Diante de uma multiplicidade de profissões, de diferentes caminhos que podem ser trilhados numa vida, saber, jovem, com o que se quer e com o que não se quer trabalhar é até privilégio. Sabrina Rocha Aquino, 25, é exemplo disso. Desde cedo, ela tinha certeza absoluta sobre três coisas: não queria ser da Saúde e não queria seguir os passos da mãe na Contabilidade. Queria estudar cálculos e processos. Era o que mais gostava, não tinha jeito.
Ela lembra que a mãe dizia para ela estudar Contabilidade, porque, assim, poderiam trabalhar juntas. “E eu dizia que não dava, que preferia ficar nos meus cálculos, estudar meus procedimentos”, narrou. Foi assim que bateu o martelo e decidiu ir para a Engenharia.
Esta reportagem compõe uma série multimídia que apresenta as engenharias relacionadas à produção do aço, tendo como personagens funcionários do Grupo ArcelorMittal, no Complexo Industrial e Portuário do Pecém. Os conteúdos visam contribuir para a formação de profissionais qualificados, que poderão ocupar espaços na siderurgia cearense. O projeto “Engenharias que Transformam” é parceria da ArcelorMittal com o Sistema Verdes Mares.
Mas, exatamente, qual Engenharia? Existe, no mínimo, 30 modalidades registradas da área no Brasil. Civil, mecânica, metalúrgica, química, elétrica, de produção, de alimentos, ambiental, hídrica... Como saber com qual dessas se tem mais afinidade? Como escolher?
Embora o pai e os tios fossem proprietários de uma metalúrgica, Sabrina não quis engrenar nessa área especificamente porque ainda não era o que abrilhantava seus olhos. À época que prestou o vestibular, em 2014, cogitou cursar Engenharia Civil por causa do “boom” de oportunidades no setor com as construções para a Copa do Mundo no Brasil.
Mas, foi vendo o exemplo dos primos formados, conversando com o pai e com profissionais da área e assistindo vídeos no YouTube, que Sabrina decidiu que queria mesmo a Mecânica.
Ela lembra de ter se sentido pressionada naquele ano porque só a Universidade Federal do Ceará (UFC) e a Universidade de Fortaleza (Unifor) ofereciam o curso. Contudo, depois de um período fazendo cursinho, ela, enfim, passou na Unifor e conseguiu estudar o que queria.
De pronto, ela adorou mergulhar nos cálculos e nos processos. No entanto, achou o primeiro ano da graduação muito “generalista” e conta que só se encontrou no curso quando descobriu as especificidades dele. “O sonho do meu pai era que eu fosse para a área de projetos, porque, segundo ele, ganhava muito bem. Mas, eu nunca gostei. Gostei de termodinâmica, da parte de transferência de calor, da química. Da Mecânica que tem Química”, recordou ela.
Com pouco tempo de curso, Sabrina entrou para a Mecaniza Jr., uma das empresas juniores da Unifor. Depois, ela conseguiu um estágio numa empresa de geração de energia eólica e lá ficou até 2022, quando se formou e decidiu concorrer a uma vaga de trainee na antiga Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP), atual ArcelorMittal.
A turma dela, que incluía um engenheiro eletricista e outro mecânico, ficou num setor de geração de energia, que trabalhava com a manutenção de máquinas da siderúrgica. “A gente desmonta a máquina e faz a [vistoria] preventiva nela. É uma manutenção pedida pelo fabricante. A cada dois anos a gente faz uma pequena e, a cada quatro, uma maior. É aprendizado por cima de aprendizado, dificuldade por cima de dificuldade, um desafio”, diz.
Descobrindo preferências e aptidões
Tanto para escolher qual engenharia cursar como para decidir em qual área, dentro da Engenharia Mecânica, queria se desenvolver, Sabrina contou com pesquisas e conversas com familiares e profissionais da área. No entanto, foram os estágios e a experiência pessoal e profissional na indústria que a levaram pelos caminhos que ela descobriu que deseja trilhar.
“Quero me desenvolver em gestão. Almejo um cargo de gestão. A técnica eu quero aprender porque, para eu ser uma boa gestora, preciso entender o meu processo, não posso ser leiga. Mas, gosto muito de trabalhar com pessoas. E é uma coisa que me espanta porque, quando eu era mais nova, no ensino médio, eu brincava dizendo que queria ir para a Mecânica porque eu queria trabalhar com máquina, não com pessoas. Mas, aqui na ArcelorMittal, a gente trabalha com pessoas. Afinal, são as pessoas que cuidam das máquinas”, resume a engenheira.
Formações complementares e treinamentos
Sabrina entrou para o Grupo ArcelorMittal como trainee há um ano e foi efetivada em setembro do ano passado, para trabalhar com manutenção de energia e utilidades.
Em pouco tempo de empresa, ela já participou de duas paradas para manutenção de máquinas. Nesses serviços, ela detalha, o mais importante é garantir que nenhum acidente aconteça com os trabalhadores e que os equipamentos voltem para a linha de produção do aço melhores do que estavam quando saíram para a revisão preventiva.
No entanto, o conhecimento necessário para fazer esse trabalho não foi aprendido apenas na graduação de Engenharia Mecânica. Para conseguir atuar na siderurgia, Sabrina precisou complementar a formação com uma pós-graduação em Gestão de Projetos e Processos. “Consigo, agora, aplicar algumas coisas e me situar mais”, garante.
Dentro da ArcelorMittal, a engenheira também tem acesso a treinamentos específicos para a área, além de outros cursos de idiomas. Mas, ela quer se aprofundar mesmo em gestão.
“Estão na minha lista de afazeres treinamentos na parte de gestão. Além disso, sou muito observadora. Gosto de ver como as pessoas tratam umas às outras. Vou criando meu perfil vendo as pessoas, o jeito que reagem. Porque, para receber respeito, a gente tem que respeitar”, entende.
Para a engenheira, não falta trabalho, atualmente, na área das Engenharias, mas é preciso estar qualificado para conseguir entrar no mercado e alcançar um bom cargo. “O bom da Engenharia é que ela não é uma coisa específica. Eu posso trabalhar em gestão de escritório, indústria, com manutenção de equipamento de hospital. [...] Acho que a gente tem que tentar entender o que gosta e o que não gosta, para conseguir filtrar e trilhar um caminho”, observa.
Para engenheiros recém-formados que querem ingressar na indústria por programas de trainee, como ela, Sabrina aconselha “pensar fora da caixinha” e se esforçar. “De certa forma, [a exigência por qualificação] nos leva a melhorar, a não parar [de estudar]”, ela diz.
‘Crescendo e tomando espaço’
Mesmo que quase toda a sua família trabalhasse com metalurgia, quando Sabrina decidiu cursar a Mecânica, teve de ouvir da mãe que “Engenharia é curso para homem”.
“Ela não estava errada, mas, ao longo do tempo... Não é que hoje esteja às mil maravilhas, mas, ao longo do tempo, as coisas foram melhorando. A gente vai crescendo e tomando espaço, mostrando que tem capacidade de participar das mesmas coisas que os homens”, diz.
Com a aquisição da CSP pelo Grupo ArcelorMittal, aumentou a quantidade de mulheres na empresa, inclusive, em cargos de liderança. “Foi uma mudança radical. Conversava com as meninas no corredor que a nossa gerente geral era, agora, uma mulher, e isso nos dava mais força. Era uma pessoa que a gente olhava e se espelhava, porque, se ela conseguiu chegar ali, eu também vou conseguir, mas ainda vai ter que ter luta. A gente ainda vai ter que estudar muito mais”, analisa.
Há pessoas, homens, principalmente, no entorno de Sabrina, que ainda acreditam que as Engenharias e a indústria não são espaços que mulheres devem ocupar. Contudo, ela reforça que essa realidade muda à medida que mais engenheiras se formam e entram no mercado. “O ser humano é fruto do meio. Você vai se alinhando às coisas que te mostram”.
O que faz um engenheiro mecânico?
Profissionais da Engenharia Mecânica fazem, segundo a Universidade Federal do Ceará (UFC), bem mais do que trabalhar com sistema de veículos automotores, turbinas, eletrodomésticos, brinquedos e outras máquinas.
- Criação e aprimoramento de equipamentos e métodos de transmissão de energia;
- Aperfeiçoamento e supervisão de processos produtivos;
- Cálculo de quantidades de matéria-prima a serem utilizadas em processos;
- Elaboração de protótipos;
- Controle de qualidade;
- Segurança de instalações;
- Desenvolvimento de sistemas de automação;
- Manutenção de equipamentos;
- Planejamento de sistemas de aquecimento e refrigeração;
- Projeção de peças e engrenagens;
- Vendas e suporte.
Geralmente, essas pessoas trabalham em setores de autopeças, metalúrgico, siderúrgico, aeronáutico, naval, aeroespacial, alimentício, de celulose, de papel, usinas de açúcar e álcool e agroindústria. Também estão presentes no setor automobilístico e em petroquímicas.