Procon Fortaleza instaura processos contra agências de viagem

Consumidores denunciaram abusos de empresas após cancelarem pacotes de turismo devido a temores com epidemia do coronavírus. Os destinos com contratos mais afetados são países da Europa e asiáticos

O Departamento Municipal de Proteção e Defesa dos Direitos do Consumidor (Procon Fortaleza) recebeu, entre quinta e sexta-feira (6), quatro reclamações contra agências de viagens, operadoras de turismo e companhias aéreas envolvendo cobranças para o cancelamento ou alteração de voos para destinos com casos de coronavírus confirmados, como para a Itália e outros países da Europa e da Ásia.

Nos quatro casos já registrados, o Procon já marcou audiência de conciliação para tentar solucionar o conflito. Caso a empresa se negue a resolver o problema do cliente, e sendo constatada infração ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), as empresas podem ser multadas em até R$ 13 milhões.

Segundo o Procon Fortaleza, consumidores denunciaram ao órgão de defesa que agências de viagens estariam cobrando taxas e multas por conta do cancelamento ou alteração da viagem, prática abusiva e proibida pelo CDC.

A diretora do Procon Fortaleza, Cláudia Santos, esclarece que o Código prevê, como direito básico do consumidor, revisar cláusulas contratuais "em razão de fatos supervenientes", como é o caso atual, de uma situação excepcional, mesmo que as empresas não tenham culpa pelo fato extraordinário. "O consumidor é a parte vulnerável nas relações de consumo. Sendo assim, é parte mais protegida pelo Código de Defesa do Consumidor", afirmou a diretora.

Cláudia explica que as empresas devem garantir o reembolso integral dos valores pagos, na mesma forma que foi realizada pelo consumidor, ou seja, estorno do cartão de crédito ou da conta bancária; ou ainda crédito para uma possível viagem posterior, caso o consumidor concorde.

Em nota, a Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav) informa que as empresas associadas reportam que estão sendo feitas consultas de clientes sobre o status das operações. "Por isso, temos trabalhado muito fortemente na difusão e no compartilhamento de todas as informações que chegam tanto das fontes oficiais dos órgãos de saúde e dos destinos, como também dos fornecedores envolvidos, como companhias aéreas, hotéis etc", aponta.

"Temos trabalhado muito diretamente também com esses fornecedores para que eles reforcem os canais de atendimento aos agentes de turismo e que sejam oferecidas opções e facilidades nas remarcações, sem custo, aos passageiros que não se sentirem confortáveis em viajar nesse momento", reforça a associação nacional.

A Abav informa ainda que as políticas de remarcações não são padronizadas, que dependem de cada fornecedor, e que as agências fazem toda a intermediação necessária. "Importante sinalizar que essas informações mudam sistematicamente, por isso o monitoramento diário é muito importante e temos feito isso - vale lembrar, entretanto, que o período é de baixa temporada, o que naturalmente diminui o fluxo, especialmente de viagens longas", pontua.

Problema

Flavio Ribeiro, aposentado, tinha planejado fazer um tour de navio por alguns destinos do Brasil, da Espanha, da França e da Itália. De lá, partiria de avião para Nova York, nos Estados Unidos. Agora, por conta da disseminação do coronavírus, especialmente na Itália, última parada do cruzeiro, não quer mais ir. Sobretudo porque de lá iria para os EUA, e teme não conseguir passar pela imigração por conta da epidemia que domina o território italiano. O aposentado e a esposa já pediram o cancelamento e foram orientados para aguardar mais um pouco.

"Ainda não deram o prazo da devolução. Estou em contato com a empresa de Fortaleza. Pediram até o dia 10 de março para o cancelamento, restituição dos valores pagos. Se não houver uma resposta adequada, entrarei em contato para uma solução. Não queremos ter o prejuízo todo. Podemos até pagar algumas taxas. Não temos culpa", afirmou Ribeiro.

Situação séria

Colombo Cialdini, vice-presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens no Ceará (Abav-CE), afirmou que a situação do coronavírus para o trade turístico internacional está sério. "Pessoas que compraram viagem internacional se programam com antecedência. Quando fizeram isso, não estava essa coisa tão séria como hoje. Os países estão cancelando muitos voos. Já se nota o cancelamento e adiamento de pacotes, principalmente, para localidades da Europa e Ásia", frisou Cialdini.

Ele teme por uma situação ainda pior especialmente na Europa e países asiáticos para o turismo, apesar de entender que não se sabe onde mais o vírus vai aparecer com força. "Não se tem ideia para onde o vírus vai migrar. Pelo que é dito nos veículos de comunicação, é tudo muito incerto, pois uma pessoa contaminada pode se deslocar por aí. Enquanto isso, museus são fechados, passeios cancelados, voos suspensos e o PIB desses países vai ser afetado pelo investimento que viria do turismo", disse o vice-presidente.

Viagens de negócios

Segundo a Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abracorp), o segmento de viagens de negócios ainda não sentiu os efeitos da epidemia do coronavírus, conforme análise dos dados disponíveis até janeiro deste ano, quando foi registrado crescimento de movimentação.

"Temos observado que o número de cancelamentos em janeiro foi praticamente zero. Não fugiu à normalidade. O que vem impactando é a suspensão de alguns voos especialmente para destinos que estão em destaque na mídia, como, por exemplo, a Itália", informou a associação, deixando claro que os números de fevereiro ainda não estão consolidados.

"Os cancelamentos seguem as regras de mercado que estão estabelecidas internacionalmente. As agências de viagens corporativas se empenham para garantir o máximo de flexibilidade entre clientes e fornecedores no caso de alterações e cancelamentos".

Conflito

Já internamente, Cialdini conta que está tudo tranquilo. Segundo o vice-presidente, ainda não há impacto em viagens e roteiros pelo Brasil. "Tudo está normal. Esse problema mundial deve incrementar o turismo nacional, pois o risco é muito menor. Não existe alteração no turismo doméstico. Quem ia para Paris e resolveu ir para serras gaúchas, por exemplo. Uma mudança para áreas sem esta doença", concluiu.

Eliseu Barros, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis no Ceará (ABIH-CE), está um pouco mais preocupado. Segundo ele, a expectativa do setor para o ano era ótima, mas virou uma incógnita com o coronavírus.

"Estávamos muito otimistas com 2020. Tivemos um grande resultado no Carnaval, mas com o episódio desta doença, tudo virou uma incerteza pelo que se instalou. As companhias aéreas têm índice enorme de suspensões, começaram a acontecer cancelamento de reservas de hotéis. Se isso for resolvido rápido, nós podemos retornar ao patamar de otimismo e segurança de antes", assegurou o presidente, na expectativa de que a solução para o coronavírus chegue logo.