Se fosse possível aplicar um questionário a um número considerável de pessoas perguntando o que é um dia feliz, entenderíamos melhor a vida. Um sábio me disse que viver de forma adequada implica em compreender cada dia como um tempo valioso e insubstituível. Diariamente, o mesmo exercício, até aprendermos a tratar o calendário como deve ser: um colar de pérolas que devemos polir.
É difícil conseguir. A maioria dos dias moram no campo do ordinário, são tomados por rotinas e obrigações. Não costuma ser fácil enxergar mágica ou achar especial um amontado de horas roubadas pelos deveres a cumprir, pelas exaustivas jornadas, pelo cansaço. Estamos todos exaustos. Dessa exaustão estamos sendo levados a zerar o jogo e entender, mais uma vez, de qual felicidade precisamos.
Diante da morte, de tantas mortes, estar vivo ganha uma outra dimensão. Tem dias em que a alegria da alma está justamente no tempo de descanso, na chance de retomar as forças entre as tarefas do cotidiano. Sem encantamento. Isso me lembra uma frase do historiador Antonio Simas: o contrário da vida não é a morte, é o desencanto. Vivermos encantados com qualquer coisa é um antídoto contra todos os dias de morte.
Perguntando a mim mesma o que é um dia feliz, eu posso responder que é qualquer um como o de hoje, um tempo favorável à tranquilidade. É estar entre pessoas que se gostam, que ficam juntas por usufruir da companhia um do outro. É poder ser quem se é, longe do medo do desamor e da inadequação.
Eu também poderia dizer que os dias felizes são aqueles em que o destino interfere fortemente, muda o curso, altera a rota e coloca na vida um elemento que vai mudar tudo. Dos eventos raros e grandiosos que nem o melhor adivinho poderia prever.
Guimaraes Rosa escreveu algo contundente sobre estes encontros modificadores da vida: “Os outros eu conheci por precioso acaso. A ti vim encontrar porque era preciso”. Um dia feliz é também aquele em que o destino assume o comando. É o dia de hoje, dizendo que é preciso ter calma para que os encantos tomem seus lugares.
Um dia novo, um mês que começa, é sempre tempo de reabrir os olhos para o que é, de fato, a sensação da felicidade. Cercados de mortes como estamos, é obrigação dos vivos valorizar a luz, lembrar que a felicidade é simples, ela chega para quem a reconhece. A esperança é uma força que nasce com o sol.