“Segurança individual vacilante, comércio limitadíssimo, indústria insignificante, riqueza pública e individual escassa, sertões ínvios, nenhuma instrução civil e pouquíssima doutrina religiosa.” Assim era o Ceará há 224 anos. Foi quando, por fim, se emancipou.
A descrição consta no livro “Pequena História do Ceará”, do escritor Raimundo Girão, que eterniza ainda um marco importante: foi uma mulher, D. Maria I, a rainha de Portugal, que resolveu emancipar o Ceará, em 17 de janeiro de 1799.
A data que marca a emancipação do Ceará por Carta Régia faz parte do calendário oficial de eventos do Estado desde 2004, instituída como “Dia do Ceará”.
A Lei nº 13.470 também determina a realização anual de um evento oficial em Aquiraz, primeira vila erguida no Ceará e primeira capital administrativa da capitania, antes de ela ser emancipada de Pernambuco.
Como era o ‘Siará’
O professor de História Mariano Júnior contextualiza que a Capitania do Ceará não teve grandes investimentos por parte dos capitães donatários e, por isso, inicialmente, não despertava interesse de Portugal.
Sem metais preciosos, especiarias ou comércio lucrativo, o território foi ocupado por pobreza – mas quando França e Holanda tentaram colonizar o Ceará, ocupando espaços, a Coroa portuguesa se fez presente.
Aos poucos, algumas atividades econômicas aqui foram se desenvolvendo. E é exatamente a partir da riqueza do algodão que começa a disputa entre as elites do Ceará e de Pernambuco e a articulação para a emancipação.
Em janeiro de 1799, então, D. Maria I torna o “Siará” emancipado. Oito meses depois, em setembro, Bernardo Manuel de Vasconcelos – que tem hoje nome de avenida em Fortaleza – chega ao território e se torna o primeiro governador do Estado.
A partir daí, ele “abriu estradas, fomentou a produção do arroz, da farinha de mandioca e a do salitre, reprimiu severamente os contrabandos, levantou um conjunto de baterias no Mucuripe, para melhor defesa da vila; e tratou de reedificar as vilas de índios”, como sublinha a obra de Raimundo Girão.
O comércio da Capitania do Ceará, porém, continuava ligado ao de Lisboa, principalmente por meio da estrutura portuária de Aracati – já que em 1799, Fortaleza já era capital, mas não tinha infraestrutura para fortalecer as comercializações.
A importância da emancipação
Foi depois de emancipado oficialmente que o Ceará cresceu, devido ao impacto positivo que o comércio.
“Em 1808, a Corte Portuguesa chegou ao Brasil e foi decretada a abertura dos portos. Essa liberdade comercial facilitou a vida dos produtores rurais e comerciantes cearenses, que passaram a ter um ganho maior”, aponta Mariano.
Fortaleza, porém, “era uma cidade acanhada se comparada a Sobral, Aracati e Icó”, como pontua o professor.
Ou “um montão de areia profunda apresentando dos lados pequenas casas térreas”, como descreve o livro “Evolução Histórica Cearense”, também do escritor Raimundo Girão.
“Fortaleza só passou por um processo mínimo de urbanização e organização por volta de 1810, com o plano de Silva Paulet”, conta Mariano.
Antes da emancipação
A disputa sobre qual era a nossa capital é anterior ao processo de emancipação, como reforça Mariano Júnior. Quando foi autorizada por Portugal a criação da primeira vila do Ceará, São José de Ribamar, em 1699, a Coroa não especificou onde seria.
“Até que em 1713 ficou fechado que (a vila) seria em Aquiraz, onde ficava a Câmara Municipal. Em 1726, foi criada a Vila de Nossa Senhora da Assunção, que é Fortaleza, onde o capitão-mor passou a morar”, rememora o professor de História.
O historiador destaca que não há consenso entre estudiosos sobre quando, de fato, Fortaleza passou a ser a capital cearense, já que esta tinha estrutura militar, mas a sede do governo permanecia em Aquiraz.
A importância histórico-política de Aquiraz, contudo, permanece erguida. A cidade ainda conserva a casa mais antiga construída lá, onde morou o capitão-mor Manoel da Fonseca Jaime, que governou a Capitania do Ceará de 1713 a 1716.