As variantes da tragédia brasileira

No início da pandemia, em março do ano passado, não tínhamos informações, não tínhamos condições de prever o que iria ocorrer em nossas vidas, nem quais seriam os impactos causados pela Covid-19.

Não nos restou outra opção que não encarar o furação; enfrentar nossos medos, anseios, inseguranças e aguardar o que a ciência nos reservaria.

Parte dos pobres, trabalhadores e moradores das periferias e favelas brasileiras foram para o front mortal e imprevisível. Foram lutar pelo pão, pela vida, pelo pagamento dos boletos de cada dia.

Gente que não recebia álcool em gel, nem sequer tinha água e sabão para se higienizar como recomendam os protocolos. Gente que sempre foi essencial nas tarefas operacionais e que, como única alternativa, se aglomeraram nos ônibus e metrôs lotados para não perderem o emprego.

Gente que deu e segue dando a vida para os outros ficarem bem e seguros. São os sacrificáveis que o Brasil produz diariamente. E por que não dizer "os descartáveis"?!.

Quando iniciamos a campanha “Mães da Favela", sensibilizamos grande parte dos formadores de opinião, da classe artística, grandes empresas e lideranças empresariais do País, o que foi definitivo para evitar uma convulsão social.

Em meio a essa ação humanitária emergencial, vimos a coisa se politizar num nível que duelava entre a economia do País e a vida da população em estado de miserabilidade.

Tal dicotomia se espalhava a passos largos e, em paralelo, assistimos ao negacionismo que opunha opiniões, fake news, à ciência e às recomendações de saúde dos órgãos internacionais competentes.

Um ano depois, temos umas das maiores crises econômicas da história brasileira. O número de mortos chega a quase 3 mil por dia. (Como prevíamos,a dicotomia era falsa. A vida foi negligenciada e muitos CNPJs decretaram situação de falência. Poucos reabriram. Já as vidas foram perdidas para sempre).

Tantos homens e mulheres... Quantos nomes e histórias, tantas mães e tantos filhos... Amores, entes queridos, que se foram sem sequer termos direito à despedida.

O impacto da pandemia nos negócios, no emprego e na renda são preocupantes, uma pesquisa recente do site Data Favela aponta que:

  • 75% dos empreendedores, fecharem seus próprios negócios.
  • O medo do desemprego que em agosto de 2020 era 67%, em fevereiro de 2021 chega 76%.
  • 71% dos moradores de favelas estão vivendo com a metade da renda comparado ao mesmo período de 2020 e 93% da população não tem nenhum dinheiro guardado.

Os números são desoladores e os elementos da grande crise se juntam. Com ela, vem um fogo que, há tempo, não queimava em tão grande escala.

O fogo da fome que não queima as elites políticas e econômicas do País.

  • 7 em cada 10 moradores, tiveram sua alimentação afetada, 68% este ano comparado a 43% do ano passado.
  • 7 em cada 10 afirmaram falta de comida nos últimos 15 dias e 9 em cada 10 receberam alguma doação.

Fica claro que informação eficiente, medidas de controle do espalhamento do vírus, máscaras de proteção, auxílio emergencial com valor de 600 reais e aceleração do processo de vacinação não somente salvarão vidas, como serão as únicas forma de salvar a economia e evitar sua parada total, aumentando o caos.

Não vamos esperar corpos espalhados pelas ruas, nem que um País, que já foi lembrado pela riqueza e prosperidade, pela inventividade e potência de seu povo, seja tratado como chacota mundial e sacrifique quem não tem como se proteger dessa tempestade que traz fome, desamparo, desemprego e medo às famílias.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.