Um dos pastores apontados como responsáveis por comandar um gabinete paralelo no Ministério da Educação (MEC) teria pedido pagamentos em dinheiro e em ouro em troca de atuar para a liberação de recursos para a construção de escolas e creches. A informação foi revelado pelo prefeito de Luis Domingues, Maranhão, Gilberto Braga (PSDB), ao jornal Estadão, e divulgada nessa terça-feira (22).
Segundo o gestor, Arilton Moura propôs que ele pagasse R$ 15 mil antecipados para protocolar as demandas da cidade e, após a autorização do dinheiro público, o gestor deveria entregar mais um quilo de ouro — avaliado em R$ 303 mil na cotação desta quarta-feira (25).
"Ele [Arilton Moura] disse: 'Traz um quilo de ouro para mim'. Fiquei calado. Não disse nem que sim nem que não", contou Braga à publicação, para qual ainda afirmou não ter aceitado a proposta.
Conforme o prefeito, a conversa com o religioso aconteceu em abril do ano passado, durante um almoço no restaurante Tia Zélia, em Brasília, logo após um encontro com o ministro da Educação, Milton Ribeiro, na sede do ministério. A reunião, que estava fora da agenda oficial do titular, teria sido uma das diversas solicitadas pelos pastores Arilton e Gilmar Santos.
"Ele disse que tinha que ver a nossa demanda, de R$ 10 milhões ou mais, tinha que dar R$ 15 mil para ele só protocolar [a demanda no MEC]. E na hora que o dinheiro já estivesse empenhado, era para dar um tanto, X. Para mim, como a minha região era área de mineração, ele pediu 1 quilo de ouro”, contou Braga para o Estadão.
O gestor do município maranhense relatou que o pastor fez a proposta na frente de outros prefeitos de cidades do Pará e não teria pedido segredo sobre a conversa.
"Ele [Arilton] disse: 'olha, para esse daqui já mandei tantos milhões, para outro, tantos milhões'”, referindo-se aos recursos públicos do MEC que teria atuado para a liberação para as localidades. “Assim mesmo permaneci calado, não aceitei a proposta”, disse Braga, que informou não ter recebido as verbas federais que foi buscar na ocasião.
A reportagem do Estadão ainda apurou que, na ocasião, o pastor teria repassado os dados da própria conta corrente para que os prefeitos efetuassem os pagamentos de R$ 15 mil.
Milton Ribeiro nega interferência de pastores
Nessa terça-feira (22), o ministro da Educação negou que o presidente Jair Bolsonaro (PL) tenha pedido atendimento preferencial a pastores na liberação de recursos para municípios. Em nota, ele disse que desde fevereiro de 2021, foram atendidos in loco 1.837 municípios de todas as regiões do País, em reuniões "eminentemente técnicas" organizadas por parlamentares e gestores locais, registradas na agenda pública do Ministério.
"Registro ainda que o presidente da República não pediu atendimento preferencial a ninguém, solicitou apenas que pudesse receber todos que nos procurassem, inclusive as pessoas citadas na reportagem", afirmou.
Apesar disso, em um áudio revelado pela Folha de S. Paulo, o próprio ministro da Educação comenta que daria prioridade para os pedidos dos pastores e disse que a liberação de recursos foi um "pedido especial" de Bolsonaro.
Ribeiro negou qualquer irregularidade e disse que o fato de ser evangélico não influi no modo como comanda o ministério. "Independente de minha formação religiosa, que é de conhecimento de todos, reafirmo meu compromisso com a laicidade do Estado, compromisso esse firmado por ocasião do meu discurso de posse à frente do Ministério da Educação", afirmou em nota.
Como mostrou o Estadão, Gilmar e Arilton estiveram em pelo menos 22 agendas oficiais do Ministério da Educação desde o começo de 2021, sendo 19 com a presença do ministro. Em eventos pelo Brasil agendados pelos pastores, o ministro deixa claro a influência deles no MEC. Num dos vídeos obtidos pelo Estadão, o ministro afirmou que "as coisas aconteceram também pela instrumentalidade dos senhores" ao discursar em reunião com prefeitos para tratar de obras.