Ao ouvir que as grandes histórias olímpicas, aquelas que entram para a história do esporte, são resultado de reviravoltas, Mayra Aguiar, 29, concorda. Sua reação é se dizer pronta para o que está por vir no próximo dia 29, quando vai entrar no tatame em Tóquio.
"Acho que se pode dizer que sim, é uma questão de superação. Todas as minhas vitórias vieram de grandes voltas por cima", afirma a judoca brasileira, prestes a participar do evento na categoria até 78 quilos.
Em novembro do ano passado, ela passou por cirurgia provocada por lesão no ligamento cruzado anterior do joelho esquerdo. O tempo de recuperação colocou sua participação nos Jogos de 2021, o quarto de sua carreira, em dúvida. Por causa da contusão, da cirurgia e da pandemia, Mayra ficou ao todo 16 meses sem competir. Foi a sétima operação a que se submeteu.
Ela voltou ao esporte em junho deste ano, no Mundial de Budapeste, na Hungria. Perdeu na segunda rodada. Isso não lhe deu chance de medalha, mas lhe ofereceu os pontos suficientes para ser cabeça de chave na Olimpíada e não ter um caminho tão complicado, pelo menos nos primeiros combates.
Mais medalhas
Mayra pode se igualar a Fofão, hoje a única mulher brasileira medalhista em três Jogos diferentes. A judoca foi bronze em Londres-2012 e no Rio-2016, algo que nenhuma atleta do país conseguiu em esportes individuais. A jogadora do vôlei de quadra ficou com o bronze em Atlanta-1996 e em Sydney-2000, antes de levar o ouro em Pequim-2008.
"Nunca duvidei de que seria possível ir aos Jogos. Sempre me recuperei muito bem, e minha cabeça estava focada em melhorar a cada dia mais. Minha irmã é fisioterapeuta e me ajudou muito nessa parte da reabilitação", conta, referindo-se a Hellen Aguiar.
Mayra disse que a confiança vem da maneira como se sentiu ao disputar o Mundial, competição em que já conquistou sete medalhas, duas delas de ouro (Cheliabinsk-2014 e Budapeste-2017). Não pelo resultado em si, mas porque seu corpo reagiu bem durante as lutas, o que era uma das suas preocupações.
Preparação
Em uma preparação mais longa do que o esperado, por causa da pandemia da Covid-19, que provocou o adiamento da Olimpíada por 12 meses, há também a percepção de que o ciclo foi acidentado para todos os competidores, não apenas para ela. Mas a brasileira admite que superar o problema da lesão foi um complicador a mais.
"Este ciclo olímpico foi muito diferente para mim, tive que me readaptar, assim como todo o mundo, aprender a viver nesse novo normal. A cirurgia no joelho exigiu muito foco e dedicação. Estou me sentindo muito bem fisicamente, recuperada. O Mundial foi muito bom para sentir aquele gostinho de competição, ver os erros e fazer os ajustes que estavam faltando no treino. Foi muito tempo sem participar de um campeonato, estava com saudade", diz a atleta patrocinada pela Adidas.
Tão diferente que em março deste ano, com as academias fechadas no Rio Grande do Sul por causa da escalada da pandemia, ela se mudou para o Rio de Janeiro para continuar com o processo de recuperação. Por um acordo entre a Confederação Brasileira de Judô e o COB (Comitê Olímpico do Brasil), Mayra passou a treinar no Parque Aquático Maria Lenk.
As primeiras medalhas olímpicas femininas foram obtidas pelo Brasil na Olimpíada de Atlanta, em 1996. Jackie Silva e Sandra Pires ficaram com o ouro no vôlei de praia. A prata foi da dupla Adriana Samuel e Mônica Rodrigues. O país também ganhou a prata com a seleção de basquete e o bronze com o vôlei de quadra.
Incluídos os homens, o maior medalhista brasileiro é o velejador Robert Scheidt, que vai para sua sétima Olimpíada após ter obtido seis medalhas (duas de ouro, duas de prata e duas de bronze).
Mayra está familiarizada com os rankings de vitórias olímpicas e com o recorde que pode obter, mas não parece muito preocupada com isso. Faz trabalho psicológico diário ("ajuda a canalizar as energias") e mantém o foco na competição.
"Gosto muito de meditar. [Antes das competições,] leio e gasto tempo a conversar com a minha família e amigos", afirma, para deixar claro não estar ansiosa com a aproximação de uma competição que, no final de 2020, poderia parecer um sonho distante demais.
Desde o final dos Jogos no Rio, quando não passava pela cabeça de ninguém a possibilidade de que o novo ciclo olímpico teria cinco anos e não quatro, como costuma acontecer, Mayra tinha o plano de estar em Tóquio. Pela medalha, pela competição, por representar o Brasil. Mas também pelo fato de a disputa ser na capital japonesa e as lutas acontecerem no Budokan, arena que é considerada a casa espiritual do judô.
"Estou muito feliz por poder disputar minha quarta Olimpíada e mais emocionada ainda por ser no Japão, que é o berço do meu esporte", finaliza a judoca.