STJ acerta ao frear advocacia predatória no Minha Casa, Minha Vida
Uma recente mudança de entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) representa avanço no combate à chamada “indústria da indenização” ligada ao programa Minha Casa, Minha Vida. A medida é essencial para restaurar o equilíbrio entre os direitos dos consumidores e a segurança jurídica das empresas da construção civil.
Durante anos, o que deveria ser um meio legítimo de reparação de danos tornou-se, em muitos casos, um instrumento de abuso processual. Ações judiciais em massa se multiplicaram, muitas vezes sem provas técnicas consistentes ou perícia que comprovasse defeitos construtivos. Essa prática, chamada litigância predatória, gerou milhares de processos padronizados e, por vezes, infundados.
Segundo a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), até março de 2023, mais de 126 mil ações foram protocoladas, com valor médio de R$ 110 mil por processo. Embora os valores pareçam baixos individualmente, o impacto coletivo é enorme. Diversas construtoras, mesmo sem responsabilidade comprovada, arcam com prejuízos. Muitas vezes, sequer estavam no polo passivo inicial, mas acabam responsabilizadas ao final, quase sempre sem ampla defesa.
Nesse cenário, o novo entendimento do STJ é crucial: permitir que juízes de 1ª instância investiguem abusos processuais é fundamental para conter o avanço dessas ações. Não se trata de restringir o acesso à Justiça de quem realmente sofreu danos, mas de impedir o uso do Judiciário com fins meramente lucrativos, ferindo a boa-fé e o interesse público.
Com respaldo legal, o Judiciário poderá agir com mais rigor para coibir manobras e responsabilizar condutas abusivas. Isso preserva a sustentabilidade do programa habitacional, que depende do equilíbrio entre entes públicos, setor privado e instituições financeiras. A Caixa Econômica Federal, por exemplo, tem sido fortemente impactada por milhares de processos sem base técnica e com estrutura limitada para defesa.
Essa distorção também afasta novas construtoras do programa, elevando riscos e custos, o que reduz a oferta de moradias, especialmente para a população de baixa renda.
Ao corrigir essa rota, o STJ mostra que é possível proteger o consumidor sem abrir margem para abusos. Segurança jurídica e acesso à Justiça devem andar juntos. Com equilíbrio, todos ganham: setor produtivo, poder público e, principalmente, o cidadão.
Fernando Veras é advogado