Vereadores banalizam concessão de medalha Boticário Ferreira na Câmara Municipal de Fortaleza

Sem regras para o assunto, algumas condecorações acabam se repetindo e outras são destinadas a categorias de interesse de alguns parlamentares

Pelo menos 118 honrarias foram concedidas a autoridades, apenas na atual legislatura, pela Câmara Municipal de Fortaleza. Elas são, em maioria, medalhas conferidas a pessoas que os vereadores julgam ter prestado relevantes serviços à sociedade fortalezense, mas, sem um controle regimental, a criação de tais instrumentos acaba sendo banalizada no Legislativo. Além de comendas criadas recentemente para homenagear diversas categorias de interesse de vereadores e de homenagens propostas a figuras repetidas, outras ainda estão na fila da Casa para serem instituídas.

De todas as medalhas concedidas nesta legislatura, a Boticário Ferreira, comenda do Legislativo de Fortaleza, foi a que teve maior número de agraciados: 94 até então. Os homenageados, em maioria, são políticos ou gestores com atuação na Capital.

Os vereadores Mairton Félix (PDT) e Márcio Cruz (PSD), por exemplo, tentaram homenagear o presidente executivo do Sindiônibus, Dimas Barreira, em duas ocasiões distintas. No entanto, o gestor já havia recebido, em 2017, a honraria, concedida pelo então vereador Salmito Filho (PDT). O pedetista também recebeu a premiação posteriormente.

Já Idalmir Feitosa (PL) quis homenagear o vice-prefeito de Fortaleza, Moroni Torgan (DEM), mas a proposta estava vencida. O democrata já havia sido agraciado, em 2004, por meio de um requerimento de autoria do então parlamentar Machadinho Neto.

Professor Elói (PDT), por sua vez, tentou homenagear o treinador do Fortaleza Esporte Clube, Rogério Ceni, com a Medalha do Mérito Desportivo Ayrton Senna. Mas já havia um requerimento do ex-vereador Acrísio Sena (PT) aprovado na Câmara, e a proposta de Elói foi vencida. Ceni, aliás, nunca foi receber qualquer honraria concedida pela Casa Legislativa Municipal.

Além das comendas já existentes, outras foram sugeridas pelos vereadores na atual legislatura, como a "Medalha Capistrano de Abreu", destinada a homenagear historiadores e memorialistas que desenvolvem atividades na Cidade. A proposta, de Evaldo Lima (PCdoB), aguarda designação de relator.

Recentemente, o Legislativo aprovou a criação da "Medalha Protetora Diol", que homenageia pessoas com trabalhos relevantes em defesa da causa animal. A proposta foi apresentada pelo líder do Governo, Ésio Feitosa (PDT), neste ano, e aprovada já em junho. Outro projeto de mesmo teor, de autoria de Márcio Martins (Pros), tramita na Câmara desde abril de 2017.

Outras propostas

Ésio Feitosa quer ainda criar a "Medalha Radialista Paulino Rocha". Priscila Costa (PRTB), por sua vez, sugere a criação da "Medalha Professora Heley de Abreu do Mérito Educacional Fortalezense". O então vereador Edmar Freitas, em 2018, propôs a "Medalha Dona Lúcia Dummar" para homenagear mulheres, mas a matéria deve ser arquivada.

Já Evaldo Costa (PRB) é autor de projeto que cria a "Medalha Miguel Dias de Souza" do mérito empresarial. Antes de deixar a Câmara, o atual deputado estadual Soldado Noélio (Pros) também instituiu a "Medalha do Mérito da Segurança Pública".

Para justificar a proposta, ele ressaltou que outras comendas já existiam na Casa, como a "Adolfo Herbster", para as áreas de Engenharia e Arquitetura, a "Medalha Lauro Maia", da área musical, além das comendas "José Raimundo Costa", "Antônio Girão Barroso" e "Antônio Drummond", direcionadas à área de comunicação.

Em fevereiro do ano passado, Iraguassú Filho (PDT) apresentou projeto que instituiu a "Medalha do Mérito Humanitário Zumbi dos Palmares", para homenagear pessoas que tenham prestado serviços relevantes no combate ao racismo e promoção da igualdade racial na cidade.

Categorias

Michel Lins (PPS), por sua vez, criou a "Medalha Dona Mocinha", entregue a pessoas físicas e jurídicas que se destacam "no incentivo, produção e execução de eventos e artistas ligados ao samba". Dr. Eron (PP) é o propositor da "Medalha Francisco Waldo Pessoal de Almeida", destinada a homenagear três médicos oftalmologistas e três pessoas não médicas, com destaque no cenário da atenção ou da assistência médica e social, ligados à oftalmologia. Dr. Eron é oftalmologista.

Jorge Pinheiro (DC) quer instituir a "Medalha Martins Soares Moreno", segundo ele, para homenagear, a cada ano, uma única pessoa de destaque na Segurança Pública. A proposta é semelhante àquela de autoria de Soldado Noélio. Já Dr. Porto (PRTB), que é cirurgião-dentista, conseguiu aprovar projeto de resolução que instituiu a "Medalha do Mérito Odontológico Dr. Francisco Sá Roriz" para agraciar profissionais "que tenham relevantes serviços prestados na área odontológica".

Decano na Câmara, o vereador Carlos Mesquita (Pros) também quer criar a "Medalha do Mérito Industrial", em tramitação no Legislativo desde 2017. Além da criação de honrarias, alguns parlamentares buscam alterar a forma como determinadas medalhas são entregues no Parlamento Municipal. Jorge Pinheiro, por exemplo, quer alterar resolução de 1998 que instituiu a "Medalha Paulo Freire".

Em 2017, ainda presidente da comissão de Educação da Casa, Pinheiro disse que cabia ao colegiado a escolha do homenageado sem a necessidade de estipulação de prazo, "pois essa comissão já se reúne periodicamente". Há também casos de arrependimentos. No mesmo ano, o vereador Evaldo Costa solicitou na Câmara a criação da "Medalha Patriolino Ribeiro de Comunicação". Em 2018, entretanto, pediu a retirada em definitivo do projeto de resolução sem justificar motivações.

Títulos de cidadão além do limite

Ao menos 74 personalidades receberam, nos últimos dois anos, o título de cidadão de Fortaleza, mas tem se repetido, na atual legislatura, o descumprimento do limite regimental à concessão da comenda na Câmara. 

De acordo com o Regimento Interno, para a concessão da honraria, será observado o limite de dois para cada vereador por legislatura. Ou seja, em quatro anos, um vereador poderá conceder apenas dois títulos de cidadão fortalezense. 

Na prática, porém, isso não é levado tão à risca. Há casos de parlamentares que apresentaram mais de duas concessões de título de cidadania, alguns deles, inclusive, conseguindo aprová-los durante o mesmo mandato. 

O presidente do Legislativo, Antônio Henrique (PDT), somente neste ano, aprovou três títulos de cidadão de Fortaleza, um para Sabino Henrique Elpídio de Carvalho, outro para José Nilo Costa Maia e um terceiro para Maria Auxiliadora Cavalcante de Carvalho. 

O deputado Salmito Filho (PDT), antes de deixar a presidência da Câmara, resolveu conceder quatro títulos de cidadania fortalezense. Um para o diretor do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), Victor Rico, outro para Manoel Cardoso Linhares, presidente da Abih, um terceiro para “Chambinho do Acordeon”, e, por fim, um título para o advogado José Milton Nogueira. 

Líder da oposição, Márcio Martins (Pros) conseguiu aprovar, nesta legislatura, títulos de cidadania ao deputado federal Capitão Wagner (Pros), ao cantor Ito Melodia e a José Cláudio Correia Primo. 

O líder do Governo, Ésio Feitosa (PDT), também ultrapassou a cota. Aprovou três títulos e ainda subscreveu o que concede titularidade a Francisco Leite Frota. 

Já Dr. Porto (PRTB) está indo para o quarto projeto de concessão da honraria. Além desses, subscreveu as comendas outorgadas para Michelle Bolsonaro e para Francisco Leite Frota.