A cobrança cada vez maior dos importadores de produtos brasileiros sobre uma postura em relação ao avanço do desmatamento na Amazônia vêm preocupando empresários do agronegócio cearense. Caso a ameaça de boicote - que parte, sobretudo, da Europa - se concretize, a exportação de frutas, 4º principal item da pauta do Estado, pode ser prejudicada. Mesmo que isso não aconteça, lideranças do setor no Ceará avaliam que a situação inevitavelmente "arranha" a imagem do País.
Para o presidente da Câmara Setorial do Agronegócio da Agência de Desenvolvimento do Estado do Ceará (Adece), Amilcar Silveira, é difícil calcular os impactos de um possível boicote. "Aqui no Ceará, nós podemos enfrentar dificuldades com isso. Não acredito que vá acontecer um boicote, mas, de alguma forma, a nossa imagem fica arranhada", diz. Na avaliação dele, o conflito se dá por um problema de comunicação - alegação já feita pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, sobre a questão -, mas pontua que "isso não quer dizer que o desmatamento não ocorra".
"O empresário do agrone-gócio cearense está trabalhando para mostrar ao importador que nós não precisamos de forma alguma desmatar a Amazônia. O Governo Federal precisa fazer a sua parte, melhorando a comunicação e punindo os responsáveis por essa degradação", explica Amilcar. Ele reforça que os produtores rurais devem, por lei, preservar 20% das áreas em suas propriedades. "Nós fazemos isso e mostramos o nosso compromisso".
Protecionismo
O presidente da Câmara Setorial do Agronegócio pondera, contudo, que a ameaça de boicote pode estar ligada a um protecionismo em relação aos produtos europeus. "Pode acontecer. Os americanos faziam muito isso. O nosso agronegócio é totalmente liberal. O mercado externo e a lei da oferta e da procura fazem os nossos preços", diz.
Luiz Roberto Barcelos, diretor institucional da Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas (Abrafrutas) e sócio da Agrícola Famosa - que exporta a produção cearense de melões e melancias -, também acredita que a cobrança e a ameaça de boicote podem estar ligadas a uma visão mais protecionista. "Há quem plante isso na Europa em caráter de protecionismo", diz. Isso não significa, porém, que a situação não acenda um alerta para os empresários do setor.
"Isso realmente preocupa porque, se for levado adiante, nós podemos ser prejudicados", pontua Barcelos. O receio foi levado a uma reunião no fim do mês passado com os ministros Ricardo Salles e a ministra Tereza Cristina, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). De acordo com Barcelos, esta semana provavelmente o setor vai se reunir com o vice-presidente Hamilton Mourão, chefe do Conselho Nacional da Amazônia Legal, para tratar do assunto.
Diante do risco, Barcelos explica que a estratégia que as empresas estão adotando é a de reforçar a postura de responsabilidade ambiental desses negócios perante os importadores. "Temos trabalhado para deixar claro que a fruticultura e o agronegócio brasileiro não compactuam com a degradação da Amazônia e que não é a gente que faz isso. São grileiros, criminosos, sem CNPJ que vivem à margem da lei", aponta o diretor institucional da Abrafrutas. "A nossa estratégia é mostrar aos importadores que a fruticultura brasileira está longe do bioma amazônico, com exceção do açaí, que ainda assim possui uma produção sustentável".
Exportações cearenses
Caso o boicote ocorra, os principais produtos afetados, na avaliação da Câmara Setorial do Agronegócio da Adece, seriam o melão e a banana, produtos cearenses enviados, sobretudo, para Holanda, Reino Unido e Polônia. De acordo com dados do ComexStat, plataforma do Ministério da Economia, os melões e as bananas são segundo e terceiro produtos mais exportados entre as frutas no Ceará. De janeiro a junho deste ano, o envio de melões frescos ao exterior totalizou US$ 14,1 milhões. As exportações de bananas somaram US$ 4,5 milhões.
Edson Brook, presidente da Tropical Nordeste Agrícola e da Câmara Setorial de Fruticultura, também pontua que a situação preocupa. Ele reforça, porém, que é exigido das exportadoras do agronegócio certificação internacional que somente os negócios que cumprem rigorosamente leis federais, estaduais e municipais podem obter. "É preciso estar de acordo com as questões de meio ambiente para ter essa certificação", diz.
Guedes
Em meio à mudança de postura do governo em relação aos temas ambientais, o ministro da Economia, Paulo Guedes, aproveitou ontem (13), a participação em evento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para fazer um discurso enfático de compromisso com a preservação da Amazônia. Após pressões de diversos investidores internacionais, o governo tem tentando mudar a imagem do Brasil em relação à preservação da floresta.
"Sabemos que temos que reduzir os efeitos sobre o meio ambiente. Queremos apoio e compreensão para fazer isso melhor. O Brasil sabe da importância do desenvolvimento sustentável não apenas do ponto de vista fiscal, como do ponto de vista ambiental", discursou o ministro. "Se há excessos e erros, corrigiremos. Ou melhor dizendo, não aceitaremos o desmatamento ilegal e a exploração ilegal de recursos", completou.