Design de Fortaleza busca reocupação de espaços públicos

Série de intervenções no redesenho urbano levou a Capital a receber o título de Cidade Criativa em design pela Unesco. Iniciativas tentam reconectar as pessoas às ruas, promovendo mais saúde e redução da violência

Desde outubro do ano passado, Fortaleza detém o título de Cidade Criativa em design. O selo foi concedido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), junto a outras 65 cidades ao redor do mundo. O tema fez parte das discussões do 4º Seminário Internacional de Políticas Públicas Inovadoras para Cidades, que acontece no Centro de Eventos do Ceará até hoje (6). O evento é realizado por meio da Coordenadoria de Relações Internacional e Federativas (Cerif) da Prefeitura de Fortaleza.

Visualmente, as novidades chamam atenção e reaproximam as pessoas de todas as idades de espaços públicos antes esquecidos. Na prática, o design de uma cidade reflete toda a concepção e realização de produtores locais, além de se converter num laboratório de ideias e práticas inovadoras capazes de beneficiar diretamente as comunidades no nível urbano.

"O título (de Cidade Criativa) foi conquistado através de várias ações no campo da moda, do artesanato, do próprio design urbano, seja na ampliação de ciclofaixas, de ciclovias e nos espaços para pedestres", afirma Davi Gomes, presidente do Instituto Cultural Iracema. Hoje, a Capital faz parte de um grupo seleto de cidades, como Cingapura e Buenos Aires, que pode ter acesso a várias linhas de financiamento e crédito e ter intercâmbios relacionados à economia criativa. "Além de ser interessante para a marca da cidade, o selo gera negócios, empregos e desenvolvimento", projeta Davi Gomes.

Ações

Para a escolha, a Unesco avaliou um dossiê de ações desenvolvidas no Município nos últimos cinco anos. Aulio Zambenedetti, designer e membro do Comitê de Gestão do Selo de Cidade Criativa de Curitiba - primeira cidade do Brasil a receber a nomeação - observa a importância das transformações pelas quais Fortaleza vem passando, como a expansão da malha cicloviária, hoje com 287,4 km implantados, conforme a Prefeitura, e a requalificação da orla.

"Todo esse planejamento permite que a população use mais a cidade e tenha uma sensação de pertencimento maior", pensa o designer. E não necessariamente o design precisa ser caro. "Cada vez mais as instituições governamentais têm que fazer mais com menos. Em Curitiba, tivemos em dois anos um aumento de 30% na demanda de serviços públicos e, na mesma época, redução na arrecadação. Precisamos pensar novas formas de como desenvolver esse serviço público", destaca Zambenedetti.

Intervenções

Tinta, mobiliário urbano e uma ideia na cabeça. É como Luiz Alberto Sabóia, secretário-executivo de Conservação e Serviços Públicos, sintetiza a implantação da proposta do projeto Cidade da Gente, aplicado nos bairros Cidade 2000 e Praia de Iracema, na Regional II, e do Caminhos da Escola, em andamento no bairro Cristo Redentor. Ou seja, sem demandar muitos recursos financeiros, mas com aplicações práticas importantes.

Na leitura social de Davi Gomes, do Instituto Iracema, parte do êxito das iniciativas se deve ao fato de o fortalezense ser, "antes de tudo, um criativo". "A gente entende muito de criatividade na adversidade. São valores que temos e podemos desenvolver com pouco ou muito recurso, mas a gente é acostumado com a escassez e desenvolve produtos incríveis e soluções impressionantes", pondera. Assim, novas ideias também se tornam novos desafios.

"Após a intervenção, vão famílias, crianças. Isso cria uma nova dinâmica para essas regiões, e a população pode usufruir desses espaços", ressalta Luiz Alberto Sabóia. No recém-implantado Caminhos da Escola, as mudanças ocorreram no entorno de escolas públicas municipais, com melhorias de segurança viária e requalificação urbana, priorizando as crianças com a inclusão de elementos lúdicos. "O que é público tem que ser belo esteticamente também. Isso atrai apoio e suporte para a causa", diz.

Resistência

Mesmo com os avanços, alguns projetos da Prefeitura de Fortaleza enfrentam críticas de associações comunitárias e organizações da sociedade civil por se concentrarem nas regiões centrais da cidade, deixando de lado áreas de maior vulnerabilidade social, como as Regionais V e VI. Porém, segundo o presidente do Instituto Iracema, planejamentos para essas localidades já estão em curso.

"Um dos compromissos que a cidade acertou com a Unesco foi ampliar a atuação do design. Em janeiro, lançamos um concurso de ideias para as cinco regiões mais afastadas da cidade, para o Aracapé, Barroso, Mondubim. Foram mais de 30 projetos inscritos. Já começamos esse processo de entender a cidade como um todo e a perceber que o design não é algo elitista, mas funciona também para a costureira do Conjunto Ceará, para um artesão que produz uma cadeira lá no Barroso", exemplifica Davi Gomes.

A mudança, para Aulio Zambenedetti, de Curitiba, começa justamente com a ação governamental e a procura por parceiros interessados nos projetos - que não devem ser simplesmente copiados de outras cidades, mas adaptados.

Encontros como o Seminário Internacional contribuem para essas reflexões. "O que você precisa fazer é adaptar as coisas que deram certo em outros lugares para a sua realidade, dando sua identidade para o sistema", comenta.

Davi Gomes considera que, nos próximos quatro anos, a ideia é fortalecer o selo de Cidade Criativa em design, assumindo os compromissos acordados com a Unesco. Porém, sinaliza que a responsabilidade não deve ser apenas da gestão municipal, mas também de associações, entidades privadas e da sociedade, "já que esse selo vai trazer desenvolvimento para a cidade".