O Brasil é um país que sabe reverenciar seus ídolos! Essas personalidades são escolhidas por caríssima, talento, resistência ou o compilado desses predicativos. No mundo, musicalmente falando, somos lembrados pelo samba e bossa nova, mas em solo brasileiro a realidade de astro maior é um pouco diferente.
O país coroou o cantor Roberto Carlos como rei e há muitos motivos para se questionar ou reafirmar esse título. O compositor chega aos 80 anos sendo exemplo de jovialidade, sedução, romantismo e simplicidade.
Sendo interpretado pelos mais diversos nomes da música popular brasileira e mais variadas gerações (na lista estão inclusos Maria Bethânia, Alcione, Cauby Peixoto, Ângela Maria, Marisa Monte, Agnaldo Timóteo e muitos outros), Roberto se transformou em um grande fenômeno mercadológico conseguindo ser maior do que a própria música.
O capixaba de Cachoeiro de Itapemirim traça uma das mais brilhantes carreiras musicais deste país. Agora octogenário, desafia o tempo e continua sendo o “bom moço” que sofre por amor e arranca o ar de milhões de fãs, aliás, são elas que o fizeram ser esse sucesso. Quanto ao artista ser considerado o maior de todos, não seria um exagero?
“Querem acabar comigo”
Repleto de superstições e manias, Roberto também é controverso em muitas de suas atitudes. Nesse ano que para o Rei é cabalístico (chegar aos oitenta não deve ser fácil nem para ele), o artista que censurou tantas biografias libera agora o livro “Querem acabar comigo - Da Jovem Guarda ao trono, a trajetória de Roberto Carlos na visão da crítica musical’ assinado pelo autor Tito Guedes que esmiúça em detalhes a longa carreira do “popstar”.
O trabalho que tem o selo da editora carioca Máquina de Livros se debruça na análise de como a crítica olhou para Roberto no transcorrer de sua vida. O que ainda faz mais interessante a narrativa pois mostra quão ela mesclou suas opiniões conforme a popularidade do “Rei” crescia, daí a ideia genial do título.
Sem querer dar ar de retrospectiva, a biografia vai da Jovem Guarda, ainda na metade da década de 1960, até a novela da “A Força do Querer” em 2017, expondo de forma minuciosa a discografia do capixaba desde o primeiro sucesso ao último autoral (a canção Sereia, tema principal dos protagonistas do folhetim).
Afinal, queriam realmente destruí-lo? Talvez, o que se pode ter a certeza é que não conseguiram e, ainda nos anos de 1970, Roberto Carlos se consagrou dentre as preferências nacionais. Nosso Pelé da música !
Mais de seis décadas de sucesso
Há muito de duvidoso no repertório do RC. Na época da Jovem Guarda, quando ainda comandava o programa “Jovens Tardes”, o cantor faria uma transição muito importante da sua carreira. Saíria do pop-rock para o romântico acertando em cheio na escolha. Junto do parceiro Erasmo Carlos, fez músicas antológicas que seguem marcando gerações.
Seria comum falar de letras como “Detalhes”, “Proposta”, “A Distância” e “Eu Te Amo, Eu Te Amo, Eu Te Amo”. Quero falar de outras pérolas esquecidas pelo próprio compositor mas que merecem reverência como tesouros da nossa música popular.
A primeira delas seria “Para ser Minha Mulher", uma das declarações mais leves empolgantes do seu início de carreira, interpretada na época pelo colega Ronnie Von. A música ganhou roupagem do talentoso Otto em 2011 e mostra que o amor é atemporal.
Exemplo dessa eternidade também são as “Sua Estupidez”, “Não se esqueça de mim”, o “Show já terminou”, “Cama e Mesa” e a divertida “Só você não sabe”. Roberto usou e abusou do amor, fez dele sua matéria prima! Sofreu com “Desabafo”, “As Flores do Jardim da Nossa Casa” e “Falando Sério”. Se ergueu cantando Funk, Samba, Rap, Bolero, Tango e até o Despacito. Esse cara é ele !
Um astro e sua responsabilidade
Assim como em muitos lares brasileiros, minha casa sempre foi palco do RC. Meu pai viveu sua juventude na jovem guarda, mas a fã mesmo era Dona Marly, minha ilustre mãe, que não cansava de colocar os CDs do “rei dela” (é como costuma falar) aos sábados para tocar. Foram tantas “propostas”, “botões”, “cafés da manhã” que parecia que eu já conhecia intimamente o compositor..
Aos oito anos, ainda criança, minha mãe me vestiu de azul e branco, me colocando para cantar festinha do colégio “Como é grande o meu amor por você”. Cantei, fui aplaudido, além de garantir boas memórias. Anos depois a música entraria mais intensamente na minha vida, conheceria grandes cantores, pesquisaria incansávelmente o nosso cancioneiro popular, e quanto mais eu aprendia mais questionava essa louvação ao Roberto.
Já adulto viajei com minha mãe em um cruzeiro que girava em torno do idolatrismo do RC. O que a priori me deixou receoso foi uma das maiores aulas da vida.Ao entrar no navio, entendi que “Rei é Rei”. Quase quatro mil e quinhentos fãs enfurecidos aguardando uma aparição do ídolo.
No Cassino, Karaokê, Baile de Carnaval, o cantor aparecia e dava uma palhinha, cada momento desses era mágico, e embarquei nessa (literalmente)!
Desde o ato de jogar a rosa, brindar o champanhe ou falar de amor, Roberto Carlos se mostrava o maior astro brasileiro. Tudo, que obviamente era muito calculado, parecia natural diante da sensibilidade de seu olhar e aquele “que prazer rever vocês” que ouvia anualmente na televisão se tornou realidade.
O coração bateu forte, ainda mais, quando ele sentou quase do meu lado em um show do Tom Cavalcante, ainda no navio. Que presença! Roberto não é somente um cantor, talvez nem ame tanto a música, mas é de grandiosidade imensurável, precisando ser ouvida com atenção para a compreensão .
Superestimado? De forma nenhuma!
Agora lhe respondo, caro leitor, Roberto Carlos sabe viver e merece todas as homenagens, reconhecimentos e tantas outras emoções. É uma vida regrada a ser ídolo e sabe a responsabilidade de ser tal inspiração. É uma renúncia belíssima pelo que lutou para construir, sem perder a sensibilidade comovente.
“Rei é rei” e jamais perderá a majestade, mesmo cometendo erros em seu repertório e conduta. Ele vai muito além do bem e do mal.
Assim como eu narrei há pouco, sua voz faz parte da história de milhões de brasileiros espalhados pelo mundo afora. Quem nunca se declarou com uma de suas músicas?
Roberto Carlos é democrático, chega a ser unanimidade entre classes, etnias, idades e sonhos. “Eu vi muitos cabelos brancos na fronte do artista/ O tempo não pára e no entanto ele nunca envelhece” e é com a música de Caetano que nosso astro chega aos 80 anos: repleto de sucesso, juventude, charme e romantismo. Vida longa ao Rei !