Saiba o que muda com o Estatuto do Parto Humanizado no Ceará

Sancionada neste mês, a Lei Nº16.837 disciplina, a partir de agora, que todos os estabelecimentos hospitalares devem oferecer atendimento humanitário às gestantes, com uma equipe multidisciplinar e sensível

Nas crenças da publicitária Jessika Moreira, 32, o corpo é sábio e um bebê é quem diz a hora certa de chegar ao mundo. Estes são alguns dos pilares de gestações mais humanizadas, cada vez mais presentes nos desejos das futuras mamães. Neste caminho, o governador do Ceará, Camilo Santana, sancionou, no último dia 17 de janeiro, a Lei Nº16.837, que institui e disciplina o Estatuto do Parto Humanizado no Estado.

O Art. 1º da Lei, já em vigor, garante: o objetivo da sanção da Lei é garantir melhor assistência às mulheres em seu período gravídico-puerperal nos estabelecimentos hospitalares do Estado do Ceará. Com o estatuto, considera-se como tal todas as unidades básicas de saúde, consultórios médicos e de enfermagem, maternidades, centros de parto normal, sejam estes públicos ou da iniciativa privada, e ambientes domiciliares, por ocasião da opção de mulheres pelo parto ser realizado em casa.

Atendimento

Jessika Moreira sofreu um aborto espontâneo no terceiro mês da primeira gravidez. Sem saber se era vítima ou culpada, procurou informações sobre humanização gestacional com a Equipe Maiêutica, de acompanhamento na Gestação, Parto e Pós-Parto. Um ano depois, Jessika engravidou novamente, e soube prontamente: teria um parto normal e humanizado.

"Tive um suporte totalmente integrado e essencial, com todas as orientações possíveis. É um trabalho de enorme contribuição, que desenvolve em nós, mulheres, o direito de escolher como queremos, com total autonomia", descreve a publicitária. A equipe é formada por psicólogos, doulas, enfermeiros obstetras, educadores perinatais e fisioterapeutas.

No momento do nascimento de Laura, hoje com 1 ano, o marido de Jessika também esteve presente. "Perguntei como ele imaginava o parto, ele respondeu que se via abraçando e esperando o bebê. Foi tudo ao contrário: ele ficou do meu lado durante as 12 horas de trabalho de parto, me lembrando de respirar. No fundo, ele pariu comigo", rememora, como se fosse possível esquecer aquele dia.

De todos os momentos das 41 semanas de gravidez, Jessika guarda com carinho a descoberta da acupuntura, que inclusive a ajudou na hora da indução do bebê no parto. "É muito bonito esse trabalho de fazer a gente acreditar que pode ser mais bonito e valorizado o ato de trazer alguém novo ao mundo", costura.

Benefícios

De acordo com a médica ginecologista do Setor de Urgência e Emergência da Maternidade-Escola Assis Chateaubriand (Meac), Clarisse Uchoa, a Lei deve trazer apenas ganhos e benefícios. "Algumas instituições no Estado já atuavam com a prática. Depois do Estatuto, isso deve ser mantido e ainda mais incentivado", declara. Na Meac, o índice de partos cesarianos é de 58%, podendo chegar a 90% em maternidades particulares, compara Clarisse.

O parto baseado em cirurgia, contudo, não é contraindicado. "A melhor prática, na verdade, é a mais adequada para a mulher. Porém, a grande maioria das gestantes se submete à cesariana por medo da dor do parto normal, e o que nós queremos é justamente mostrar que todas elas são capazes de passar por isso", complementa a médica.

Para a doula e psicóloga Krys Rodrigues, integrante da Equipe Maiêutica, é fundamental que as mulheres sejam informadas sobre as vantagens e desvantagens sobre cada forma de dar à luz. "Só munidas de informação elas podem fazer escolhas mais conscientes. Uma mulher quando decide pela a cesariana, geralmente foi levada por um médico que reforçou a economia de tempo e menos dor, o que, sabemos, não é bem assim. Por isso sempre fomentamos rodas de discussão", revela.

Leque

Foi extamente assim que aconteceu com a farmacêutica Aline Bentemuller. "Percebi que o médico era um cesarista nato e mudei imediatamente para uma equipe que tem parceria com a Maiêutica. A partir daí, tudo mudou, pude abrir um leque de opções na minha cabeça e me empoderar", diz.

Dentro dos princípios do Parto Humanizado, Aline se deslocou de casa para o hospital quando a enfermeira percebeu a dilatação uterina de 6 cm. "No ambiente familiar, você se sente à vontade, segura e confortável", alinha. Já após o nascimento, Aline só soltou a filha Alice horas depois, o que "diminui riscos de hemorragias na mulher e de complicações para o bebê, além de fortalecer a afetividade no binômio mãe-bebê", como enumera Clarisse Uchoa.

Segundo a médica, a lei é benéfica porque aumenta a atenção em todos os setores de atendimento, fugindo da classificação majoritariamente elitista em que se encontrava a prática do Parto Humanizado. Para Krys Rodrigues, é preciso ainda dar atenção às equipes. "Pessoas são atendidas por pessoas, e essas precisam estar sensibilizadas à humanização. Então, o primeiro passo é a sensibilização da equipe, e o segundo é a parte física, para um trabalho com instrumentos favoráveis à humanização".

"Preparados nós não estamos, né? Se a gente for esperar ter equipamentos físicos ideais, locais de trabalhos excelentes, acho que não vai acontecer agora. Mas é um caminho que a gente começa a trilhar quando a gente quer mudar", analisa Krys Rodrigues, que atua com o Parto Humanizado há cerca de 5 anos.