Anunciados os candidatos a "Melhor Filme" no Oscar 2024, a busca por conferir cada um deles antes da cerimônia também se inicia. Alguns, por exemplo, sequer haviam sido lançados no circuito nacional, mas já eram fortemente reconhecidos na busca pela estatueta. "Anatomia de Uma Queda", de Justine Triet, foi um deles. Palma de Ouro, Critics' Choice Awards e Globo de Ouro foram algumas das premiações que destacaram o longa, tornando-o forte concorrente.
Ele é o primeiro a ser comentado aqui nesta coluna em uma série de textos para relembrar os destaques deste ano e apontar quais, de fato, possuem chances ao que é considerado maior prêmio da indústria cinematográfica.
Drama denso
O fio condutor de "Anatomia de Uma Queda" acontece sem rodeios, retirando quem assiste do lugar de expectativa. A morte de Samuel (Samuel Theis), esposo de Sandra Voyter (Sandra Hüller) e pai de Daniel (Milo Machado Graner), filho pequeno do casal, é o mote, mas não o que conduz o suspense da história.
Veja o trailer do filme:
É a partir desse evento, do encontro do corpo pelo filho, que se segue o desespero da mulher ao pedir ajuda e até a investigação sobre a possibilidade de um crime ou morte acidental. Nesse meio, o roteiro de Justine Triet leva o espectador a se questionar sobre o relacionamento, o que é verdade e suposição e até mesmo onde está a seriedade do trabalho para descobrir o que, de fato, ocorreu.
Para quem assiste, é possível sentir a tensão cortante em cada um dos personagens diante da partida de Samuel. Apesar disso, não é esse sentimento que permeia o resto, mas sim a presença de Sandra e tudo que a envolve. A mulher, recém-viúva e cuidadora do filho, apresenta um misto de dor, incerteza, mistério e ambiguidade. Seria essa mulher a responsável pela morte ou não? E nessa dúvida o espectador é quase alçado a integrante do júri responsável por determinar este fato.
Performance constante
O tribunal montado para expor o caso e acusar Sandra permeia boa parte do filme e vai além do papel de julgar, o que essencialmente seria o intuito. Por meio dele, podemos acompanhar cada nova descoberta sobre a personagem, podemos vê-la como parte de um relacionamento em colapso, percebê-la após ter a sexualidade exposta e até vê-la incrédula ao presenciar a exposição de uma briga familiar.
Em relação à briga, inclusive, cabe ressaltar o trabalho imponente da direção de Triet. As escolhas feitas por ela para costurar a narrativa funcionam no mesmo nível em que expõem a história e causam a dúvida em cena. No momento em que coloca como oposição os dois personagens julgados, a opção por o que mostrar reforça o caminho não óbvio, aquele que incomoda e, em consequência, faz o filme crescer.
No fim das contas, ainda que se venda como um filme de mistério, "Anatomia de Uma Queda" é mais do que isso. Se propõe a não oferecer nada de concreto além da percepção e opinião de cada um que o vê, fazendo com que a imersão no drama seja o ponto alto e trazendo uma incerteza singela quando os créditos começam a correr pela tela. Sem dúvidas, digno da indicação e de qualquer outro elogio que possa receber.