Abril foi escolhido como o mês de prevenção contra a crueldade animal. A campanha Abril Laranja foi criada em 2006 pela American Society for the Prevention of Cruelty to Animals (ASPCA) ou Sociedade Americana para a Prevenção da Crueldade contra Animais e tem como objetivo alertar e conscientizar a população com relação aos maus-tratos sofridos por animais, bem como buscar formas mais concretas de punição aos agressores.
De acordo com o Batalhão de Policiamento do Meio Ambiente (BPMA), o Ceará registou um aumento de 110% nos casos de agressões aos animais, no período pandêmico de 2020, se comparado a 2019.
Os maus tratos podem ser caracterizados como agressões físicas e psicológicas, além de abandonar, manter preso de forma permanente, ferir, deixar o animais em condições desfavoráveis (no frio, no sol, na chuva), sem água ou comida.
Desde setembro do ano passado, foi sancionada a lei 1.095/2019, que possibilitou o endurecimento da punição para quem praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais. A nova legislação prevê pena de 2 a 5 anos de reclusão, multa, além da proibição para novas guardas de bichos.
Por mais que aumente a severidade da pena, - antes, era de multa com reclusão de 3 meses a um ano, previsto pela lei ambiental desde 1998 -, ainda há muito o que ser feito para reverter essa situação. No Nordeste, essa luta tem sido capitaneada por algumas mulheres que atuam nessa frente de combate aos maus tratos contra animais.
A Sisi entrevistou mulheres como Cristiane Angélica, professora, fundadora e presidente da ONG ABRACE; Susane Dantas, proprietária do Abrigo São Lázaro; Viviane lima, fundadora e responsável pelo Lar Tintin e Lérida Lobo, escrituária e Presidente da Associação Anjinhos de 4 patinhas. Confira o relato de mulheres que estão na linha de combate da causa animal.
Cristiane Angélica, professora, fundadora e presidente da ONG ABRACE.
“O amor pelos animais foi inspirado pela minha mãe. Ela pegava animais doentes na rua, levava para casa, cuidava e depois, quando estavam bem de saúde e bonitos, procurava amigos e familiares para ficar com eles. Inclusive a minha babá foi uma cadela, a Keylla, uma vira-lata peluda que morreu picada por cobra, acredito que para me defender. Mesmo criança, eu ajudava minha mãe a cuidar dos animais que ela resgatava e, desde os 18 anos, parei de comer carne por respeito a eles.
Sou conhecida como a "tia dos cachorrinhos". Embora aposentada da escola particular, me divido no trabalho de turmas da escola pública e atendimentos na ONG. Durante a pandemia, o trabalho online se tornou predominante e tem sido desafiador. Graças a Deus, tenho uma excelente equipe de voluntários que dividem comigo as tarefas da ONG, porque sozinha eu jamais daria conta de tanto trabalho e responsabilidade.
Algumas pessoas reclamam do nosso processo de adoção, considerando-o rígido, mas, ainda assim, com esses cuidados, com acompanhamento das adoções, dentro do possível, coisas absurdas ainda acontecem, como pessoas pedindo para devolver animais adotados porque vão mudar de casa. É um absurdo. Criar um animal e abandonar, seja por qual motivo for, é injustificável. É preciso que as pessoas parem de tratar os animais como objetos.
Salvar uma vida é um privilégio que Deus dá a quem é capaz de ter empatia. O que mais me emociona é o antes e o depois dos animais. Nosso foco é adoção, então a gente resgata com objetivo de recuperar e entregar o animal para uma família que o ame e cuide com responsabilidade. Quando a gente vê a alegria deles e das famílias, a sensação é algo indescritível, surreal. A palavra mais parecida com essa sensação é: felicidade.
É preciso incluir na grade curricular das escolas, uma disciplina relacionada ao meio ambiente e, dentro dessa disciplina, seja ensinado o cuidado e respeito aos animais, sejam eles os animais considerados domésticos ou não. Precisa ser feito uma campanha mais clara e explicativa do que são os maus tratos, pois maltratar não consiste só em machucar, ferir um animal. Privá-lo de água, comida e liberdade é também maltratar. As leis e punições precisam ser postas em práticas para que as pessoas entendam que maltratar animal é crime e dá cadeia.
O Abril laranja é o mês de conscientizar contra a crueldade animal e é muito importante que esse trabalho alcance todas as faixas etárias e classes sociais, tornando assim essa luta da causa animal mais conhecida por um público mais amplo de nossa sociedade”.
Fotos: Sarah Chrisley
Susane Dantas, proprietária do Abrigo São Lázaro
“O abrigo São Lázaro foi criado pelo meu avô e existe há 28 anos. Assumi em 2003, após a sua morte. O abrigo começou com 19, hoje são 1200 animais. No abrigo é assim: a gente chega 6 horas e fecha às 16hrs. À noite, fica uma pessoa que cuida, limpa os debilitados e os que estão no ambulatório. O dia a dia é limpando, cuidando, medicando, levando cachorro atropelado para lá e para cá, levando para castrar. É cuidado aqui e cuidado lá. O nosso abrigo pega os animais vítima de abuso e de maus tratos, cuida e depois coloca para adoção. Se eles nunca forem adotados, vão permanecer no abrigo, vão ter comida, água, amor e carinho dos voluntários, das pessoas que visitam para o resto da vida. Eles nunca mais vão sofrer. Mas o que a gente quer mesmo é que sejam adotados para ter uma família.
O que mais me emociona é saber que eles vão ter uma vida digna. A partir do momento que entram no Abrigo, eles têm uma segunda chance. Existem animais que a gente pensa que vão morrer e, de repente, escapam, ficam lindos, são adotados e felizes.
O ideal é que não exista mais animais na rua. Se a pessoa não pode pegar um animal, não pegue para não deixar o animal sofrendo, preso dentro de um quintal, morrendo. Então deixa ele na rua, porque na rua as pessoas acabam ajudando, botam água e comida. É muito melhor.
É necessário a elaboração de medidas e leis mais severas. É preciso que os pais saibam educar os filhos, que tenha mais conscientização nas escolas, para que as crianças aprendam que não se deve maltratar os animais. Além disso, o Poder Público precisa fazer sua parte
Os animais sentem dor, frio, tem tudo que um ser humano tem. Os animais ficam velhos, limitados, adoecem, tem fome, sede, querem carinho, querem ser respeitados, sentem humilhados na rua e sofrem e sentem falta do seu dono. Muitos animais quando vão para o abrigo morrem de tristeza, eles não querem viver sem os donos e acabam se entregando. Um animal é muito importante da vida de todos, ele alegra a casa e a família. Eles tratam pessoas com depressão. São maravilhosos.
Não compre animais, adotem!”
Viviane lima, fundadora e responsável pelo Lar Tintin.
“O meu amor pelos animais não teve um começo, simplesmente nasceu comigo. Com 7 anos, eu já me sensibilizava e resgatava animais de rua. Com 12 anos, eu já tinha 15 cães e 20 gatos. Saí de Minas e vim para Fortaleza e trouxe meus animais. Já fui despejada três vezes em Fortaleza e nunca abandonei nenhum. Eles são minha vida.
Acordo às 5 horas para medicar os animais em tratamento, em seguida lavo os canis, ajeito os berços, faço curativos, troco água dos animais durante o dia. Ao final do dia, coloco ração para todos os animais, medico novamente e confiro todos eles nos canis. Em dias mais calmos tento dar banho terapêutico em animais com problemas de peles. E, antes da pandemia, recebia visitas diariamente de admiradores do projeto. É uma rotina muito pesada. Resgatamos de 3 a 5 animais mensalmente. Mas, desde que iniciou a pandemia, a ajuda diminuiu bastante, nos impossibilitando de resgatar mais animais.
Já aconteceram tantas situações difíceis, mas a que me marcou foi o Tintin, que quando chegou não deram um mês e ele viveu sete anos me ensinando muitas coisas. O nome do Lar se deu em homenagem a ele que sofria de epilepsia distrofia muscular. O amor cura. O que mais me emociona é saber que é possível dar uma vida digna a um animal que sofreu a vida inteira. Saber que o meu trabalho motiva as pessoas e mostrar que toda vida importa.
Com o Abril Laranja, acreditamos que mais pessoas se conscientizem e que que o abandono e maus tratos diminuam e futuramente possamos viver em um mundo sem tanta maldade com os animais. Para isso, é necessário ter leis mais rígidas e firmes. Penas altas. As pessoas não têm medo de maltratar um animal pois sabem que não serão penalizadas. Além disso, é fornecer educação ambiental a todos”.
Lérida Lobo, escriturária e Presidente da Associação Anjinhos de 4 patinhas
“Eu nunca sonhei em ter um abrigo de animais. Sempre tive animais em casa e sempre ajudei os vizinhos a cuidar dos animais doentes. Ajudava na alimentação, mas começaram a colocar caixas de gatos e cachorros na minha porta. Às vezes, conseguia adoção, mas na maioria das vezes não conseguia. Sou evangélica e ficava questionando a Deus o que fazer com aqueles animais que estavam sendo colocados na minha porta. A resposta de Deus foi a cura do meu filho caçula que passou por uma cirurgia dificílima, sobreviveu e hoje é doutor. Eu tinha feito um voto com Deus que, se meu filho se recuperasse, eu iria deixar tudo e iria viver para cuidar dos animais. Hoje, moro no abrigo, localizado em Sergipe, com mais de 1000 animais, conto com a ajuda de 17 funcionários e uma médica veterinária.
Nossa sede é própria e sobrevivemos de doações dos seguidores. Acordo geralmente às 6h, mas nunca temos hora para dormir, principalmente quando o internamento está lotado. O que mais me emociona é ver casos como o da Amoré e do Nik que, aos olhos de todos não teriam chance alguma e hoje estão lindos, saudáveis e levam uma vida digna no abrigo.
As medidas tomadas contra os maus tratos só vão funcionar se um dia as leias do País realmente funcionarem. Inclusive, uma situação que mais me marcou, foi o dia que fiz uma denúncia contra o meu vizinho da frente que permitiu que sua cachorra fosse arrastada por um cavalo por 5 km. Depois dessa denúncia a vida no abrigo virou um inferno: tocaram fogo na frente na minha casa, ele nem preso foi e a gente vive hoje com medo desse bandido. Minha grande frustração é saber que o trabalho de resgate e de cuidados exaustivos sempre vão ficar na impunidade”.
Caso presencie ou saiba de alguma situação de maus-tratos, é possível fazer a denúncia de forma anônima.
O registro pode ser feito por meio das seguintes opções:
-Site e ouvidorias do Ministério Público;
-Polícia Militar, no número gratuito 190;
-Disque Denúncia, por meio do número 181;
-Delegacias de polícia;