Produção de mandioca de Salitre entra em crise por baixa procura: 'hoje não se sustenta'

O impacto disso afetou também a geração de emprego

Reconhecida como a “Capital da Mandioca do Ceará”, título sancionado em 11 de junho 2018, após aprovação do projeto de Lei nº 16.571, Salitre possui 14 mil hectares de área plantada do produto, sendo reconhecida o maior produtor do tubérculo do Estado. Porém, seu cultivo, segundo os produtores, está se tornando, cada vez mais, insustentável pelo baixo preço da farinha. Na medida que os custos do plantio estão mais altos, o retorno financeiro tem sido pequeno.

A crise para dezenas de produtores acontece, justamente, quando Salitre viu sua área plantada de mandioca crescer, já que no ano passado alcançava 12 mil hectares, segundo a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Agrário. O mesmo aconteceu com o número de casas de farinha, que saltou de 106 para, aproximadamente, 200 unidades.  

De acordo com o produtor Elias Antônio Albuquerque, a procura está bem menor e isso causou uma queda considerável no preço da saca de farinha, com 50 quilos, que está sendo vendida por R$ 70. Em 2012, por exemplo, o mesmo volume chegava a ser comercializado por R$ 210. Paralelo a isso, os custos de produção aumentaram: “Subiu o combustível de trator, mão de obra, peças”, enumera. 

O impacto disso afetou também a geração de emprego. Apenas na sua casa de farinha, Elias chegava a mobilizar, há oito anos, entre 40 e 50 pessoas durante a safra, que acontece de maio a outubro. Hoje, emprega apenas seis. A farinha e a goma, que eram vendidas para Paraíba e Piauí, alcançando também outras regiões do Ceará, como Iguatu e Fortaleza, têm ficado mais restrita ao próprio Cariri e cidades do Pernambuco e Rio Grande do Norte.  

"Hoje, (a produção) não se sustenta. Quando se bota o custo de cultivo e produção, fica inviável”, sentencia o também produtor Gledyson Albuquerque. Nos seus cálculos, uma saca de 50 quilos, que antes se gastava entre R$ 11 a R$ 12 para se produzir, hoje tem um custo de R$ 45. “Isso sem falar o preço da mandioca que compra para plantar”, explica. Atualmente, a maior parte do plantio e colheita são mecanizadas. 

Na visão do produtor, a venda ideal da saca de 50 quilos deveria ser por R$ 117 para cobrir os gastos. No entanto, o mesmo volume de farinha da melhor qualidade tem saído por R$ 95. “Um prejuízo de R$ 22”, reforça. Gledyson acredita que isso tem acontecido pela oferta estar maior que a procura por consequência da crise financeira. “Sem incentivo, ficou à deriva”, completa.

Já Elias acredita que além da oferta ser maior, há uma falha na administração pública, porque parte da mandioca colhida poderia ser aproveitada para a produção de fécula, outro derivado da mandioca, onde a venda é bem mais rentável.

Farinha estocada

Em Araripina, no Pernambuco, onde há uma fecularia, 50 quilos chegam a ser vendidos por R$ 150, o dobro do preço da farinha pelo mesmo volume. “Deveria ter uma indústria de fécula na região. O Ceará só tem uma em Coreaú. Teve outra em Cascavel, que fechou, mas a região praiana para produzir o amido é ruim. O melhor é aqui na Chapada do Araripe”, sugere.  

A secretária de Desenvolvimento Agrário de Salitre, Luzinete Andrade, reconhece o problema e aponta que há mais de 50 sacas de farinha estocadas pelos produtores, ou seja, 2,5 toneladas. “O preço realmente está abaixo do valor”, admite.

Para resolver a situação, sua pasta se reuniu, no último dia 17 de agosto, com um superintendente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para que seja feita a compra do produto excedido.

“Mas que haja um do preço da tabela, porque está desatualizado, porque tudo aumentou e a tabela continua defasada”, reforça. O preço da farinha branca na tabela é de R$ 2,06 o quilo.  

A partir deste problema, desde o mês passado a secretaria está cadastrando os produtores que têm farinha estocada. Até agora, já listou 193 pessoas. “Enquanto isso, estamos articulando recursos. Enviamos ofício ao Conab e estamos aguardando”, completa Luzinete.  

Praga controlada

Ano passado, os agricultores de Salitre identificaram, uma praga conhecida como a broca-da-haste (pappista granicollis), uma espécie de besouro que perfura a rama de cima para baixo, põe seus ovos e gera a larva que ataca a parte interna da planta, impedindo seu crescimento.

Por causa dela, alguns agricultores temiam perder até 60% de sua produção deste ano, já que o inseto atacou a plantação que seria aproveitada na safra seguinte. Porém, o impacto foi menor que o projetado. “Aos poucos se acabou e a mandioca ficou bem. No entanto, tivemos que antecipar a safra para abril e, agora, está mais perto do fim”, explica Elias.  

A broca-da-haste também não atingiu toda plantação do município, ficando mais restrita às áreas na Chapada do Araripe. “A minha não atingiu porque trabalho com adubo, correção de solo”, completa Gledyson.

Em agosto do ano passado, a Empresa de Assistência Técnica Extensão Rural do Ceará (Ematerce) enviou um agrônomo, que identificou a broca-da-haste. Após isso, a Secretaria de Desenvolvimento Agrário de Salitre iniciou um plano de ação no seu combate, onde realizou visitas técnicas, coletas de amostras do inseto e um mapeamento das áreas afetadas. 

O trabalho de monitoramento seguiu em janeiro deste ano e, para solucionar o problema, a Secretaria firmou convênios com instituições como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Banco do Nordeste, Ematerce e a Secretaria de Desenvolvimento Agrário do Estado (SDA) para que sejam dadas assistências técnicas em manejo do solo e plantio de mandioca. Entre os dias 28 e 30 deste mês, serão iniciadas capacitações em três comunidades, já visando a safra de 2022.