As eleições municipais de 2020 desenharam um cenário de ausência de parte dos eleitores nas urnas. Todo o contexto eleitoral foi atípico, vale ressaltar: datas adiadas, menor tempo de campanha e controle da presença dos candidatos nas ruas para evitar aglomerações, diante do risco de agravamento da pandemia da Covid-19. O eleitor ausente, em um País cujo voto é obrigatório, é uma tendência que já vinha sendo observada em pleitos anteriores, como reflexo de desgastes políticos e do sentimento de falta de representatividade.
Em todo o Brasil, a abstenção dos eleitores foi de 29,50%, equivalente a 11,1 milhões de pessoas. Nas eleições de 2018, 2016 e 2014, o índice de eleitores faltosos ficou em torno de 21%.
Em Fortaleza, mais de 1,8 milhão de eleitores estavam aptos a votar em 2020. No segundo turno, mais de 414 mil escolheram não ir às urnas. Na comparação com o primeiro turno, foram mais de 17 mil eleitores faltosos de diferença entre os dois dias de votação desta eleição. O crescimento também é nítido quando se estabelece relação com 2016. Se compararmos apenas o segundo turno, a abstenção em Fortaleza cresceu de 18,6% (2016) para 22,7% (2020).
Por um lado, aqueles que saíram de casa para ir às urnas e votaram nulo ou branco reduziram na Capital. No primeiro turno destas eleições, esse grupo representou 142 mil votos. Já no segundo turno, 112 mil eleitores votaram branco ou nulo.
Considerando o cenário de pandemia, que já consumiu mais de 175 mil vidas, a participação de 70,50% dos eleitores merece ser celebrada, como pontuou o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, ao anunciar balanço do pleito de 2020.
Ainda assim, o crescimento da abstenção incide sobre a expressão do chamado “não voto”, nome dado à massa de eleitores que deixou de votar - com ou sem justificativa - ou não endossou nenhuma das candidaturas nas urnas.
É preciso pontuar a influência do sentimento de falta de representatividade na política e o desgaste da relação entre eleitores e candidatos. No cenário de 2020, deve-se levar em conta também que a pandemia pode ter feito com que pessoas que votariam branco ou nulo não saíssem de casa. Além disso, pela primeira vez, a Justiça Eleitoral permitiu que o eleitor justificasse a abstenção por meio de um aplicativo, o e-Título.
Em todo caso, cabe à classe política fazer uma releitura do que tem acontecido no País nas últimas eleições. As abstenções e os votos nulos e brancos podem ser indícios de que algo precisa ser revisto. Democracia é sobre pactuar o que os cidadãos devem ou não devem fazer. O Brasil tem um pacto pela obrigatoriedade do voto, definido pela Constituição de 1988.
Sempre é possível discutir essa obrigatoriedade de escolher um representante político. É um aspecto importante e que deve ser cuidadosamente debatido. Num sistema facultativo, acredita-se que apenas os eleitores “interessados” comparecerão. Porém, antes de tratar sobre a obrigatoriedade do eleitor de ir às urnas, há ainda um necessário caminho a se percorrer até a fórmula para estimular o interesse pela política e a conscientização da importância da participação nas disputas eleitorais.