Os recados do palanque de Camilo, Cid, Elmano e Izolda a favor de Lula no Ceará

Entre figuras que não dividiam o mesmo espaço publicamente e as ausências, a fotografia do ato mostra a correlação de forças na política cearense

Desde muito tempo não se via no mesmo palanque o senador Cid Gomes (PDT), a deputada federal Luizianne Lins (PT) e o deputado federal eleito Eunício Oliveira (MDB). 

A fotografia mais recente dessa união é lembrada de 2010 – ainda na disputa em que o Ceará estava unido para reeleger Cid governador e eleger Eunício e Pimentel para o Senado. 

De lá para cá, os rompimentos foram afastando essas figuras que marcharam em campos paralelos em eleições municipais e estaduais.  

Em meio a um conjunto de episódios inesperados nas eleições cearenses deste ano, essa reconfiguração do palanque governista é apenas um dos diversos recados do pós-eleição. 

Vamos aos fatos que marcaram a campanha e os impactos para o rearranjo político.

O fator Cid na campanha de Roberto Cláudio 

Cid Gomes, visto como o maior articulador político do Ceará, ficou de fora da campanha de Roberto Cláudio (PDT) para o Governo do Estado. O fato foi determinante para o resultado das urnas neste ano. Explico. 

Por meses, o PDT ficou na indecisão se lançaria a governadora Izolda Cela à reeleição ou se apostaria no ex-prefeito de Fortaleza para concorrer contra Capitão Wagner (União) a cadeira de governador. 

Publicamente, Cid defendia a união no partido. Nos bastidores o que se dizia era que o senador recomendava o nome da governadora à reeleição. Diante da indefinição, um racha foi instalado entre lideranças pedetistas. 

Ciro Gomes acabou entrando e defendendo o nome de Roberto Cláudio – o que afastou Cid das tratativas com dirigentes e prefeitos. O senador comunicou aos aliados que não participaria dos atos de campanha do PDT nem do PT de Camilo Santana. 

O resultado todos nós já conhecemos. O que pontuo é que esse foi um dos episódios cruciais da pré-campanha que explicam a reconfiguração política que percebemos dias depois do primeiro turno da eleição no Ceará.

De que lado está 

Abertas das urnas, Elmano de Freitas foi eleito governador em primeiro turno. Logo se organizou uma agenda com aliados pela campanha de segundo turno em torno de Lula no Estado. 

No primeiro ato público, Cid Gomes se faz presente ao lado da governadora Izolda Cela (sem partido) – deixando claro a postura de aliança que sempre alimentou com a governadora. Diferentemente de Ciro Gomes, que acusava os aliados de traição. 

Dias depois do primeiro turno, parece que tudo vai fazendo sentido. Publicamente, Cid sobe em um palanque com os principais adversários de Roberto Cláudio na eleição para governador. 

"Eu vou deixar de fazer os introdutórios para ir diretamente ao que interessa: sem medo de ser feliz", disse o pedetista em fala direcionada à militância do PT durante o evento de segunda-feira (10). 

Izolda, derrotada na votação interna do PDT que decidiu a indicação, se desfiliou do partido e anunciou apoio a Elmano de Freitas na última semana de campanha eleitoral no primeiro turno. 

À vontade com Camilo, Elmano e Izolda, Cid dá sinais de que está confortável com o resultado das urnas, que deu a vitória a Elmano de Freitas – personagem que marcou o rompimento entre PT e PDT em Fortaleza, na eleição municipal de 2012. 

“Sumiço” 

Para deixar o cenário ainda mais claro para o leitor da coluna, o que se sabe nos bastidores é que Cid Gomes atuou a favor da campanha de Elmano de Freitas para a disputa de governador – principalmente em conversas com prefeitos.

Esse "sumiço" de Cid durante o primeiro turno, na realidade, não foi tão inoperante assim. A atuação do senador estava alinhada com a do ex-governador Camilo. 

Tanto é verdade que Cid pediu votos para Camilo em plena disputa para o Senado, quando o PDT tinha a candidata Erika Amorim (PSD) na chapa de Roberto Cláudio. 

Na possibilidade de dois turnos, Cid se preservava publicamente para distensionar as relações que se desgastavam na medida que se aproximava o dia 2 de outubro. 

Poucos dias depois do fim do primeiro turno, é Cid quem aparece em um palanque acenando com um "sem medo de ser feliz" para um palco repleto de petistas. 

"Eu estou aqui por um terceiro motivo: o meu querido amigo Camilo me pediu que eu ajudasse na mobilização de amigos do PDT para esse segundo turno. Governador Camilo, cada um dos que você me pediu foram falados ao longo do final de semana pessoalmente", disse Cid declarando sua lealdade ao petista. 

Rompimento? 

A rápida aparição pública de Cid com o PT de Camilo Santana logo depois de um primeiro turno duro em âmbito estadual deixa cada vez mais claro que não houve rompimento entre o ex-governador e parte da família Ferreira Gomes – já que Ivo Gomes (PDT), prefeito de Sobral, manteve os passos do irmão senador. 

O distanciamento político se deu com grupos minoritários do PDT – encabeçados por Ciro Gomes, Roberto Cláudio e André Figueiredo. Todos, inclusive, ausentes no palanque pró-Lula, realizado na segunda-feira, dia 10, em Fortaleza, apesar da posição nacional da sigla. 

A presença de Cid junto a aliados de Camilo mostra, mais uma vez, que o grupo que seguirá no plano estadual continua o mesmo. A gestão Elmano, no entanto, deverá ter o seu protagonismo e indicar novos rumos. Por enquanto, porém, nada mudou. 

O papel de Luizianne e Eunício 

As aparições de Eunício Oliveira e Luizianne Lins ao lado de Cid Gomes é um dos fatores que mais chamam atenção entre os recados que o palanque oferece ao leitor. 

Ambos romperam com a família Ferreira Gomes, mas em momentos distintos. Luizianne deixou de ser aliada de Cid em 2012, e Eunício rompeu em 2014. Luizianne e Eunício nunca se deram mal, pelo contrário. Ambos sempre conversam nos bastidores e fazem acenos públicos. A novidade é compartilharem do mesmo evento que Cid. 

A ex-prefeita de Fortaleza, inclusive, sai fortalecida da disputa eleitoral. O principal aliado, Elmano de Freitas, agora é governador do Estado. Com recorde de votação para a renovação do mandato na Câmara dos Deputados, Luizianne se mantém fortalecida no campo eleitoral, seja para 2024 ou 2026. 

Eunício, por outro lado, que volta com um mandato em Brasília, pode ser um aliado de primeira ordem do novo governador. O emedebista foi o principal interlocutor de Camilo enquanto presidente do Senado. Aprovou projetos e encaminhou recurso. 

A não reeleição de Eunício trouxe prejuízos à interlocução do Estado em Brasília. A falta de um personagem que conhece os bastidores do Congresso para o governador pode trazer dificuldades para a gestão. O ex-senador chega para ser uma figura interessante para o Palácio da Abolição. 

As ausências 

Candidato derrotado para o Governo do Estado, Roberto Cláudio não esteve presente no evento. Em entrevista coletiva, o senador Cid Gomes ainda alfinetou o correligionário sobre a disputa estadual. 

"Me perdoe a falta de modéstia, mas eu tinha visto o filme antes. Eu, há seis meses atrás, achava que ia acontecer o que aconteceu", sentenciou. 

Em terceiro lugar na eleição para o Executivo estadual, Roberto Cláudio não entrou na campanha de segundo turno presidencial. Ele segue o rumo de Ciro Gomes que, apesar de seguir o partido, ainda não pediu votos para Lula. 

Assim como Roberto Cláudio e Ciro Gomes, quem também se ausentou do palanque estadual pró-Lula foi o presidente do PDT no Ceará, o deputado federal reeleito André Figueiredo. 

André, no entanto, chegou a se reunir com o prefeito José Sarto (PDT) e vereadores de Fortaleza para fortalecer a campanha do ex-presidente Lula no Ceará. 

Feridas abertas 

As ausências dessa ala do PDT no palanque de Cid e Camilo mostram que as feridas ainda estão abertas – e que nada será pacificado tão facilmente. 

A naturalidade com que Cid subiu no palanque – por razões óbvias – não é a mesma com que Roberto Cláudio ou Ciro subiria depois de uma disputa tão dura no primeiro turno e do corpo mole do senador na campanha do PDT para o Executivo no Ceará. 

A fotografia deixa tudo muito claro: a preço de hoje, Cid e Camilo continuam dando o tom do governismo cearense. Elmano, como governador, vai ganhar naturalmente o seu espaço. 

A oposição derrotada vai buscar se reconstruir para os próximos anos. O mesmo vale para a ala do PDT que embarcou com Roberto Cláudio.