Transnordestina ampliaria participação do Cariri na economia do CE

Para representantes do setor produtivo, região possui demanda de exportação "reprimida" por conta da falta de infraestrutura. Barateamento do transporte potencialmente abriria o mercado para a venda de granito, avalia especialista

De janeiro a outubro de 2019, o município de Juazeiro do Norte apresentou um crescimento de 39,79% nas exportações em relação a igual período do ano passado. Foram vendidos US$ 440.985 em mercadorias, principalmente para a Argentina, enquanto em 2018 haviam sido US$ 315.458. Apesar desse crescimento, a participação do município ainda representa uma parcela de apenas 0,25% do comércio exterior do Estado, que nos primeiros dez meses atingiu US$ 1,91 bilhão em exportações.

Os gestores e empresários da terra do Padre Cícero acreditam que esta fatia seria bem maior se a obra da Transnordestina já tivesse sido concluída.

O setor de comércio e serviços detém sozinho 86% do Produto Interno Bruto (PIB) da cidade de Juazeiro do Norte. A indústria, principalmente pelas fábricas de calçados, semijoias e alumínio, concentra 12% da economia local. Os 2% restantes são da agricultura. Além disso, de 2002 a 2016, a participação do município no PIB do Ceará saltou de 2,23% para 3,02%.

Mas as exportações não acompanharam este ritmo a nível estadual, sobretudo, porque as vendas são feitas quase que exclusivamente para os países do Mercosul. As distâncias para o Porto do Pecém e para Porto de Suape (PE) impedem que os empresários locais tenham um mercado mais competitivo.

Para encurtar este trajeto e baratear o transporte, a esperança era que a Ferrovia Transnordestina, projeto concebido ainda no Governo de Luís Inácio Lula da Silva, em 2006, estivesse funcionando.

Com 1.753 quilômetros de extensão em linha principal, a ferrovia passará por 81 municípios entre os estados do Ceará, Pernambuco e Piauí, ligando-se aos portos do Pecém e Suape. O projeto prevê a capacidade de transportar 30 milhões de toneladas por ano, se tornando um elo importante para aproximar a economia do Nordeste dos principais mercados internacionais.

O orçamento original do projeto era de R$ 4,5 bilhões. Até agora, já foram investidos R$ 11 bilhões e serão necessários mais R$ 7 bilhões para a conclusão.

Logística

O empresário Roberto Celestino acredita que a falta de infraestrutura faz com que a região do Cariri, que hoje ocupa pouco mais 8% do PIB cearense, tenha uma demanda de exportação "reprimida". "A Transnordestina criaria um preço competitivo. Seria um modal que colocaria a região no mundo. Abre espaço para a fruticultura irrigada de maior valor agregado, como morango, uva", acredita.

Além da própria fruticultura, com destaque para a banana, o economista e professor da Universidade Regional do Cariri (Urca), Wellington Ribeiro, acrescenta que o barateamento do transporte potencialmente abriria o mercado para a venda de granito, pois "tem muita mina e é um produto com um custo significativo", reforça o professor.

Outra oportunidade aconteceria com a abertura de espaços de distribuição de produtos de municípios próximos, como o gesso fabricado em Araripina (PE), que seria mais fácil de transportar pelo Sul do Estado.

Entre outros obstáculos, tanto o empresário como o economista acreditam que a concentração de investimentos na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), sobretudo no Complexo Industrial e Portuário do Pecém (Cipp), inviabiliza o crescimento das exportações no interior.

"Isso é uma coisa dramática. Antes, o Cariri brigava por investimento industrial, emprego. O que nós vimos nestes últimos anos foram muitas indústrias calçadistas fechando. Não há um movimento de repor. Se intensificam grandes investimentos no Pecém, em Eusébio, em Horizonte, e a fatia econômica do Cariri caiu. Claro, o Pecém é muito atrativo, mas a melhor maneira era a gente estar umbilicalmente ligado a ele por um transporte de baixo custo", avalia Roberto Celestino.

Esperança

"Se você coloca o transporte mais barato, tem como gerar o fluxo nos dois sentidos", acredita Wellington Ribeiro. O economista destaca que a região do Cariri tem uma boa localização, já que é quase equidistante de algumas das principais capitais do Nordeste e é cortada por algumas rodovias importantes, como a BR-116. "Isso é um potencial muito grande na área de distribuição de mercadorias", acrescenta.

Hoje, o setor calçadista é o maior exportador de Juazeiro do Norte. O crescimento das vendas ao exterior se deve, principalmente, pela crise econômica no País, que fez os empresários fugirem do mercado doméstico. De acordo com o empresário deste ramo Abelito Sampaio, o Paraguai e a Argentina são os principais compradores das peças.

"O transporte é terrestre e os custos não chegam a ser assim tão altos, porque nosso cliente consegue fechar uma carreta só para ele comprando uma parte daqui e de outra fábrica", explica ele.

Esta aproximação começou com a ida dos produtos para estados próximos à fronteira, como Paraná e Rio Grande do Sul. "Houve um aumento nas exportações porque o mercado interno deu uma desaquecida. Os empresários que priorizaram o comércio exterior se sobressaíram", ressalta Abelito. Na sua fábrica, a produção diária alcança três mil pares, mas já chegou a sete mil em 2015. "A gente vende para o País todo, mas o Norte e Nordeste ainda concentra as maiores vendas", acrescenta.

Abelito vê com bons olhos a possibilidade de expandir o mercado com o transporte mais barato, através da Transnordestina. "Seria outra logística. Se fazendo um trabalho para estes países além do oceano, no futuro poderia ser viável", observa.

É com este olhar que o titular da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Inovação de Juazeiro do Norte (Sedeci), Michel Araújo, acredita que a indústria local chegará a novas fronteiras. "A gente tem dialogado com o setor que, devido à dificuldade do mercado interno, adéque seus produtos e busquem a exportação, expandindo do Mercosul para África, América Central e, quem sabe, entrar na Europa", pontua o secretário.

A Pasta comandada por Michel tem realizado eventos, inclusive em parceria com o Estado, para estimular a venda ao comércio exterior. "A gente reforça os dados que vem obtendo para que outros empresários possam fazer essa ponte com o comércio exterior e ter novas formas de receitas", reforça o secretário.

Além disso, ações de consultoria e treinamento para melhorar a competitividade da indústria juazeirense também são oferecidas. "Apresentamos a estrutura para quem quer exportar e fazer a integração com outros países que querem importar", destaca o diretor de Indústria da Sedeci, Piedley Macedo.