Fazer com que os alunos se identifiquem com o ambiente escolar, tenham interesse no ensino integral e aprendam sobre a potência das manifestações culturais das periferias em que vivem eram alguns dos objetivos de Tuyra Maria da Cruz Andrade, 28, quando pensou na disciplina eletiva de Literatura Marginal e Música.
Como professora da Escola de Ensino Médio em Tempo Integral Presidente Humberto de Alencar Castelo Branco, no bairro Montese, em Fortaleza, a jovem promove discussões sobre a realidade dos alunos, estimula a produção de poesias, incentiva o pensamento crítico e a expressão.
Existindo desde 2017, a disciplina foi reconhecida e agora é uma das 50 iniciativas que concorrem a edição do Prêmio Educador Nota 10 de 2020, que reúne professores de todo o Brasil. Tuyra é a única cearense participante e uma dos 11 nordestinos que concorrem à premiação. Inicialmente, foram enviadas 3.761 inscrições de educadores. O prêmio contempla professores que ensinam turmas desde a educação infantil até o ensino médio.
Criado em 1998, a iniciativa foi idealizada pela Fundação Victor Civita e atualmente conta com parceria da editora Abril, da rede Globo e da Fundação Roberto Marinho. Para ser selecionado, o docente precisa ter um projeto que leve em conta a equidade e inclusão, que contribui para a formação dos alunos com aspectos da Base Nacional Comum Curricular, que possa ser reproduzido em outros contextos educacionais e que tenha resultados de aprendizagem comprovados.
Tuyra conta que as aulas semanais são feitas fora do ambiente da sala de aula, geralmente em lugares abertos, como o pátio da escola. Dispostos em roda, professora e alunos começam a fazer a leitura de textos sobre diversos temas. Depois, há a discussão com livre participação dos estudantes. As leituras e as músicas apresentadas, geralmente de rap, reggae e funk, trazem ainda mais a identidade dos alunos para a escola. A professora, que sempre via os alunos em bailes de reggae, encontros de poesia slam e batalhas de rap que frequenta no tempo livre, percebeu que esses gêneros poderiam ajudar na expressão das vivências dos estudantes.
“Tem muito sarau improvisado. Sobrou 15 minutos da aula e eles já pedem para recitar. Eles são tímidos, mas depois começam a escrever, a ler mais, a produzir poema também”, diz a professora. Tuyra explica que também costuma chamar convidados envolvidos com produção cultural na periferia, teatro de rua, pessoas que recitam poemas dentro de coletivos, entre outros. Segundo ela, nesses dias especiais, a turma que tem 40 matriculados dobra de tamanho, envolvendo também alunos de outras disciplinas. Além disso, eventos são feitos para toda a comunidade escolar com cooperação ativa dos alunos na organização.
Alguns alunos da disciplina chegaram a levar os aprendizados para fora da escola. Um deles, segundo Tuyra, ganhou batalhas de MC’s em outros espaços. Outra aluna foi convidada a participar de um evento de poesia slam em São Paulo.
“A gente fala muito do que falta na educação, mas o que a gente faz com o que a gente já tem?”, questiona Tuyra. Para ela, a proposta do prêmio pode ajudar professores a responderem a pergunta, visto que as iniciativas escolhidas precisam ser reproduzíveis em diversos contextos escolares, sem muitas adaptações, gastos ou tecnologias, e precisam ter metodologia atual, que combine com a experiência dos alunos e das escolas. Assim, os projetos podem influenciar na aproximação de estudantes que não tem tanta identificação com as abordagens tradicionais da educação, fazendo a escola se tornar ainda mais inclusiva.
Passada a primeira fase de seleção, o prêmio deverá escolher os 10 vencedores entre os 50 concorrentes. Eles receberão um vale-presente no valor de R$ 15 mil. Ainda é escolhido também o Educador do Ano, que também recebe prêmio no mesmo valor. Além das premiações individuais, a escola onde o professor trabalha deve receber verba para celebração. O resultado deve ser divulgado ainda em 2020.