Sobral. Em cartaz na Casa da Cultura de Sobral, até o dia 29 deste mês, a exposição "Zona de Litígio" reúne 16 obras, entre instalações, fotografias, vídeos e desenhos, de um coletivo formado por seis artistas, como resultado da pesquisa que retrata um período em que uma demarcação imprecisa de divisas, assinada por Dom Pedro II, em 1880, marcou o início das indefinições na fronteira entre o Ceará e o Piauí.
A disputa judicial pelas terras persiste até os dias de hoje, acarretando problemas não apenas estruturais entre as comunidades que ali vivem, mas abrindo lacunas sociais e políticas para cerca de 8 mil pessoas, na zona de disputas entre os dois estados. A situação de indefinição gerada pelo acordo secular mantém o impasse sobre uma área de 3.210Km de extensão, que abrange populações de 13 municípios cearenses e sete piauienses, afetadas diretamente pela falta de políticas públicas básicas, de ambos os lados, que garantam acesso à água, luz elétrica e educação.
Inventário poético
A mostra, que se define como um inventário poético, foi desenvolvida durante observações do grupo, ao longo dos 900Km entre Fortaleza e Oiticica, distrito de Crateús, um dos mais afetados pelo conflito. Passados 138 anos, a visão dos artistas traz à tona velhas discussões para chamar a atenção das pessoas para a crise que se agrava com o tempo. A exposição põe em dúvida não apenas quais seriam os impasses políticos envolvidos, mas por que uma decisão tomada no período colonial ainda afeta tantas vidas e gera tantos conflitos.
As peças não são assinadas, tendo sido criadas aproveitando as possibilidades naturais que os locais visitados proporcionaram, além de intervenções artísticas realizadas pelos idealizadores do projeto, que apresentam suas interpretações por meio de fotografias, vídeos, ou amostras de peças feitas pelo homem, ou moldadas pelo tempo.
"A ideia foi de aproveitar esses fragmentos coletados, juntamente com as performances criadas, para recontar essa história, e gerar reflexão nos visitantes", afirma Francisco Neirton, mediador de arte da galeria da Casa da Cultura de Sobral. O passeio dura, em média, 40 minutos. "Mas pode demorar mais, até porque a exposição tem uma certa interatividade com o público, para gerar reflexões, dúvidas e diálogos. Na medida em que o passeio avança, as pessoas vão tendo suas impressões sobre a situação que o litígio criou", explica.
Impressões
Para os artistas Filipe Acácio, Júlia Braga, Juliane Peixoto, Patrícia Araújo, Raoni Shaira e Samuel Tomé, idealizadores do projeto, "a viagem à divisa, remete ao que nunca acaba, e fala dos limites desenhados estarem num eterno movimento de demarcação e apagamento. Não há fronteiras fixas e quando a poeira da marca feita no chão se levanta, os grãos daqui e os de lá se misturam".
Foi justamente essa a impressão que a estudante de pedagogia Mayara Rodrigues teve ao visitar a exposição Zona de Litígio para um trabalho acadêmico. "Me identifiquei muito com tudo. Cada peça, quer seja fotográfica ou natural, me fez refletir sobre as condições de abandono em que essas pessoas vivem. O material é de extrema importância para nosso enriquecimento cultural", afirma.
À frente da disciplina Educação Arte e Movimento de uma faculdade particular do Município de Meruoca, a cerca de 36Km de Sobral, a professora Emanuela Melo levou uma turma de 12 alunos para apreciar a exposição e refletir sobre os temas propostos. "Isso colabora muito para as discussões sobre o conhecimento concreto. Ao visualizar essas obras, eles ampliam o saber sobre os muitos contextos que moldam nossa história. Após a visita, serão feitas pesquisas para aprofundar a temática, além da elaboração de trabalhos a serem apresentados em sala. Posso dizer que esses objetos mexeram muito com minha forma de pensar os espaços ao qual pertencemos, ou achamos que pertencemos", finaliza.
Mais informações:
Exposição "Zona de Litígio"
Local: Casa da Cultura de Sobral
Data: Até 29 de junho
Horários: Segunda a sexta-feira, das 8h às 12h e das 13h às 17h