Setor produtivo cearense aponta preocupação com saída de Moro

Segundo os empresários consultados pela reportagem, movimentações no Governo Federal podem trazer incerteza ao mercado, mas afirmam que danos poderiam ser maiores, caso o ministro da Economia deixe o cargo

A política brasileira, mais uma vez, trouxe impactos diretos à economia nacional, e a saída do ministro da Justiça, Sérgio Moro, causou preocupação de empresários do setor produtivo cearense. A maior inquietação é que a demissão do ex-juiz federal possa trazer muitas incertezas ao cenário econômico do País, o que poderia reduzir a presença de investidores estrangeiros e dificultar as relações comerciais do Ceará com outros países. Além disso, eles apontaram uma queda da credibilidade do Governo Federal.

Na Bolsa de Valores Brasileira (B3), os reflexos do rompimento entre o presidente Jair Bolsonaro e Sérgio Moro foi quase que imediato. Durante a sessão, o Ibovespa, principal índice da economia nacional, registrou queda de mais de 9% e quase paralisou as atividades com um circuit breaker - mecanismo de segurança da Bolsa. Apesar da queda vertiginosa, o Ibovespa fechou com uma queda menor, de 5,75%. Já o dólar fechou a sexta-feira (24) cotado a R$ 5,65, novo recorde nominal.

Mas no Ceará, empresários indicaram que a mudança poderá, sim, afetar a credibilidade do Governo Federal, já que Moro era encarado como um dos pilares do Poder Executivo. Para Cid Alves, presidente do Sindicato do Comércio Varejista e Lojista de Fortaleza (Sindilojas), a saída do ex-juiz é preocupante e pode ser encarada como um alerta de como a política será tocada agora pelo governo Bolsonaro.

Segundo Alves, o "modelo antigo" poderá voltar a ser usado pelo Governo, com a troca de cargos para garantir a sequência no Poder e isso traria muitas incertezas ao mercado, que não teria confiança no poder público.

"Isso abala a condução política a partir de agora, porque entendemos que o modelo anterior de toma lá da cá pode voltar a acontecer. A economia vinha em uma crescente até a chegada da pandemia. E durante a pandemia, tivemos saída do Mandetta (ex-ministro da Saúde), e agora e de Sérgio Moro, que detinha muita confiança", disse.

O presidente do Sindilojas, contudo, afirmou que o impacto na economia e na credibilidade do Governo poderia ser maior, caso o ministro Paulo Guedes (Economia) também decida deixar o cargo em Brasília. Alves projetou que a saída de Guedes seria gerar caos na economia brasileira e aprofundar a crise gerada pelo novo coronavírus.

"Se o Paulo Guedes sair, será um caos e poderá haver um desequilíbrio completo da roda da economia, trazendo incerteza para os empresários e para os investidores. É a credibilidade dele que segura a estrutura econômica, e se Guedes sair, teremos uma incógnita e muita dúvida entre os investidores, que irão fugir do País. E se os investidores saírem do Brasil, eu não sei o que pode acontecer", explicou.

Cautela

O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (Faec), Flávio Saboya, também disse considerar que o momento é de fato preocupante, considerando a saída do ministro Sérgio Moro, quem ele enxerga ser uma "referência nacional pelas ações durante a operação Lava Jato". Ele, contudo, disse que prefere aguardar a evolução da situação do Governo para fazer avaliações dos impactos no agronegócio cearense, considerando as relações com o mercado externo.

"A saída dele é desgastante. Eu acho que é precipitado afirmar os reflexos que isso poderia trazer no nosso mercado de importações e exportações, porque os negócios são fechados entre os produtores e os mercados internacionais. Certas vezes, temos com apoio da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), então acho que neste momento não teremos prejuízo", prevê Saboya.

Economia

Ele corroborou o discurso de que a economia teria um impacto ainda maior caso o Governo Federal decida dispensar o ministro Paulo Guedes. "Eu não vi nenhum comentário sobre a saída de Guedes, mas claro que temos correlações do setor rural com a atuação do ministro e isso poderia ter consequências ruins, mas eu não sei como calcular neste momento o impacto disso", apontou Saboya.

"Precisamos esperar a evolução dos fatos. Mas já sentimos uma redução no nosso setor. Tivemos uma exportação grande de frutas nos últimos anos e isso se reduziu muito, e os exportadores hoje estão na Bahia e não aqui, então isso preocupa. No termo da exportação, nós temos que esperar para ver quem é que vai assumir", completou.

Pilar retirado

Já para o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef), Raul Santos, a saída de Moro é preocupante, porque o governo Bolsonaro perdeu um dos pilares da gestão, restando apenas a atuação do ministro da Economia. Santos, no entanto, também ponderou a situação, afirmando que será preciso cautela para avaliar o avanço do embate entre o presidente da República e o ex-ministro da Justiça.

Ainda assim, Santos afirmou que o mercado sentirá os efeitos desse rompimento, pois a movimentação eleva a incerteza do cenário econômico brasileiro e cearense. Ele destacou que o Governo Federal tem gerado muitas crises e isso prejudica a ação das empresas e afasta os investidores internacionais, que avaliarão com receio a entrada de capitais no Brasil e as negociações com negócios nacionais.

Para Santos, o presidente pode ter deixado o "papel de pai" ter falado mais alto quando buscou a troca do diretor-geral da Polícia Federal. Ele avalia que Bolsonaro pode ter pensado para proteger os filhos de possíveis investigações, gerando um embate com Moro e uma situação poderá acabar isolando-o e prejudicando a economia.

"Para o mercado financeiro, isso é ruim, pois estamos gerando um cenário de incerteza e abre uma crise em cima da outra, então nós temos um ambiente complexo. Mas precisamos ter cautela. Moro e Guedes são duas estrelas desse governo, então a saída de Moro preocupa bastante, mas precisamos entender a situação", disse Santos.

O vice-presidente do Ibef ainda alertou que o Governo Federal pode estar trabalhando para isolar o ministro Paulo Guedes, e isso poderá trazer mais incertezas à economia. "Uma saída de Guedes gera uma estabilidade muito grande. E o plano de recuperação econômica vai ser tocado pela Casa Civil e não por Guedes. Isso é estranho", disse.

O setor produtivo cearense enxergou com preocupação a saída de Sérgio Moro do Ministério da Justiça, mas indica que economia seria mais prejudicada se Paulo Guedes deixasse o Governo