou ao fim no início deste mês de junho, depois de mais de nove meses que a Justiça Estadual havia decretado a sua liberdade. Durante esse tempo, a direção da Unidade Penitenciária alegou que havia uma pendência em outro processo criminal, o que não foi confirmado pela Justiça.

O Núcleo de Assistência aos Presos Provisórios e às Vítimas de Violência (Nuapp), da Defensoria Pública do Ceará, acompanhou o interno (identidade preservada) nesse período. O defensor público Bheron Rocha lembra que, ainda no dia 24 de agosto de 2020, a 2ª Vara de Execução Penal da Comarca de Fortaleza expediu o alvará de soltura do preso - que cumpria pena de 6 anos e 2 meses de reclusão, pelo crime de roubo.

Entretanto, quando a ordem chegou no Centro de Detenção Provisória (CDP), em Aquiraz, a antiga direção alegou, em ofício datado de 4 de setembro do ano passado, que não poderia colocá-lo em liberdade por "constar restrição" em outro processo criminal, da 2ª Vara do Júri de Fortaleza. "O mandado de prisão, entretanto, não foi localizado nem no processo, nem nos bancos de dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), apesar das minuciosas buscas", afirma Bheron.

O Nuapp ingressou com habeas corpus no TJCE para garantir o direito do interno. O desembargador solicitou informações da Primeira Instância, então a 2ª Vara de Execução Penal respondeu, em 18 de maio do ano corrente, que "o Alvará de soltura se encontra expedido e válido, restando a unidade dar cumprimento tão logo cesse a prisão por outro processo". E a 2ª Vara do Júri confirmou, no dia 31 de maio deste ano, que "em pesquisas realizadas nos sistemas disponíveis, a cargo da Secretaria desta Vara, não foi localizado mandado de prisão expedido por esta 2ª Vara do Júri".

O homem foi solto somente no último dia 8 de junho, com o aval da nova direção do CDP. O defensor público Bheron Rocha pontua que "todos, inclusive o Estado, estão submetidos às regras da Constituição e da lei. Alguém só pode ser preso ou mantido na prisão se houver uma decisão judicial neste sentido. Se não há decisão judicial, a prisão é ilegal, e toda prisão ilegal gera prejuízo para a pessoa e para a própria sociedade". 

A atuação do NUAPP, em diversas ações, tem exatamente essa diretriz, evitar prisões injustas, desnecessárias e ilegais, combatendo o superencarceramento.
Bheron Rocha
Defensor público

Questionada sobre o caso, a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) sustentou que o detento "recebeu impedimento de soltura da Segunda Vara do Juri da Comarca de Fortaleza no dia 31 de agosto de 2020, como consequência de uma prisão preventiva mantida em decisão fundamentada".

"No dia 7 de junho deste ano, a SAP foi acionada pela Defensoria Pública do Estado para a execução de um alvará de soltura em favor do mesmo interno. Após nova consulta ao Poder Judiciário, verificou-se a condição necessária para a soltura do preso, o que ocorreu logo em seguida, no dia 8 de junho", completa a Pasta.

Casos como esse motivaram o Núcleo de Assistência aos Presos Provisórios e às Vítimas de Violência a ingressar com um pedido na Justiça Estadual para que a SAP cumprisse os alvarás de soltura em um prazo de 24 horas, após a decisão. O pedido foi acatado liminarmente pela 12ª Vara da Fazenda Pública, no dia 24 de maio deste ano, sob pena de multa para a Pasta.

MPCE irá investigar o caso

A Defensoria Pública solicitou e o Tribunal de Justiça do Ceará determinou o encaminhamento do caso ao Ministério Público do Ceará (MPCE), para apurar a responsabilidade de servidores públicos na manutenção da prisão do detento, mesmo depois de nove meses da expedição de alvará de soltura.

"Não se deve pensar antecipadamente em punição, mas em apuração dos fatos. Houve uma falha, e ela precisa ser identificada para que não se repita. O servidor encaminhou ofício ao juiz da Execução Penal com a informação de constatar restrição à liberdade na Vara do Júri. Essa informação ele retirou de algum lugar. Ele precisa mostrar de onde saiu essa informação, para que seja analisada a eventual falha da informação. Para melhorarmos o Sistema e evitar que casos assim se repitam", conclui o defensor público Bheron Rocha.