Do alto de sua posição de secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), o português António Guterres lançou uma advertência ao mundo ao dizer, nesta semana, em discurso na Universidade de Columbia, em Nova Iorque, que “fazer as pazes com a natureza é a tarefa definidora do Século 21, devendo ser a prioridade máxima para todos, em todos os lugares”. O alerta dele vem no exato momento em que a pandemia da Covid-19 chega a uma segunda onda na Europa, nos Estados Unidos e, também, na América Latina.
O planeta está a enfrentar dupla guerra – uma de natureza ambiental, que, se não for estancada, ameaçará a própria sobrevivência humana, outra, de caráter sanitário, que alarga suas trágicas estatísticas, as quais, paradoxalmente, são maiores nos países ricos e desenvolvidos, mas, igualmente, nos em desenvolvimento, como Argentina e Brasil.
Agredida nos últimos 200 anos pela irresponsável e crescente ação antrópica, a natureza reage e revida. O aumento da temperatura, os furacões, os tsunamis, as secas e as enchentes que castigam diferentes regiões do planeta dão a dimensão da guerra em que se transformou a relação do homem com o meio ambiente. Os oceanos revelam a que ponto de degradação está chegando a vida na terra: eles se transformaram, e muito rapidamente, em um depósito de plástico que começa a reduzir a população das espécies marinhas. Como grande parte dos alimentos que abastecem a população mundial tem origem nos mares, a ONU, pela voz do seu hierarca, pede que os governos dos seus quase 200 países-membros adotem políticas que, no curto prazo, preservem a vida marinha e salvem os grandes recifes de coral, igualmente ameaçados pela antropia.
Preocupa a ONU não só o aquecimento global, causado, entre outras coisas, pela destruição das florestas e pelo uso excessivo de combustíveis fósseis, mas também as posições políticas de governos que se recusam a trabalhar pelos objetivos do Acordo de Paris, um tratado celebrado em dezembro de 2015 com o exclusivo objetivo de reduzir a emissão de gases estufa, responsáveis, segundo a ciência, por esse aquecimento. Os EUA, sob a gestão do presidente Trump, e o Brasil, liderado pelo presidente Bolsonaro, tomaram posições semelhantes contra o Acordo de Paris. A recente eleição do democrata Joe Biden, porém, recolocará a Casa Branca no seu lugar de destaque, a favor do Acordo de Paris e das medidas necessárias para que suas metas sejam alcançadas.
Espera-se que o Brasil siga o mesmo caminho, realinhando-se a favor daquele tratado e readequando-se às políticas internacionais pró meio ambiente.
A China, maior emissor de gases de efeito estufa, e toda a União Europeia já se comprometeram a caminhar na mesma direção, de que é exemplo o seu plano de substituir o carvão e o petróleo pelas energias renováveis. Os chineses estão a substituir toda a sua frota de ônibus a óleo diesel de suas cidades por veículos elétricos, e este é o modelo que já seguem os europeus da Alemanha e do Reino Unido. A contundente advertência do secretário-geral da ONU, uma personalidade reconhecidamente discreta e apaziguadora, é, pois, neste momento, uma oportuna mensagem de chamamento à responsabilidade dos que têm a responsabilidade de dirigir o mundo.