A pandemia agravou as rotinas já desafiadoras de pacientes com microcefalia – comumente associada à Síndrome Congênita do Zika Vírus – e seus familiares. Por meses, unidades de saúde como o Hospital Infantil Albert Sabin (Hias), que é referência nesse tipo de tratamento, suspenderam consultas eletivas como forma de prevenir a disseminação do coronavírus. Agora, porém, a agenda para essas consultas está 100% aberta.
O processo de retomada foi iniciado de forma gradativa em agosto, com apenas parte dos horários disponíveis. Já em novembro, o serviço volta a ser oferecido de forma completa. “Inicialmente, foram marcados menos pacientes para que não houvesse aglomeração na espera. Atualmente, estamos com 100% de disponibilidade, mas várias regras têm sido cumpridas no hospital, como o uso obrigatório de máscara, o distanciamento entre as pessoas na sala de espera, o escalonamento de horários”, detalha André Pessoa, neuropediatra do Hias.
Segundo ele, os pais e responsáveis de pacientes também são orientados a levarem menos acompanhantes para a consulta. “Essa consulta eletiva é quando o paciente está bem, não tem nada urgente, mas vai para manutenção, para ser avaliado pelo médico, ajustar medicamentos e tirar dúvidas”, esclarece.
O espaço para tratamento da síndrome no Hospital Infantil Albert Sabin foi criado em 2015 com a intenção de ser um ambulatório de “porta aberta”, ou seja, todo paciente com microcefalia que fosse encaminhado por outra unidade de saúde, ou por uma maternidade, seria acolhido pelo Hias, conforme lembra o neuropediatra.
Embora o serviço venha sendo retomado gradualmente há três meses, André Pessoa relata que o fluxo de pacientes ainda não é o mesmo de antes da pandemia. No momento, a quantidade atendida equivale a cerca de 60% do total observado antes da chegada do coronavírus ao Ceará.
“O volume diminuiu, e isso independe de nós. Entendemos que existem condições de transporte, além do receio das famílias. Grande parte dos pacientes com Síndrome Congênita do Zika Vírus são do Interior do Estado, então é legítimo que os pais tenham receio de tirar essas crianças de casa”, afirma.
Risco aumentado
Por terem paralisia cerebral, pessoas com microcefalia têm risco aumentado para a Covid-19. “Todos eles têm disfagia, que é a dificuldade de deglutição, e quem tem disfagia tem muito mais problemas respiratórios. Muitos têm a desnutrição associada, e a gente tenta trabalhar isso também com orientação nutricional e administrações alternativas de alimentação”, explica o neuropediatra.
Segundo ele, a orientação dada aos pais e responsáveis é de limitar o número de pessoas que tenham contato com a criança, e de manter também o isolamento dos familiares.
Para a dona de casa Eliene Reis, a preocupação é com a filha Vitória, de 5 anos. A menina foi internada no Hospital Infantil Albert Sabin em novembro de 2019. “Antes dela ser internada, ‘tava’ perdendo muito peso por conta da paralisia porque ela não conseguia mastigar e engolir. Levei sete vezes pra emergência do Albert Sabin. Eles colocaram uma sonda”, conta.
Vitória recebeu alta em janeiro, e retornou para o Hias em fevereiro para passar por uma cirurgia. Após a recuperação, ela não voltou ao hospital, e passou a ser acompanhada em outra unidade.
“A minha preocupação é que a Vitória não pode usar a máscara. Como ela tem paralisia, pode prejudicar a respiração. A gente teve muito cuidado. Eu, quando saía, era muito cuidadosa. A mesma roupa da rua não vestia mais. Sempre eles recomendando a gente a ter cuidados, sempre lavando as mãos”, diz Eliene.