'Problema econômico é mais fácil de resolver'

Ex-presidente defende mudanças imediatas 'porque o estoque do que foi feito no passado está se esgotando'

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Em palestra realizada ontem, em Fortaleza, o ex-presidente do Brasil e sociólogo Fernando Henrique Cardoso (FHC) disse que o País passa por uma grave crise política e dificuldade econômica, sendo este último problema, na opinião dele, mais fácil de ser resolvido. "É preciso mudar isso urgentemente, porque o estoque do que foi feito no passado está se esgotando", afirmou, durante a terceira edição do fórum de ideias "Brasil em Debate".

O evento, promovido pela Cooperativa da Construção Civil do Ceará (Coopercon-CE), em parceria com o Sindicato da Indústria da Construção Civil do Ceará (Sinduscon-CE), foi realizado no La Maison Coliseu, no bairro Dunas, e reuniu cerca de 1.200 pessoas.

Para FHC, o atual governo está perdendo o controle das políticas econômicas, da estabilidade que começou com a implementação do Plano Real, em 1994. Embora reconheça que a Nação não sofre atualmente com um surto inflacionário, como ocorreu no passado, o ex-presidente ressalta que existe no País "uma inflação crônica, em nível elevado".

Isso porque, neste ano, a expectativa é de que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deverá atingir ou até superar 6,5%, o teto da meta estimada para 2014.

"A produtividade do Brasil caiu, não em função da incapacidade das empresas, mas por conta de fatores como a burocracia, os impostos e a falta de infraestrutura", diz, destacando que o Brasil deixou de ser competitivo na produção de bens manufaturados para focar no mercado de produtos primários.

Crédito

Na opinião dele, o governo não pode querer crescer apenas expandindo o crédito para estimular o consumo, mas deve se preocupar com questões como a inflação, as políticas do Banco Central e os investimentos.

"Caímos na armadilha do baixo crescimento. Fala-se em expansão do emprego, mas a expansão foi dos níveis mais baixos de remuneração. Não podemos crescer dando subsídios, reduzindo juros para alguns e estimulando o consumo por meio do crédito. As medidas tomadas pelo atual governo não são a longo prazo e nem horizontais", declara, criticando a "nova matriz econômica" da presidente Dilma Rousseff.

Contrato social

Com relação às políticas sociais, a exemplo do programa Bolsa Família, FHC afirma que os benefícios já foram incorporados à sociedade brasileira, embora lembre que isso custe aos cofres públicos. "O Brasil tem um contrato social, e a população é a favor desse contrato. A sociedade vota naqueles que dizem que vão manter as políticas sociais. A sociedade não quer um governo só atendo ao mercado, mas atento às pessoas", alertou.

Ele lembra, inclusive, que a Constituição de 1988 prevê a realização de políticas sociais.

Reformas

De acordo com o ex-presidente, as reformas pelas quais o Brasil deve passar - política, econômica e tributária - foram sendo esquecidas ao longo dos anos. FHC defende uma maior flexibilidade nas leis trabalhistas, permitindo acordos entre os sindicatos e "ajustes nos momentos necessários". Ele também é a favor da simplificação e da redução das alíquotas de determinados impostos. A principal reforma e a mais difícil de ser realizada, na opinião de FHC, é a política.

O ex-presidente critica, por exemplo, o financiamento privado das campanhas eleitorais da forma como é feito. "Eleição é compra de voto, direta ou indiretamente. As grandes empresas dão (dinheiro) para todos os partidos, na expectativa de vantagens. O processo é corrupto em si mesmo", analisa.

População

FHC citou as manifestações de junho de 2013 para dizer que, atualmente, há uma forte vontade do povo brasileiro em participar das decisões governamentais. Para ele, o perfil do Brasil - tradicionalmente visto como um Estado forte, mas com uma sociedade fraca - vem sendo reconfigurado. "O sistema político brasileiro está desacreditado por causa da ineficiência, da corrupção e do distanciamento com o eleitor", completa.

Construção age para participar  de decisões

"Um setor importante para a economia brasileira como a construção civil, que só no Ceará emprega diretamente 90 mil pessoas e gera mais 270 mil empregos indiretos, não pode continuar à margem das decisões do País". É o que defende André Montenegro, presidente do Sinduscon-CE - entidade parceira da Coopercon-CE, na promoção do fórum Brasil em Debate, que trouxe, ontem, à Fortaleza, o ex-presidente FHC.

Conforme o empresário, embora tenha "pujança econômica", o setor carece de "força política" - fator indispensável, segundo ele, para garantir a "representatividade" da atividade no País. "Contribuimos com 15% do PIB nacional. Então, a gente quer intervir nas leis que agem diretamente sob o setor. Queremos ser ouvidos", frisa.

Segundo Montenegro, a série de debates busca inserir o setor na discussão política, numa perspectiva para além das eleições. "O Brasil em Debate não termina aqui. Ele não é voltado para a eleição. É um debate mais prolongado, que vai se perpetuar pelo próximo ano. Vamos trazer várias correntes políticas, vários pensamentos. No último debate desse ano, vamos trazer o (economista) Eduardo Gianetti".

Segundo ele, no fim de 2014, será encaminhado um documento ao poder público, contendo as principais ideias e propostas apresentadas ao longo do ano. Para o presidente da Coopercon-CE, Marcos Novaes, "o fórum nasceu com o propósito de ser um mecanismo para exercitar a cidadania e está cumprindo".

Perspectivas

Para o próximo ano, Novaes afirma que a tendência é que o PIB do Ceará continue crescendo até três vezes acima do PIB nacional, mas que o ano será de ajustes. Para Montenegro, não há perspectiva de desaquecimento para a construção civil no Ceará. "A tendência é o setor continuar estável, com um crescimento mais maduro, mesmo porque temos dois fatores importantes: uma demanda reprimida de 120 mil unidades só na RMF, e financiamento abundante", explica.

O QUE ELES PENSAM

Experiência motiva empresários

"O debate com uma liderança nacional como Fernando Henrique Cardoso nos ajuda a oxigenar as ideias com informações advindas de sua bagagem de experiência em vários segmentos, trazendo subsídios importantes para indicar caminhos ao setor produtivo cearense, mas também com vistas ao desenvolvimento do País"

José Dias de Vasconcelos
Presidente do CIC

"Com sua visão estratégica e informações privilegiadas de mercado, pelo seu histórico e trajetória política e acadêmica, Fernando Henrique Cardoso motiva o empresariado cearense a buscar brechas e ferramentas para continuar investindo, visando maneiras de proporcionar o crescimento de nossos negócios e da nossa economia"

Ubiratan Júnior
Diretor presidente da Smolder Surf Wear

"Não é só a construção civil do estado do Ceará que se beneficia com a vinda de Fernando Henrique Cardoso ao Brasil em Debate, mas toda a sociedade cearense. Com seu alto nível cultural e grande experiência, ele é hoje uma das pessoas mais bem preparadas para falar sobre a economia e a política do País"

Roberto Sérgio Oliveira Ferreira
Vice-presidente da Fiec

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