Obra de requalificação identifica esgotos clandestinos na Beira Mar

Pelo menos, cinco ligações irregulares foram constatadas entre o Mercado dos Peixes e a Rua Joaquim Nabuco, durante obras de drenagem da orla. Prefeitura alega que a nova padronização da rede de esgoto irá impossibilitar a infração

A requalificação da Beira Mar de Fortaleza trouxe à tona uma irregularidade até então invisível a olho nu: cinco ligações clandestinas na rede de esgoto na orla entre o Mercado dos Peixes e a Rua Joaquim Nabuco. A prática irregular foi constatada durante a execução das obras de drenagem, iniciada pela Prefeitura em setembro do ano passado.

A existência do uso indevido da rede de esgoto no local foi registrada em ata - à qual a reportagem do Diário do Nordeste teve acesso - de uma reunião entre o Ministério Público Federal (MPF) e a Secretaria Municipal da Infraestrutura (Seinf). O encontro aconteceu no dia 17 de janeiro para, inicialmente, discutir denúncia de descarte incorreto de água poluída no mar.

No documento, porém, a Secretaria esclarece que não se tratava de esgoto, mas de "galerias deslocadas" para drenagem de água da chuva. Segundo o procurador da República no Ceará, Alessander Sales, que conduziu a reunião, a queixa foi descartada. "Ficou claro que a intervenção em nada está agravando, em nada está contribuindo para degradação ambiental. Pelo contrário, na verdade, o que a Prefeitura está fazendo é uma galeria para escoar as águas da chuva, e não canalização de esgoto".

O projeto da obra no aterro alterou cinco saídas de drenagem e deixou apenas duas, uma delas fica na altura da Avenida Desembargador Moreira, que motivou a discussão. A titular da Seinf, Manuela Nogueira, explica que a intervenção foi necessária no local porque houve a engorda da faixa de areia.

"Quando nós tivemos a engorda, onde vai passar uma via paisagística e ciclofaixa, o nível do piso que antes era mar, ficou mais alto. No que ficou mais alto, eu não tive mais cota para a galeria de drenagem sair. Se eu a deixasse lá, ao invés de funcionar como drenagem ia era voltar a água", justifica.

Problema

Enquanto acontecia a intervenção das novas galerias para facilitar o escoamento da água, a Seinf descobriu, então, a presença das ligações clandestinas de esgoto enterradas. Conforme Manuela Nogueira, elas são resultado de um serviço feito de forma errada, já que não estavam conectadas no espaço adequado.

"Como a Beira-Mar é uma via tratada muito tempo atrás, por algum motivo alheio à ciência da Prefeitura, essas ligações foram feitas erroneamente. Tratam-se de ligações de esgoto feitas na rede de drenagem ou de ligações de rebaixamento de lençol freático feita na rede de esgoto, ao invés da rede de drenagem", esclarece a secretária.

Contudo, Manuela não informou os responsáveis pela infração, embora, segundo ela, os mesmos já tenham sido identificados e autuados por crime ambiental. A própria Pasta, afirma, tratou de corrigir o problema. "Como é de praxe, onde a Prefeitura já está executando a obra, ela mesma, em comum acordo com o proprietário do imóvel, faz essa regularização. Como foi uma questão conciliável, acho que não cabe a nós citar nomes e identificar os possíveis proprietários".

Autuações

Em 2019, conforme dados da Agência de Fiscalização de Fortaleza (Agefis), foram contabilizadas 5.061 ações de monitoramento que resultaram em 938 autuações por poluição hídrica. Já em relação ao lançamento de efluentes em logradouros públicos, o órgão realizou 529 fiscalizações e 87 autuações.

Caso seja apurado que algum imóvel esteja com ligação clandestina, desrespeitando a legislação, a Agefis entrega uma notificação ao proprietário, inquilino ou responsável. O prazo para regularização é de 45 dias e a multa varia de R$ 202,50 a R$32.400, de acordo com o Código da Cidade (Lei Complementar 270/2019).

"O valor da multa aplicada depende de alguns fatores, como a gravidade da infração, as circunstâncias atenuantes e agravantes e a capacidade econômica do autuado, e será arbitrado pela Junta de Análise e Julgamento de Processos da Agefis", complementa o órgão.

Para Manuela Nogueira, se depender do projeto de requalificação da Beira Mar, a instalação de ligações clandestinas será impossibilitada. Além das melhorias urbanísticas, como novos quiosques de alimentação, calçadão, parque infantil e iluminação, e de mobilidade, a exemplo da ciclovia, as obras preveem ainda a padronização de toda a rede de esgoto. "A gente já vai entregar a infraestrutura de água e esgoto já pronta. Antes, cada barraca era ligada da sua forma, até porque foi construída há um tempo", reforça a secretária, garantindo ainda o fim das irregularidades após a conclusão da obra, cuja previsão é agosto deste ano. "Após a entrega da nova Beira-Mar, a gente pode afirmar que nenhuma ligação que não esteja da forma correta, irá permanecer desde o Mercado dos Peixes até o espigão da Rui Barbosa".

Por outro lado, o professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC), Jeovah Meireles, defende que os esforços para conter ligações clandestinas devem se estender por toda a cidade. "Até porque elas estão distribuídas ao longo das nossas três bacias hidrográficas: Pacoti, Cocó e Rio Ceará. É preciso uma atenção para esses lugares também para que não haja mais degradação ambiental", acredita.