Ceará desperdiça quase metade da água potável durante distribuição a moradias e comércios

Maioria das perdas é causada por vazamentos e ligações clandestinas, segundo estudo do Instituto Trata Brasil

Mais de 3 milhões de cearenses – quase 40% da população – não têm acesso regular a água potável. Enquanto isso, 44,9% do líquido que deveria ter chegado às torneiras do Ceará em 2020 foi desperdiçado ainda nas tubulações.

Para se ter uma ideia, é como se 184 piscinas olímpicas cheias de água tratada fossem desperdiçadas diariamente no Estado – ou, aproximadamente, 460 milhões de litros do líquido mais essencial à vida.

Os dados são de estudo do Instituto Trata Brasil (ITB), com base em informações do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) de 2020, e mostram quanto da água produzida no Ceará chega, de fato, ao consumo da população.

38,6%
da água distribuída em Fortaleza é desperdiçada antes de chegar às torneiras, segundo o Trata Brasil.

Cerca de 6 a cada 10 litros da água desperdiçada no Brasil (que amarga uma taxa de 40,1% de desperdício, menor que a cearense) se perdem em vazamentos, mas há ainda outras causas importantes:

  • Ligações clandestinas/irregulares;
  • Ligações sem hidrômetros;
  • Hidrômetros parados;
  • Hidrômetros que subestimam o volume consumido;
  • Ligações inativas reabertas;
  • Erros de leitura.

Luana Siewert Pretto, engenheira civil e presidenta executiva do ITB, afirma que, ano a ano, o desperdício de água tem piorado no Ceará. “Em 2016, a perda era de 40,5%; já em 2020, foi de 44,9%. Isso demonstra que não está sendo feito o esforço necessário”, critica.

A especialista explica que, para evitar as perdas, é necessário um controle efetivo da rede de distribuição, “com ações constantes de buscas de vazamentos e de fraudes, e instalação de sensores de vazão e pressão, pra que se tenha agilidade no conserto dos vazamentos”.

A meta estabelecida pelo Ministério do Desenvolvimento Regional é que, em 2033, a perda anual de água potável no Brasil seja de no máximo 25%.

Minimizar as perdas de água, aliás, vai além de soluções estruturais: exige políticas públicas. As ligações clandestinas, por exemplo, são em muitos casos a única maneira de comunidades vulneráveis terem acesso a água, como destaca Luana.

“Isso acaba prejudicando a saúde das pessoas, que têm acesso a uma água sem o tratamento adequado. As perdas também causam, muitas vezes, instabilidades no abastecimento de água em algumas regiões”, pontua a engenheira.

293
litros de água são desperdiçados em média, todos os dias, por cada imóvel com ligação ativa à rede de distribuição do Ceará. O consumo médio por habitante é de 136,5 litros por dia.

A solução, então, além de consertar vazamentos e cortar os “gatos” hídricos, tem tudo a ver com políticas públicas de moradia.

“Os municípios precisam ter um plano de regularização de moradias precárias, pra que o serviço de água e esgoto chegue a essas pessoas e elas tenham um horizonte de ter uma conta de água no seu nome. Isso, muitas vezes, é sinônimo de dignidade”, frisa a presidenta do Trata Brasil.

O que diz a Cagece

Dos 184 municípios cearenses, a Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) atende 152. Em nota, a empresa garantiu que “a redução de perdas de água é prioridade estratégica e indispensável para garantia da eficiência” do abastecimento de todos eles.

A companhia reconhece que “a perda de água é um problema que deve ser combatido diariamente e de forma intensa”, mas destacou que isso “demanda consideráveis investimentos financeiros”.

Outro aspecto importante e de alta complexidade se refere à parcela considerável das perdas ligadas às fraudes no consumo. Para minimizar essa prática ilegal, a companhia também possui equipes e ações específicas.
Cagece
Em nota

A Cagece informou, ainda, os valores dos investimentos anuais em cada ação de combate às perdas de água no Estado, por meio do Programa de Redução de Perdas de Água:

  • Busca de vazamentos ocultos: R$ 7 milhões/ano; 
  • Intensificação de equipes de combate às fraudes: R$ 10 milhões/ano; 
  • Renovação e modernização do parque de medidores de vazão: R$ 90 milhões/ano.

A meta é que o Ceará reduza o índice de perdas de 44,9% para 25%, gradualmente, até o final de 2034, segundo a companhia. O desperdício de água por imóvel ligado à rede também deve cair de 293 para 216 litros/dia, até o mesmo período.