O cearense Felipe Caetano é um dos homenageados pela campanha dos 75 anos do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), órgão da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgada na sexta-feira (3). O jovem possui uma longa trajetória com a instituição, responsável pela saída dele da situação de trabalho infantil.
Ao Diário do Nordeste, o estudante comenta que não acreditou quando soube que estaria entre os selecionados para participar da ação. "De tantos outros ativistas, pessoas incríveis." Mas, ao conferir o resultado, revela que sentiu "um misto de sensações".
"É uma conquista não apenas pessoal, mas da militância. Uma história de combate ao trabalho infantil estar em destaque justamente no momento em que se discute legalizar alguns casos de trabalho infantil no Brasil, é incrível demais"
Ele menciona a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 18/2011, que tramita na Câmara dos Deputados, e tem objetivo de autorizar o trabalho sob o regime de tempo parcial para adolescentes a partir dos 14 anos.
Além do cearense, o ex-Secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, a embaixadora Unicef e refugiada síria, Muzoon Almellehan, e a profissional de saúde, de Serra Leoa, Diana Koroma, também são homenageados.
Atualmente, aos 20 anos, ele é conselheiro da Unicef Brasil e integra o corpo de discente do curso de Direito da Universidade Federal do Ceará (UFC), sendo o primeiro da família a cursar uma graduação. "Minha mãe, hoje, pode sonhar com minhas irmãs cursando o ensino superior, sonho que, em relação a mim, nunca existiu".
"O trabalho infantil mata esse sonho [de ingressar em uma universidade]. Mata a esperança. Mata as oportunidades. Ele estaciona a vida do ser humano no trabalho braçal, precário e mal remunerado."
Trajetória com a Unicef
Foi aos 12 anos que Felipe teve contato pela primeira vez com a Unicef, através do Núcleo de Cidadania dos Adolescentes (NUCA), em Aquiraz, ação que leva o Selo do fundo. Foi no projeto que descobriu, durante uma oficina sobre trabalho infantil, que a situação em que vivia era uma violação de direitos humanos, fato relembrando na campanha de aniversário da entidade.
Após ter tomado consciência da condição, o jovem decidiu atuar contra a exploração do trabalho infantil e lutar em favor do cumprimento dos direitos humanos.
Para nossa sociedade, remédio de filho de pobre é o trabalho! Uma criança pobre dizer que não quer trabalhar, pois, desejar focar nos estudos é uma afronta imensa.
Felipe é co-fundador do Comitê Nacional de adolescentes na Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (Conapeti). O projeto de conscientização e combate à exploração infantil foi criado pelo próprio jovem, após procurar ajuda do promotor Antônio Lima, do Ministério Público do Trabalho no Ceará (MPT-CE) em 2015.
"Seria muito fácil apenas seguir minha vida. Mas [defender o direito das crianças] é minha forma de recompensar!", declara.
A iniciativa promove palestras e diálogos, alcançando milhares de jovens em encontros bimestrais e trimestrais que, na pandemia da Covid-19, estão sendo realizadas virtualmente. Na prática, o comitê faz denúncias, orienta e auxilia jovens em situação de trabalho infantil.
Em fevereiro deste ano, ele foi homenageado pelo programa Caldeirão do Huck, e também inspirou a versão lançada por Sandy e Lucas Lima da música "Lugar ao Sol".
Quem é Felipe Caetano
O estudante viveu uma infância pobre. Apenas com 8 anos, catava latinhas e garrafas para ganhar entre 10 e 15 centavos. Dos 10 aos 14 anos, já exercia a função de garçom em barracas de praia em Aquiraz, Região Metropolitana de Fortaleza.
Após ingressar no NUCA, e tomar consciência sobre a violação de direito em que vivia, decidiu parar de trabalhar aos 14 anos. No entanto, a decisão teve impactos em casa, onde a própria mãe também trabalhou durante a infância, chegando a ser chamado de "vagabundo" pelos familiares. "Foi um período complicado porquê eles não compreendiam o que eu estava fazendo", relembra.
Ao passar do tempo, Felipe conseguiu conscientizar os parentes sobre o tema. "Minha mãe conseguiu compreender mais ainda a importância da educação, a importância de ser criança", conta.
Trabalho infantil
O trabalho infantil é proibido, segundo a legislação brasileira, incluso na Constituição de 1988, Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).