Em janeiro deste ano, em entrevista para um jornal de Pernambuco, defendi que conservadores rompessem com o governo. Tenho apontado a necessidade de uma direita sem Bolsonaro. Retomo o tema porque tive a satisfação de ouvir, por esses dias, um podcast no qual o cientista político João Pereira Coutinho sintetizou algo relevante: "No esquema geral, Bolsonaro não é tão importante. Ele é importante como sintoma de uma regressão do conservadorismo para uma posição essencialmente reacionária".
O bolsonarismo é um populismo reacionário e boçal, cuja estridência e histrionismo prejudicam a parcela sensata da direita, que se vê impelida a traçar uma linha divisória, como o fez a senadora Soraya Thronicke, em sessão da CPI da Covid, ao declarar: "Não quero me misturar com essa laia".
Ela se referia a Otávio Fakhoury, empresário bolsonarista que, em seu depoimento, teve de ouvir calado uma histórica e necessária reprimenda do senador Fabiano Contarato como resposta a um ataque grosseiro que o depoente havia postado contra ele nas redes sociais.
Na dita "pauta de costumes", o arremedo conservador bolsonarista tem se limitado ao costume do deboche, da chulice, da vulgaridade, do ataque vil; em matéria de religião, tem instrumentalizado a fé cristã para os fins da mais baixa política, tornando a idolatria e a profanação práticas corriqueiras.
Na semana passada, Bolsonaro e alguns ministros estiveram na Igreja Batista Central de Brasília. Onyx Lorenzoni pregou a adoração ao líder messiânico: em frente a uma enorme tela na qual a palavra "verdade" aparecia em letras garrafais legendando uma foto de Bolsonaro, o ministro perorou: "Não estamos falando de algo humano. Nós estamos falando de algo que vem da vontade de quem nós cremos".
O presidente achou a ocasião adequada para jactar-se com sua divisa dos "três is": "Imorrível, imbrochável e incomível". Não temos um governo conservador; temos um governo degradado.
*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora