O Congresso Nacional derrubou 18 vetos parciais do presidente da República, Jair Bolsonaro, à Lei de Abuso de Autoridade. Outros 15 vetos foram mantidos pelos parlamentares.
Com a derrubada, foram retirados 15 crimes dos listados na Lei. Entre eles, a não-concessão pelo juiz de liberdade provisória, a manifestação pública de procuradores da República sobre processo em curso e violações a prerrogativas de advogados.
Além desses crimes, os parlamentares restauraram uma mudança que a lei promove no Estatuto da Advocacia (Lei 8.906, de 1994). O texto ganha artigo estipulando pena de três meses a um ano de prisão para a violação das seguintes prerrogativas dos advogados: inviolabilidade do local de trabalho; inviolabilidade de comunicações relativas à profissão; comunicação pessoal e reservada com clientes; presença de representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em caso de prisão em flagrante por motivo ligado à profissão; e prisão em sala de Estado-Maior ou em domicílio antes de sentença transitada em julgado.
A lei ressalta que só ficará caracterizado o abuso quando o ato tiver, comprovadamente, a intenção de beneficiar a si próprio ou prejudicar outro. A mera divergência interpretativa de fatos e normas legais (a chamada hermenêutica) não configura, por si só, conduta criminosa.
A decisão do Senado representou uma derrota para o governo e, em especial, ao ministro da Justiça e Segurança, Sergio Moro. A derrubada dos vetos teve aval do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que, assim como outros senadores, ficou bastante irritado com a operação da Polícia Federal, na semana passada, que teve como alvo o líder do governo na Casa, Fernando Bezerra Coelho (MDB).
A operação criou um ambiente favorável à derrubada de vetos do presidente Jair Bolsonaro à lei de abuso de autoridade. Alcolumbre decidiu adiar a votação do primeiro turno da reforma da Previdência para a próxima semana em sinalização ao governo.
Medidas
No começo do mês, Bolsonaro vetou trechos de 19 dos 45 artigos constantes no texto aprovado pelo Congresso. O Senado tem um grupo de 33 parlamentares que querem manter todos os vetos. Um outro grupo queria derrubar 16 votos. Tentou negociar, sem sucesso, ao menos seis deles com o grupo lavajatista de senadores "Muda, Senado". O resultado acabou sendo ainda melhor para eles.
Desde o inicio da noite, o tema dominou os discursos na sessão do Congresso. O próprio Bezerra foi ao microfone. "É estarrecedor o excesso, o abuso de uma decisão monocrática, tomada em completo desacordo com quem está, de fato, na condição de avaliar a necessidade ou não de produção de prova, no caso o Ministério Público Federal, titular da ação, e ainda mais quando exige medida tão invasiva ao direito", disse o líder do governo no Senado durante a sessão do Congresso.
Vetos mantidos
O Congresso decidiu manter, integralmente, quatro vetos do presidente Jair Bolsonaro. Entre os vetos mantidos está o da MP da Liberdade Econômica (MP 881/2019). No total foram cinco itens vetados na Lei da Liberdade Econômica, que contém medidas de desburocratização e simplificação de processos para empresas e empreendedores, além de flexibilizar regras trabalhistas.
Os parlamentares mantiveram vetado o dispositivo que, de acordo com alguns deputados e senadores, poderia permitir a aprovação automática de licenças ambientais.
Na justificativa do veto, o governo alegou que o dispositivo não contemplava de forma global as questões ambientais, limitando-se a regular apenas um tipo de licença específica, o que o tornava inconstitucional. Também continuará vetado o item que flexibilizaria testes de novos produtos ou serviços. O presidente argumentou que a redação, ao deixar de estabelecer exceções para hipóteses de segurança nacional, segurança pública ou sanitária ou saúde pública, colocaria em risco a saúde dos consumidores contra produtos e serviços eventualmente perigosos ou nocivos.
Foi mantido também veto a dispositivo que protegeria o empreendedor de medidas abusivas do poder público no que diz respeito a estudos de impacto ou outras liberações de atividade econômica no direito urbanístico.
O dispositivo mencionava a proteção contra distorções que acabassem criando "um regime de tributação fora do direito tributário". Para o Executivo, a forma como a norma foi escrita não atende à técnica e apresenta falta de precisão e clareza, prejudicando a compreensão.
Continua vetado, ainda, dispositivo que revogaria a possibilidade de dissolução da sociedade empresária por falta de pluralidade de sócios. Para o governo, a alteração geraria insegurança jurídica porque os seus efeitos jurídicos não eram de aplicação exclusiva às sociedades limitadas. Isso, segundo o Executivo, poderia criar transtornos para outras formas de sociedades contratuais reguladas pelo Direito Civil. O último item mantido vetado previa a entrada em vigor de alguns dos dispositivos da nova lei em 90 dias. Com o veto, a Lei da Liberdade Econômica já entrou em vigor.
Nova sessão
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, cancelou a sessão do Congresso Nacional sem analisar os vetos presidenciais à retomada da franquia gratuita de bagagem aérea. A sessão de ontem gerou tumulto após os parlamentares derrubarem os vetos da presidência da República à lei de abuso de autoridade.
O senador chegou a anunciar uma nova sessão para as 16 horas de hoje. Mais tarde, porém, ele disse que vai corrigir o horário para as 18h30. Isso porque o Senado deve realizar a sabatina do subprocurador Augusto Aras, indicado para a Procuradoria-Geral da República, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Reforma fica para a próxima semana
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), decidiu adiar a votação do primeiro turno da reforma da Previdência para a próxima semana.
No horário em que a matéria seria votada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), na manhã de ontem, Alcolumbre marcou uma agenda de caráter corporativista: reuniu líderes partidários e foi ao Supremo Tribunal Federal (STF) conversar com o presidente do Judiciário, Dias Toffoli, para apresentar um recurso à decisão do ministro Luís Roberto Barroso que, na semana passada, determinou busca e apreensão em endereços do líder do Governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).
"Não existe isso de ação corporativa. Existe um Poder, com um recurso legítimo da Mesa Diretora do Senado em relação a uma ação de outro Poder nesta Casa", argumentou o presidente do Senado.
Inicialmente, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) seria votada ontem na CCJ pela manhã e no plenário à noite. Na segunda-feira (23), a presidência do Senado adiou a apreciação em plenário para hoje. Agora, a PEC só deve ser apreciada na CCJ e, em primeiro turno, no plenário, na próxima terça-feira (1º). No Twitter, Alcolumbre disse que não houve adiamento. "O calendário permanece o mesmo, a votação, em segundo turno, da PEC 6/2019 será na primeira quinzena de outubro".
A decisão contrariou a presidente da CCJ, Simone Tebet (MDB-MS).
"Fui voz vencida. Achávamos que conseguiríamos votar a reforma da Previdência até 15h para não prejudicar (a sessão do) Congresso, mas houve uma determinação do presidente da Casa junto com os líderes e nós temos que acatar", afirmou Tebet.
15 crimes de abuso restaurados
- Não se identificar como policial durante uma captura;
- Não se identificar como policial durante um interrogatório;
- Impedir encontro do preso com seu advogado;
- Impedir que preso, réu ou investigado sente-se e consulte seu advogado antes e durante audiência;
- Negar ao investigado acesso a documentos relativos a etapas vencidas da investigação;
- Atribuir culpa publicamente antes de formalizar acusação;
- Decretar prisão fora das hipóteses legais;
- Não relaxar prisão ilegal;
- Não substituir prisão preventiva por outra medida cautelar, quando couber;
- Não conceder liberdade provisória, quando couber;
- Não deferir habeas corpus cabível;
- Constranger o preso a produzir prova contra si ou contra outros;
- Insistir no interrogatório de quem optou por se manter calado;
- Insistir no interrogatório de quem exigiu a presença de advogado enquanto não houver advogado presente;
- Iniciar investigação contra pessoa sabidamente inocente.