Os traços feitos à mão traduzem o melhor do universo de Alexandre Rodrigues, artista de 17 anos. De Jaguaribe, no interior do Estado, ‘Xandoca’ - como assina suas obras - encontrou uma maneira de apresentar seu mundo, anseios e forma de ver o belo e o feio, que, no fim das contas, “são a mesma coisa”, como conta.
Diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista e uma história de superação, o jovem divulgou seu talento pela primeira vez, publicamente, na última semana, por meio de um vídeo do Instituto Federal do Ceará (IFCE), onde estuda.
Após a repercussão positiva do material, uma campanha pretende arrecadar doações para compra de materiais usados na criação de Alexandre. “Sempre fiquei de fora das situações e, por isso, comecei a observar as coisas ao meu redor”, explica Xandoca, que tem uma preferência clara pela forma de criação: “As coisas feitas à mão são diferentes, ficam com o traço mais natural. Gosto de desenhar com lápis de cor, de pintar com tinta, grafite".
Abandonado pela mãe ainda quando criança, Alexandre passou a ser criado pelo pai, em Nova Floresta, distrito de Jaguaribe. Neste ano, no entanto, Jocasta Diellya, irmã e responsável pelo jovem, decidiu trazê-lo para Jaguaribe, onde trabalha como professora.
Assim, o irmão encontrou, finalmente, um espaço para desenvolver habilidades que já carregava desde pequeno. “As pessoas sempre olham diferente para ele. A arte vem ajudando muito. Ele sempre produziu, mas a gente ainda não havia tido incentivo”, lembra a irmã.
Observando uma das tias, o artista também desenvolveu o gosto pelo crochê. “Tudo relacionado à arte eu gosto. É uma forma de demonstrar o que estou sentindo”, explica Alexandre. “A gente tem uma tia que faz crochê e ele sempre viu ela produzindo. Agora, ele disse que só olha no computador e cria, tanto o crochê como a pintura”, ressalta a irmã.
Espaço de Desenvolvimento
Hoje ele está matriculado no curso técnico em Informática para Internet, no Instituto Federal do Ceará, no interior do Estado, e faz parte do Núcleo Audiovisual de Jaguaribe (Naja), coordenado pelo professor de Sociologia, Marcos Vieira. O docente foi o responsável por dar o “empurrãozinho” que estava faltando para que 'Xandoca' finalmente tomasse coragem para divulgar suas produções.
"O interesse pelo Alexandre se deu em sala de aula. Eu percebia que ele ficava desenhando. Durante a pandemia, pedi para ele desenvolver uma série de desenhos pegando a temática da questão negra. A partir disso a gente fez uma edição e teve uma repercussão muito grande”.
Maria Brasilina Saldanha, pedagoga do IFCE, avalia a importância do trabalho para o desenvolvimento pessoal e profissional de Alexandre. “Ele saiu de um distrito e resolveu fazer o ensino médio novamente, já que queria se desenvolver dentro do IFCE para depois fazer uma faculdade. O autismo ocasiona essa dúvida. Aqui, ele encontrou um espaço para se desenvolver”, explica.
Ao todo, o Campus tem dois alunos autistas, um tetraplégico e dois estudantes com grau de deficiência intelectual. “Ele tem uma sinceridade muito grande e é muito objetivo, o que fez a gente conhecê-lo logo".
O Alexandre tem uma vontade muito grande de crescer, de se colocar. O que estava faltando era um local para ele ser ele. A gente não tá aqui para descobrir as pessoas, e sim para proporcionar que as pessoas se encontrem”.
Para Jocasta, irmã de Alexandre, todo esse movimento é muito importante para o desenvolvimento do irmão. “Ele sente a carência de não poder estar no IFCE. Sempre demonstrou que gosta muito dos professores, que dão muita atenção e realmente querem que ele participe das atividades”. Com a pandemia e suspensão das aulas presenciais, Alexandre já pleneja as melhores formas de matar a saudadeo. “Ainda vou andar por Jaguaribe para observar as situações. Espero que as aulas comecem logo, mudaram minha vida, minha forma de ver as coisas”, conta o artista.
Segunda Edição
Segundo o professor Marcos, desde a publicação nas redes sociais do Naja, na última quinta-feira (9), já foram mais de 3 mil mensagens de mais de 20 países parabenizando o trabalho de Xandoca. Após a repercussão, uma segunda edição já está programada.
“Vamos fazer sobre a cultura, a arte e o povo de Jaguaribe. Ele já começou a produzir e estamos fazendo a pesquisa, de forma virtual”, explica. O professor revelou, ainda, que uma campanha, denominada ‘Vamos Dar Asas a Quem Quer Voar’, objetiva arrecadar fundos para aquisição de insumos e doação a Xandoca.
“Estamos pensando em criar uma campanha de levantamento de fundos para adquirirmos pincéis, tintas, papel, etc. Ele trabalha com muita dificuldade e tudo é feito à mão. Estamos pensando em lançar essa campanha hoje (13) ou amanhã”.