Casos de trombose - formação de coágulos sanguíneos no interior das veias ou artérias - estão sendo registrados em pacientes que tiveram Covid-19 no País. Segundo levantamento da Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular (SBACV), 39% dos médicos entrevistados atenderam pelo menos um paciente nessa situação em 2020. O risco exige cuidados mesmo após o fim da infecção.
De acordo com o cirurgião vascular e presidente da SBACV Regional Ceará, Edison Andrade, a infecção ocasionada pelo Sars-Cov-2 provoca “um processo inflamatório bem exacerbado no organismo, o que leva à produção de uma série de substâncias, causando uma tempestade inflamatória acentuada que favorece a formação de coágulos no interior dos vasos sanguíneos”.
A pesquisa contou, em média, com 470 profissionais em território nacional. Destes, 82% relataram que atenderam pessoas com trombose nos membros inferiores pós-Covid.
“Apesar da formação de trombos ocorrer mais frequentemente nessa parte do corpo, ela pode também se manifestar em qualquer outro local”, explica o cirurgião vascular.
Andrade ressalta que a incidência de casos de trombose é ainda maior em pacientes com sintomas graves do novo coronavírus. Conforme estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), em parceria com outras instituições, a análise do quadro de pessoas acometidas com a forma grave do vírus mostrou uma forte agregação entre plaquetas e monócitos - células de defesa contra infecções -, o que culminou no excesso de coagulação sanguínea.
Consequências da trombose
O médico explica também sobre as consequências da trombose no organismo desses pacientes. “Vão depender de dois fatores principais e básicos. Primeiro, o tipo de vaso que foi comprometido, ou seja, se esses trombos se formaram dentro das artérias ou das veias. Segundo, em que local do corpo humano aconteceu, isto é, em qual vaso houve o acometimento”.
Edison Andrade relata que, se a trombose for venosa, ela provavelmente vai gerar dores e inchaço dos membros. “O maior risco ocasionado por isso é que esses coágulos podem migrar por dentro do corpo, caindo na circulação pulmonar e provocando um quadro grave de embolia. Assim, quando um coágulo muito grande provoca obstrução dos vasos, ele pode levar à parada cardíaca ou até mesmo à morte”.
No entanto, casos de trombose arterial também podem ocorrer pós-Covid, afirma o especialista. “O quadro é totalmente diferente. O paciente vai se queixar de uma dor de forte intensidade, mas geralmente ela não vem associada ao inchaço. Ela ocasiona a obstrução da circulação para um membro, o que exige intervenção cirúrgica para que a circulação arterial seja desobstruída, porque caso contrário o paciente pode evoluir para a amputação do membro”, comenta Andrade.
Cuidado após a cura
O cirurgião vascular ressalta também que o paciente, mesmo curado da Sars-Cov-2, deve ficar atento para o surgimento de qualquer manifestação da trombose, principalmente as dores de forte intensidade associadas a inchaços nos membros inferiores. “Se isso ocorrer, ele deve buscar ajuda profissional para o diagnóstico e tratamento”.
“O que recomendamos [aos pacientes com coronavírus] é que evitem longos períodos de imobilidade. O paciente deve exercitar-se, ter uma boa alimentação e hidratação, podendo utilizar também meias de compressão elástica para minimizar as chances da trombose. Há também, em alguns casos, o uso de medicamentos anticoagulantes como prevenção, mas não são todos os pacientes que podem fazer uso deles, deve haver uma avaliação médica nesse sentido”, explica o presidente da SBACV.
'Foi uma sequela atrás da outra'
Para o faturista Jorge Wilde de Oliveira, 32, a trombose foi uma preocupação que ele não esperava sentir depois da Covid-19. “Após uma semana do fim do tratamento contra o vírus, comecei a sentir muitas dores nos membros e, ao realizar exames, descobri que estava com trombose venosa profunda na perna direita, no braço esquerdo e com um trombo no coração, que tinha me ocasionado também um infarto no miocárdio”.
Jorge teve ainda embolia pulmonar, derrame pleural e pneumonia depois do coronavírus. “Por tudo o que eu passei, todas essas questões pós-Covid, acredito que são milagres mesmo de Deus na minha vida. Os médicos me falaram que eles não sabiam como eu ainda estava ali, falando, me consultando, contando histórias, essas coisas… porque, com uma só dessas sequelas, eu poderia ter falecido”, continua.
Jorge Wilde, atualmente, faz tratamento com anticoagulantes, mas ele relata que tem enfrentado dificuldades financeiras para comprar os remédios, pois ficou desempregado na pandemia devido às questões de saúde. “Eu me vi um pouco desesperado nessa questão, foi quando surgiu a ideia de fazer uma arrecadação online para custear os gastos com os exames e consultas”.
“No início, quando eu descobri tudo isso, foi um impacto muito forte… foi uma sequela atrás da outra e a gente já fica com toda aquela preocupação. Mas hoje tenho um sentimento de paz, de muita gratidão a Deus e de alegria pelo tratamento estar dando certo. O atendimento médico também foi primordial”, destaca.