Apesar do momento econômico adverso devido à crise provocada pelo coronavírus, com previsão de queda do Produto Interno Bruto (PIB) superior a 5% no ano, as empresas cearenses listadas em bolsa de valores apresentaram desempenho acima da média ao longo deste ano. E, na semana passada, a Pague Menos, terceira maior rede de farmácias do País, juntou-se ao grupo até então formado por M. Dias Branco, maior empresa nacional do segmento de massas e biscoitos, HapVida, de planos de saúde, e a Arco Educação.
Diferente de setores como o do comércio, turismo, vestuário, dentre outros, que tiveram o funcionamento restrito durante a quarentena, as empresas cearenses listadas, incluindo a recém-chegada Pague Menos, estão em segmentos considerados essenciais, como o de alimentos, saúde, educação e medicamentos.
“De modo geral, as empresas cearenses de capital aberto não foram tão impactadas por esse período de crise, se comparado com empresas de outros segmentos”, diz Ricardo Coimbra, presidente do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE).
“A própria Pague Menos fez a abertura agora neste momento, talvez estratégico em função de um forte crescimento da demanda por produtos farmacêuticos por conta da própria pandemia”, diz Coimbra. “A companhia tende a ter uma forte alavancagem ao longo dos próximos ciclos, aumentando a base de unidades. E o mercado de produtos farmacêuticos está em forte expansão”.
Evolução das ações
Neste ano, enquanto o Ibovespa, principal índice da bolsa brasileira, acumula uma queda em torno de 15%, as ações da M. Dias Branco recua cerca de 8%, a HapVida cai pouco mais de 1%, e a Arco, que é negociada na bolsa americana Nasdaq, acumula uma alta de cerca de 7%. Assim como a Pague Menos, cada uma dessas empresas está entre as maiores do País em seus setores.
“Todas elas estão em setores beneficiados durante a crise”, diz o economista Lauro Chaves, conselheiro federal de economia e professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece). “O setor de alimentos continuou vendendo nos supermercados. A venda de medicamentos também foi beneficiada. Já a HapVida utilizou muito a telemedicina e apresentou índices elevados de recuperação de pessoas com Covid, o que pode gerar uma maior fidelização de seus beneficiários”, diz.
No caso da Arco, Lauro Chaves destaca que a empresa apresentou uma vantagem adicional sobre os concorrentes, por já estar preparada para o cenário de educação virtual mesmo antes do início da crise. “A Arco entrou com a vantagem de já possuir ferramentas que permitem a educação virtual. E no campo da educação, nós vamos entrar, cada vez mais, em uma busca por agilidade com educação remota e de qualidade, o que a Arco já faz”. Em 2018, a Arco, que faz parte do grupo Ari de Sá, foi primeira startup brasileira de educação e tecnologia a abrir capital na Nasdaq.
IPO da Pague Menos
Precificada a R$ 8,50 para a oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês), as ações da rede de farmácias ficaram abaixo da faixa indicativa sugerida para a oferta (de R$ 10,22 a R$ 12,54), o que frustrou a expectativa da empresa, mas logo no primeiro dia de negociação a ação saltou 21,18%, fechando o pregão de estreia, na quarta-feira (2), cotada a R$ 10,30.
Na quinta-feira (3), segundo dia de negociação, o papel fechou com alta de 0,97%, cotada a R$ 10,40, enquanto o Ibovespa fechou em queda de 1,17%. Com o IPO, a empresa captou R$ 859 milhões.
Com mais de 1.100 farmácias em operação em todo o País, a Pague Menos pretende utilizar os recursos para bancar sua expansão. “O IPO abre uma nova perspectiva para as empresas financiarem suas estruturas de capital. E o que vemos hoje é que todas as empresas cearenses que abriram capital são gigantes em seus setores de atuação”, diz Lauro Chaves.
“Mas o IPO não serve apenas como fonte de capital, serve também para melhorar a governança da empresa abrindo novos horizontes para o crescimento futuro”, diz. Atualmente, a HapVida é a empresa mais valiosa do Estado, com aproximadamente R$ 50 bilhões de valor de mercado. Em seguida vem a M. Dias Branco com R$ 12,54 bilhões, Arco Educação, com US$ 2,66 bilhões, e Pague Menos, com cerca de R$ 4,5 bilhões. Lauro Chaves faz questão de ressaltar no entanto, que apesar do crescimento do número de empresas e de investidores na bolsa brasileira, os números ainda podem ser considerados tímidos, se comparados com as maiores bolsas do mundo, indicando que ainda há um grande potencial de crescimento para os próximos anos.
“Precisamos tornar o mercado de capitais mais acessível também para as pequenas e médias empresas. Quando isso ocorrer nós vamos mudar de patamar”, diz Chaves. Enquanto a bolsa brasileira (B3) tem cerca de 375 empresas listadas, a bolsa de Nova York (NYSE) tem mais de 2,7 mil e a Nasdaq, onde a Arco Educação é negociada, tem mais de 2,8 mil.
Investidores cearenses
Se para as empresas, o momento é considerado propício para a abertura de capital, para os investidores pessoas físicas, a bolsa se tornou o destino natural neste cenário de juros historicamente baixo. Como a maior parte dos tradicionais investimentos em renda fixa está atrelada à taxa básica de juros (Selic), hoje em 2% ao ano, muitos investidores buscaram alocar seus recursos na renda variável.
Desde o início do ano até agosto, o número de investidores cearenses na bolsa de valores cresceu 88,4%, passando de 30,1 mil investidores no início de janeiro para 56,7 mil no fechamento de agosto. Ao todo, os investidores cearenses têm R$ 3,81 bilhões na bolsa. No mesmo período, o número de brasileiros cadastrados na bolsa cresceu 76,2%, somando hoje 2,95 milhões.
Fila de IPOs
Além da Pague Menos, mais de 40 empresas esperam para abrir o capital na B3 em setembro e outubro. Entre elas estão a varejista Le Biscuit, com sede na Bahia, a fabricante de pás eólicas Aeris, as incorporadoras Urbe, da MRV, e HBR Realty, e a rede de farmácias Nissei, do Paraná. Dessas 40 empresas, 18 são incorporadoras. Apenas em agosto, cerca de 20 empresas fizeram o protocolo de oferta. Nas últimas semanas, houve duas tentativas frustradas de IPO. A Riva 9, da Direcional, e a You Inc. não encontraram demanda suficiente para colocar suas ofertas de pé, em uma prova de seletividade dos investidores.