A bancada feminina no Senado Federal propôs um voto de repúdio ao ex-ministro e ex-governador do Ceará, Ciro Gomes (PDT), por “declarações preconceituosas, misóginas e agressivas contra a senadora Janaína Farias”, do PT. O documento foi apresentado na segunda-feira (8) e faz menção a entrevistas concedidas por Ciro, na semana passada.
Em um dos episódios, em evento do PDT em Fortaleza, na quinta-feira (4), ele se refere à senadora como “assessora de assuntos de cama”. Na sexta-feira (5), trecho de entrevista de Ciro ao portal A Notícia do Ceará, divulgado nas redes sociais, mostra o líder pedetista questionando a legitimidade de Janaína passa assumir o cargo na suplência do atual ministro da Educação, Camilo Santana (PT), titular do cargo.
Conforme justificou o grupo no documento apresentado pela bancada ao presidente Rodrigo Pacheco (PSD), o que o político proferiu representa “um retrocesso inaceitável às conquistas sociais e políticas alcançadas pelas mulheres”.
“O ex-governador do Ceará não somente agrediu fortemente a Senadora Janaína Farias, referindo-se a ela pejorativamente como 'assessora de assuntos de cama', mas também expôs uma visão de desrespeito e discriminação de gênero”, aponta trecho do requerimento. No documento, as declarações de Ciro são atreladas ao mesmo episódio, à entrevista ao portal noticioso. A aspa destacada, no entanto, não foi nessa ocasião, mas em evento partidário.
Repúdio no Senado
Quinze parlamentares subscreveram o requerimento que formalizou o voto. Elas consideraram o episódio como uma manifestação de violência política de gênero, que refletiria uma postura pessoal de “desvalorização das mulheres e uma resistência preocupante à participação feminina em espaços de poder e decisão”.
Ressaltando a importância da representatividade feminina no contexto político, as senadoras reforçaram a necessidade do fortalecimento da luta contra o machismo e a violência de gênero.
“As falas do Sr. Ciro Gomes revelam falha em reconhecer o valor e a competência das mulheres em cargos de liderança”, acrescentaram em outra parte do texto.
Reincidência e divergência de informações
Embora tenha sido atribuída à entrevista ao veículo A Notícia do Ceará, a declaração em que chama a senadora de “assessora de assuntos de cama”, alvo de repúdio das senadoras, foi proferida por Ciro à imprensa na quinta-feira (4), num evento do PDT, em Fortaleza, como mostrou o Diário do Nordeste.
“Quem está assumindo o Senado Federal hoje? Sabe qual é o serviço prestado para ir ao lugar de Vigílio Távora, de Tasso Jereissati, de Mauro Benevides, de Patrícia Saboya, que tinha uma longa história de políticas sociais, pioneira da política de creche? Aí vai agora a assessora para assuntos de cama do Camilo Santana para o Senado da República? Onde é que nós estamos?”, disse na ocasião.
O ex-governador havia sido questionado sobre o julgamento do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-CE) que abonou a desfiliação de parte da bancada do partido no Parlamento Estadual, na última quarta-feira (3).
Caso de Justiça
Segundo a senadora Janaína Farias, que comentou sobre o ocorrido através de sua equipe de comunicação, o caso será levado para a esfera judicial. “Estou em contato com meus advogados e vamos ajuizar uma ação. Atos como esses não podem ficar impunes sob pena de outras mulheres continuarem sendo vítimas disso”, alegou.
“Como já declarei anteriormente, é lamentável que esse tipo de agressão a uma mulher ainda persista na política cearense. A baixaria e a covardia parecem ser uma característica na trajetória desse político. Discriminação, o preconceito e a propagação do ódio contra mulheres são crimes e não podem ser admitidos”, adicionou.
Ainda de acordo com Farias, a medida tomada pelas colegas de plenário partiu do grupo, que a contatou e decidiu pela manifestação do voto de repúdio.
Posição do PT Ceará
A conduta do ex-ministro foi condenada pelo Diretório do Partido dos Trabalhadores no Ceará, em nota assinada pelo presidente estadual Antônio Filho, o Conin, e divulgada na sexta-feira.
“Isso demonstra claramente a dificuldade do Sr. Ciro em aceitar mulheres no poder e a sua falta de compromisso com uma sociedade que demanda cada vez mais representação, voz e vez para as mulheres. Isso têm se tornado marca do Sr. Ciro e uma das causas da sua crescente rejeição no eleitorado”, frisou o órgão partidário.
Que continuou: “O ex-candidato à Presidência, que ficou em quarto lugar, atrás inclusive de uma mulher, Simone Tebet, não aceita a igualdade na política. E muito menos, a igualdade entre os gêneros”.
O comunicado ressaltou ainda as qualidades da senadora. “É uma nova voz das mulheres, do Ceará e do sertão nordestino. Merece respeito e aplauso. Já o Sr. Ciro, enterra cada vez mais a sua história na política”, completou o partido.
Posição do PDT
No sábado (6), foi a vez do Partido Democrático Trabalhista (PDT) do Ceará se posicionar sobre o tema. Através das redes sociais, a sigla optou por prestar solidariedade a Ciro Gomes, pois, segundo a postagem, ele estaria sendo “vítima de acusações levianas e infundadas patrocinadas pelo PT do Ceará”.
“Um dos quadros mais honestos da vida pública e política do País, Ciro Gomes tornou-se alvo preferencial dos ataques petistas por adotar a postura de quem não tolera a mentira e a hipocrisia como elementos da ação política”, argumentou o conteúdo da manifestação.
O PDT Ceará mencionou também a presença de mulheres no primeiro escalão do seu governo como um atributo que refutaria as acusações de que o político havia cometido violência política de gênero.
“Ao tempo em que acusa Ciro Gomes de violência política de gênero, a direção petista do Ceará esquece de dizer que o ex-governador e ex-prefeito Ciro Gomes foi o pioneiro na composição de secretariado, com, no mínimo, metade da titularidade sendo ocupada por mulheres”, salientou.
A agremiação citou ainda o embate interno do PT na resolução do nome que irá representá-lo nas eleições de Fortaleza, afirmando que a legenda “silencia sobre a violência e o massacre que a sua direção e as principais lideranças do partido impõem à ex-prefeita e deputada federal Luizianne Lins no processo interno de escolha”.
A reportagem procurou a assessoria de Ciro Gomes e o presidente estadual do PDT Ceará, Flávio Torres, para que pudessem falar sobre o assunto. O ex-ministro não respondeu até a publicação desta matéria, o dirigente, por sua vez, disse que preferia não se pronunciar.