Idosos do Lar Torres de Melo relatam expectativas para visitas do Dia dos Pais

Instituição atende 230 idosos, entre homens e mulheres acima dos 60 anos, com ajuda de custo baseada em doações e incentivos fiscais.

Amor, afeto, carinho e respeito estão entre as palavras relacionadas ao Dia dos Pais. Muito além de presentes materiais, para a maioria, esta é uma data de homenagens e reuniões familiares. Para outros, porém, não tem o mesmo significado. É o caso de alguns idosos abrigados no Lar Torres de Melo, maior Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPI) de Fortaleza, que perderam ou quase não possuem mais vínculo com os seus familiares. 

O Lar, antes conhecido como “Asilo de Mendicidade do Ceará”, foi criado em 1905 e tinha o objetivo inicial de assistir pessoas em estado mendicância. Alguns meses depois, foi lançada a proposta de abrigar idosos em situação de vulnerabilidade social. Depois, o nome foi alterado para o atual e hoje atende 230 idosos, entre homens e mulheres acima dos 60 anos, com ajuda de custo baseada em doações e incentivos fiscais.

Saudade

Aposentado e amante da literatura cearense, Marcos Antônio (nome fictício), 78, tem cinco filhos, mas apenas Luciana (nome fictício), a filha mais velha, o visita. “Ela está sempre aqui, apesar da rotina puxada de diarista. [Ela] Cuida de mim, marca consultas, faz de um tudo. Aqui a chamam de filha de ouro”, fala orgulhoso. Apesar da ausência dos outros familiares no dia a dia, ele compreende a correria da rotina dos filhos, mas sente falta de atenção. “Minha outra [filha] trabalha nesse mesmo bairro [do Lar], mas diz que não tem tempo e nem dinheiro para vir me ver. No dia em que folga, tem outras coisas para fazer. É difícil. Eles sempre dizem que quando tiverem uma ‘folguinha’, vêm aqui, mas nunca aparecem”, comenta. 

Morador da instituição há nove anos, Marcos conta que foi para o lar por causa de conflitos com a família. “Eu morava com uma das minhas filhas, mas a filha dela, minha neta, não gostava de mim e me tratava mal”, relembra. Marcos foi divorciado duas vezes da mesma esposa, mas recorda com saudade o tempo em que os filhos eram pequenos. “Estavam comigo sempre”, lembra.

Para ele, a expectativa deste domingo vai além de ganhar presentes, pois “um ‘Alô, pai. Como vai?’ vale mais que um presente de um milhão”. Apesar da ausência dos filhos, ele espera, um dia, ajudá-los financeiramente. “Sempre que eu puder, vou compartilhar o que eu ganhar com eles. Sei que precisam também”, fala com os olhos marejados.

Marcos relata ainda seu desejo de compartilhar pelo menos um passeio com os filhos e os seus 26 netos e bisnetos. “Quando me ligam, sempre dizem que virão me ver e me levarão para uma tarde de passeio. Eu sei que não vêm, mas, se algum dia vierem, eu vou. Eu não posso é sair a pé daqui, não tenho condições”, conclui. 

Para Fabrício Sampaio (nome fictício), 81, a saudade da filha que mora nos Estados Unidos é amenizada com ligações. Desde 2017 no abrigo, ele tem quatro filhos, seis netos e cinco bisnetos com os quais praticamente não tem convivência. Segundo ele, alguns “não têm tempo para visitar e outros moram longe”. 

Deficiente visual e com o lado esquerdo do corpo inválido, Fabrício chegou no abrigo a pedido do filho mais novo, com quem tem maior contato e o ajuda com os tratamentos das sequelas de dois pós AVCs. “Ele teve medo que eu tivesse um outro AVC e me pediu para vir para cá, pois ele e a esposa não teriam muito tempo para cuidar de mim ou me amparar em caso de emergência”, explica. 

Fabrício pretende passar o Dia dos Pais com o seu filho mais próximo em um almoço em família em Fortim, no Litoral Leste cearense. “Já fui algumas vezes lá, caso dessa vez eu não consiga ir, quero ir ver minha outra filha”, diz, com boas expectativas para a data.

Outra vivência

Já Mário Augusto (nome fictício), de 78 anos, tem, mesmo dentro do abrigo, uma boa vivência de Dia dos Pais. Antes morador de Aracati, Litoral Leste do Ceará, Mário recebeu o convite de uma das filhas para se mudar para o Lar, em 2005. “Morava sozinho lá [em Aracati]. Minha filha me pediu que viesse para ficar mais próximo dos meus outros filhos e de toda a família, que mora aqui. Então, me apresentou o Lar Torres de Melo e deixou à vontade para permanecer aqui ou voltar para o interior. Eu gostei e fiquei”, explica.

Mário se considera “vivido” e conta que a relação com a família não mudou com a sua ida para o lar. “Já sou avô de cinco e bisavô de dois e os vejo com frequência”, conta enquanto também fala sobre a ligação do filho minutos antes da entrevista. Para ele, a figura paterna significa “uma dádiva de Deus, da natureza”. Com três filhos, Mário revela os planos para o final de semana. “É um dia maravilhoso para mim. Sábado toda a minha família vem me visitar e no domingo, dia dos pais, eu viajo com a outra parte da família”, finaliza.

Lembranças

Marcos relembra com carinho o período em que vivia com os pais. “O segundo domingo de agosto era comemorado de forma diferente de hoje, de maneira mais afetuosa. Hoje está tudo mudado. As pessoas não dão mais valor aos pais”, observa.

Situação diferente de Mário. Para ele, a relação de pais e filhos não mudou em nada. “Os meus filhos são os mesmo amorosos de sempre”, declara. Ele espera encontrar os familiares para um almoço especial no domingo.

Os três idosos entrevistados ainda reforçam que se sentem acolhidos e bem tratados por toda a equipe do Lar.  

Segunda-feira de comemorações

Neste ano, um dia após o Dia dos Pais, na segunda-feira (12), o Lar Torres de Melo completa 114 anos de criação. Pensando nisso, segundo a assistente social da instituição, Sâmia Quirino, a comemoração da data alusiva aos pais foi transferida para a mesma data. 

A programação da casa fica por conta do projeto chamado “Páginas felizes da nossa vida”, “são três oficinas: teatro, dança e coral que estarão unidas para festejar o dia dos pais e os 114 anos da instituição. Além do abraço simbólico na quadra do Lar”, explica Sâmia.