4 dos 5 maiores açudes que abastecem o Ceará perdem água há uma década; estado é de alerta

Dos cincos principais reservatórios do Estado, apenas o Araras tem volume superior a 30%. Índices sugerem atenção

[Atualização às 12:51, de 04/01/22] O Sistema Verdes Mares noticiou anteriormente que o volume hídrico de 4 dos 5 maiores açudes do Ceará estava em 'situação crítica'. A informação correta é de que esses reservatórios estão em 'estado de alerta', conforme ressaltou a assessoria de comunicação da Secretaria de Recursos Hídricos (SRH) do Estado. "Considera-se crítico quando já está próximo do nível 0, quase seco", destacou a assessoria. 

Dos cinco maiores reservatórios cearenses, estratégicos para o abastecimento de mais da metade dos cearenses, quatro estão há quase dez anos sem recarga hídrica. Inaugurado em 2002, o Castanhão, maior açude do Estado, completa neste ano de 2022 uma década consecutiva de redução no seu volume hídrico.

Erguido com a missão de garantir segurança de abastecimento para a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), cuja população beneficiada ultrapassa a marca dos 4 milhões de habitantes, o faraônico reservatório está hoje com apenas 8,33% de sua capacidade. 

Desde que foi construído, o açude cuja capacidade total é de 6,7 bilhões de m³, nunca esteve totalmente cheio. O melhor índice foi em maio de 2009 (95,57%) e, o pior, no ano passado, em fevereiro (2,45%).

Outros gigantes estão em igual situação. O Orós, segundo maior do Ceará, construído na cidade de mesmo nome, também enfrentou quase dez anos de queda no volume (9 anos), tendo por exceção os anos de 2020 e 2021, quando houve substancial aporte, passando de 4,74% (em março de 2020) para 28% em junho deste ano. Hoje, o açude voltou a declinar em seu volume e tem apenas 22%.

Banabuiú, reservatório que ocupa o posto de terceiro maior do Estado, apresenta o pior cenário dentre os três e também está próximo de uma década de redução. Desde 2011 seu volume registra queda abrupta, passando de quase cheio (91%) em junho de 2011 para quase seco em março de 2018 (0,61%). Hoje o acumulado é de somente 8,21%. 

Figueiredo, açude da cidade de Alto Santo e quinto maior do Estado, completa a lista. O maior volume registrado nos últimos nove anos foi de apenas 9,20% (23 de maio). Entre 2014 e 2018 ele esteve com volume de armazenamento abaixo de 1%.

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Cenário oposto

O quarto maior açude do Ceará, o Araras, está em situação oposta aos três gigantes das águas. Em 2011 ele atingiu sua capacidade máxima tendo sangrado (100%) no mês de maio. Desde então, começou a perder volume, até atingir 5,47% em março de 2017.

Nos anos seguintes, nova recarga. Em 2020 voltou a sangrar (2 de junho) e hoje está com 63% de seu volume, o melhor índice dentre os cinco maiores reservatórios cearenses. 

Impactos

Castanhão, Orós, Banabuiú e Figueiredo externam uma realidade que historicamente causa preocupação.

O volume em cada um deles está distante da marca dos 40%, índice considerado pelo titular da Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará (SRH), Francisco José Coelho Teixeira, como "seguro para garantia total de abastecimento".

Qualquer volume abaixo desse recorte, acrescenta Teixeira, representa um alerta. 

Todos eles têm singular importância no abastecimento. O açude Orós abastece a região do Vale do Jaguaribe e envia água para Fortaleza sempre que a situação do Castanhão está delicada.

Já o Banabuiú, abastece a cidade homônima e Quixeramobim, ambas no Sertão Central. O Castanhão, além da RMF, abastece cidades do Baixo Jaguaribe: Limoeiro do Norte, Russas, Quixeré, Palhano, Tabuleiro do Norte e Jaguaruana, totalizando cerca de 4,5 milhões de pessoas. Juntos, os três açudes respondem pelo abastecimento de mais da metade da população cearense. 

Contudo, apesar dos baixos índices e da curva linear de queda observada ao longo de quase uma década, o volume atual dos três maiores açudes cearenses consegue conferir abastecimento à população em 2022, mesmo que não ocorra chuvas dentro ou acima da média.

O problema, portanto, está voltado para o ano de 2023. Caso não ocorra aporte significativo na próxima quadra chuvosa (fevereiro a maio), o abastecimento destas localidades pode ficar comprometido? 

Para o geólogo Yarley Brito, o baixo volume dos açudes é um sintoma de "que as bacias hidrográficas do Ceará estão exauridas". Ele acrescenta que hoje se "perde muito mais água [evaporação e consumo] do que se ganha [através das chuvas]".

"O cenário atual vai se replicar pelos próximos anos. Só quando tivermos uma quadra muito acima da média, muito fora da curva, daquelas raras, é que nossos grandes açudes vão voltar a ter grande volume. Hoje a demanda por água é altíssima, é impossível elevar essa carga só com chuvas regulares".

Segurança hídrica

Mas, e então, exposto isto, há chance de colapso hídrico no Ceará caso não tenhamos em um futuro próximo boas chuvas? Teixeira e Yarley consideram que não.

Apesar de reconhecer o baixo índice dos reservatórios, o titular da SRH lembra que nos últimos anos "o Estado realizou investimentos na área dos recursos hídricos e, assim, estamos mais resilientes e menos dependentes exclusivamente da chuva". 

Se fosse em outros tempos, essa seca prolongada que tivemos nos últimos anos seria muito mais grave e deixaria bem mais impactos. Hoje contamos com abastecimentos complementares, como o carro-pipa, e tempos importantes projetos, como o 'Malha D'água'. 
Francisco Teixeira
Secretário de Recursos Hídricos do Ceará

Brito concorda com a importância que o Malha D´água terá no semiárido nordestino, mas deposita na Transposição do Rio São Francisco todas as fichas para uma "efetiva segurança hídrica  no Ceará". 

"É nele [projeto de Transposição] que está nossa segurança. Todas as barragens do São Francisco estão cheias, há muita água. Essa água chegando aos nossos reservatórios, entrando pelo Sul do Estado, e depois indo até o Castanhão, vai trazer segurança, sobretudo para Fortaleza, onde a demanda é absurdamente grande", explica Brito. 

A pedido do Diário do Nordeste, a Cagece traçou uma métrica de consumo médio por ligação residencial no Estado. Em cidades do Interior, o consumo médio em 2021 foi de 8,55m³. Já em Fortaleza, esse consumo salta para, em média, 11,63 m³. 

"Com a chegada da Transposição, não acredito mais em colapso hídrico. Mas, é preciso uso racional das águas. Aliás, esses açudes só possuem água ainda devido a uma boa gestão participativa dos órgãos, como Cogerh e SRH. Caso contrário, com tantos anos de estiagem, poderíamos estar muito piores", conclui.