Qual o presente no Dia das Crianças?
Podemos fazer uma analogia simples: uma obra de pavimentação ou a inauguração de uma praça está para o político assim como um presente de Dia das Crianças está para um pai
Ainda adolescente, ouvia de um ex-prefeito de nossa amada e sofrida Fortaleza uma frase que nunca saiu da minha cabeça: “O pretinho é que gera votos.”
Ele se referia ao asfalto novo nas ruas e avenidas da cidade, aquele “pretinho” que brilha aos olhos do eleitor e rende dividendos nas urnas.
Décadas depois, percebo que a lógica continua a mesma. Muitos políticos ainda se apegam ao resultado imediato, ao efeito visual de uma política efêmera. Fazem o cálculo político antes de pensar na política pública.
Esses dias, vi um político sugerir que um projeto fosse “enterrado”, literalmente, e me peguei pensando no quanto isso simboliza nossa relação com o tempo e as prioridades. Tudo o que não dá retorno rápido é empurrado para o subterrâneo. Vivemos o império do imediatismo, que consome nossos esforços e nos distancia dos projetos que realmente transformam o futuro: saneamento básico, infraestrutura escolar, novas creches, valorização e capacitação dos profissionais da saúde e da educação.
Podemos fazer uma analogia simples: uma obra de pavimentação ou a inauguração de uma praça está para o político assim como um presente de Dia das Crianças está para um pai. E com a data se aproximando, muitos pais e mães se perguntam: “Qual presente darei ao meu filho?”
Desde que meu filho Mattia chegou ao mundo, tenho vivido esse dilema. Entre a vontade de presentear e a necessidade de educar, procuro o equilíbrio. Há pais que, sabiamente, preferem não se endividar em troca de um sorriso passageiro. São bons gestores. E há aqueles que oferecem algo que não cabe em uma caixa de presente: um curso, um esporte, um cuidado com a saúde. Esses são gestores excelentes, pensam em planejamento e metas.
Assim também deveria ser o poder público.
O cidadão, como uma criança à espera do presente, anseia por obras e ações que tragam satisfação e esperança. Mas é preciso maturidade para compreender que o verdadeiro “presente” pode estar escondido no invisível ou “enterrado”, nas tubulações, nas redes de esgoto, na água limpa que chega à torneira.
Saneamento básico, por exemplo, é uma política que raramente ganha manchetes. Dá trabalho, causa transtorno e, quando termina, quase ninguém lembra. A cidade parece a mesma, mas não é.
Ah, se as pessoas soubessem o quanto se economiza em saúde a cada centavo investido em saneamento, entenderiam que esse, sim, é o melhor presente que um gestor pode oferecer, não só no Dia das Crianças, mas em todos os dias do ano.